Título: Divergência grande no dado da indústria é rara
Autor: Santos , Chico
Fonte: Valor Econômico, 04/06/2012, Brasil, p. A3

Uma conjugação de fatores estatísticos explica uma diferença de números que intrigou analistas na divulgação pelo IBGE dos números do crescimento Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre deste ano na sexta-feira. A indústria de transformação aparece no PIB em alta de 1,9% na comparação com o último trimestre do ano passado, já retirados os efeitos sazonais, enquanto na Pesquisa Industrial Mensal (PIM), outro indicador do IBGE, o desempenho da mesma indústria no mesmo período foi 0,3% negativo. Um desses fatores é a defasagem na atualização da base de ponderação da PIM, que é de 2002 e está sendo revista. Outra questão é a possibilidade da produção da indústria nesse período ter sido de maior qualidade, com maior agregação de valor. A pesquisa do PIB contempla qualidade, a mensal, não.

"O que se recomenda é não deixar tanto tempo sem fazer essa revisão", disse Rebeca Pallis, gerente da Coordenação de Contas Nacionais do IBGE, ressalvando que a sobrecarga de atribuições da equipe do instituto às vezes acaba retardando essas atualizações.

Segundo Rebeca, a série histórica da indústria no PIB e na PIM mostra sempre números diferentes, porque são pesquisas distintas com metodologias e objetivos próprios, mas "não é comum" uma divergência tão grande quanto a apurada na comparação entre o quarto trimestre de 2011 e o primeiro de 2012. Pela série recente, o último caso foi no segundo trimestre de 2006, quando a indústria de transformação cresceu 0,52% na PIM e caiu 2,4% no PIB.

Ela explicou que tanto o PIB quanto a PIM têm como base para suas ponderações, no que se refere à indústria, a Pesquisa Industrial Anual (PIA), também do IBGE. Só que enquanto a PIM tem como base 2002, embora seus pesos sejam atualizados anualmente com base nos resultados do ano anterior da própria pesquisa, a base do PIB é a PIA de 2009, sendo os pesos também atualizados com base nos números do ano anterior, cada um com sua metodologia própria. A atualização em curso na PIM deverá aproximar as duas bases.

No exame dos números do último trimestre do ano passado e do primeiro deste ano em relação ao mesmo período do ano anterior a cada um deles, fica fácil entender, estatisticamente, porque houve o descolamento da indústria nos dois indicadores, mas não as razões que levaram a ele. No quarto trimestre de 2011, a produção da indústria de transformação medida pela PIM caiu 2,14% em relação ao quarto trimestre de 2010. Já no primeiro deste ano, comparado ao primeiro do ano passado, a queda foi de 2,98%. Ou seja houve uma aceleração da queda, justificando o desempenho negativo na ponta.

Já no PIB, a indústria de transformação havia caído 3,1% no quatro trimestre de 2011 em relação ao de 2010 e caiu 2,6% no primeiro trimestre de 2012 na comparação com seu trimestre correspondente do ano passado. "Houve uma desaceleração na queda", explica Claudia Dionísio, economista da equipe das Contas Nacionais do IBGE, justificando, segundo ela, que o número na ponta (trimestre contra trimestre anterior) tenha sido positivo, embora, na verdade, o número consolidado seja negativo tanto no PIB quanto na PIM.

As demais explicações apresentadas pelos técnicos do IBGE são bem mais complexas e difíceis de entender. Uma delas é o fato de a PIM medir apenas o volume produzido em um período, ou seja, ela olha a produção industrial apenas pelo lado da oferta de produtos feita pela indústria.

Já o PIB também faz a medida da indústria e dos demais setores (agropecuária e serviços) pelo lado da oferta e em seguida verifica o comportamento da economia pelo lado da demanda, computando o consumo das famílias, do governo, investimentos e exportações, descontadas as importações que contam negativamente por suprirem uma "carência" da oferta doméstica. No fim, os números da oferta dos produtores precisam bater exatamente com os da demanda dos consumidores. Rebeca explica que para chegar a esse equilíbrio entre as duas partes, às vezes, são necessários ajustes, fato que não ocorre na PIM.

Outro ponto, segundo a técnica do IBGE, é que enquanto a pesquisa mensal mede o volume de produção, o PIB mede o valor adicionado à produção em um determinado período, a preços do ano anterior para que o volume de produção não seja contaminado pela elevação dos preços entre os dois períodos em comparação.

O valor adicionado é extraído abatendo-se da produção o chamado consumo intermediário, ou seja, os insumos utilizados na produção do mesmo bem, no caso de um veículo, aço e pneus, entre outros. Claudia explica que a variação da agregação de valor em geral não é a mesma da simples diferença da produção. Até porque as Contas Nacionais levam em conta quantidade e qualidade do produto. Uma produção de maior valor agregado, poderia, portanto, gerar um PIB industrial maior que o dado da simples produção física, onde a qualidade não é considerada.