Título: Redes privadas aderem em bloco ao novo modelo do Farmácia Popular
Autor: Vieira, André
Fonte: Valor Econômico, 15/09/2006, Empresas, p. B5

As grandes redes de farmácias e drogarias privadas estão embalando a segunda fase do Farmácia Popular, o programa de venda subsidiada de medicamentos de hipertensão e diabetes do governo federal lançado no fim de março.

A primeira fase do programa limitava a venda de medicamentos com preços baixos produzidos por laboratórios oficiais e vendidos em farmácias criadas pelo próprio governo. O novo modelo foi aberto ao setor privado e recebeu a adesão de grandes redes de farmácias, que vêem uma possibilidade de atrair mais clientes para o interior de suas lojas e ampliar o faturamento.

Até agora, o programa já credenciou 2.413 farmácias privadas em todo o país, segundo o Ministério da Saúde. Outras 1.437 unidades estão em processo de conexão ao sistema de informática do Datasus, a central de processamento de dados do ministério.

Um balanço realizado pelo Valor indica a adesão maciça das redes privadas. Na lista, aparecem Drogasil (com sede em São Paulo), Drogaria São Paulo (SP), Droga Raia (SP), Drogão (SP), Onofre (SP), Pacheco (RJ), Araújo (MG), Panvel (RS) e Pague Menos (CE), as maiores do Brasil.

Essas redes, juntas, administram cerca de 1,4 mil estabelecimentos, principalmente nas regiões metropolitanas, o que dá quase 60% do universo credenciado. Em alguns Estados, apenas elas possuem autorização para a venda dos remédios subsidiados. A Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma) apóia o programa.

O diretor-executivo da Vidalink, empresa de gestão de benefícios medicamentos, Luis Gonzales, tem notado a alto interesse das farmácias, mas a burocracia tem emperrado o credenciamento. "Conseguimos habilitar apenas 10% de 800 farmácias que solicitaram a inclusão no programa", afirma. A Vidalink, empresa do grupo atacadista Martins e da americana Caremark, possui um sistema homologado para venda no programa.

Segundo as farmácias, as vendas ainda são inexpressivas, embora crescentes. A Drogasil vendeu 1,3% a mais em agosto com os medicamentos da lista do Farmácia Popular na comparação com o período de março a junho.

"O programa, que é vantajoso ao consumidor, é ainda desconhecido", explica Antônio Carlos Freitas, diretor comercial da Drogasil, que faturou R$ 658,5 milhões em 2005. Para torná-lo conhecido, a rede dedicou um espaço interno para divulgação do programa nas 153 lojas credenciadas em São Paulo e Minas Gerais.

As redes de farmácias têm identificado também uma melhora no sistema de comunicação com o Datasus. "No início, de cada 15 pedidos, apenas uma venda era efetivada. Com o aperfeiçoamento no sistema, vende-se um a cada cinco pedidos", diz Marcos Arede, da Drogaria Onofre, com 32 lojas em São Paulo e Rio de Janeiro e vendas de R$ 500 milhões em 2005.

O Valor acompanhou a compra de uma caixa de maleato enalapril, uma droga contra hipertensão numa unidade da Panvel, em Porto Alegre. O sistema autorizou o pedido, mas na hora de pagar no caixa, o pedido teve de ser refeito. Na segunda tentativa, houve sucesso. A operação não demorou mais do que cinco minutos. O remédio, que saía R$ 13,06 fora do programa, custou R$ 1,31 ao consumidor - um desconto de 89,96%. O subsídio do governo pago à farmácia foi de R$ 11,75.

Segundo o ministério, o Datasus diagnosticou freqüentes falhas na digitação de informações pelas farmácias. E promete fornecer uma nova ferramenta de conexão para os pequenos estabelecimentos.

Dados do Ministério da Saúde mostram que o programa atende 6 mil vendas por dia. Para 2006, o ministério alocou R$ 76 milhões, menos de 1,7% do orçamento para distribuição gratuita de remédios pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O Valor consultou três redes de farmácias. Nenhuma delas identificou, até agora, atraso nos pagamentos feitos mensalmente pelo governo.

Uma crítica apontada pelos especialistas é a pequena dimensão do programa. Hoje, as 2.413 unidades já credenciadas correspondem a 5% do universo estimado de mais de 50 mil farmácias em todo o país.

"Já ouvi falar sobre o programa, mas acho que a burocracia é tão grande que dificilmente irei aderir", desabafa Rodolfo Ortiz, sócio de uma pequena farmácia na avenida Rio Pequeno, região popular na zona oeste de São Paulo. Num raio de um quilômetro, existem oito farmácias. Nenhum delas faz parte da fase dois do programa do governo. "A maioria da população compra nas farmácias de bairro, não nas redes", diz Ortiz.

Para se credenciar, o estabelecimento precisa ter as contas em dia além de investir em equipamentos de informática. Nem todas, contudo, estão habilitadas. Uma pesquisa da consultoria McKinsey e da advocacia Pinheiro Neto, divulgada no fim de 2005, mostrou que sonegação fiscal no varejo farmacêutico oscila entre 45% e 50%. O estrago corresponde a R$ 1,4 bilhão a R$ 1,7 bilhão.

Segundo especialistas, o programa Farmácia Popular deverá decolar caso seja divulgado, se os canais de vendas forem expandidos e as patologias atendidas ampliadas. E, consequentemente, o orçamento do programa. Por conta da Lei Eleitoral, o governo federal está proibido de fazer sua divulgação.

Os remédios para hipertensão e diabetes, que exigem tratamento contínuo, correspondem a 3% a 5% do faturamento de uma farmácia, segundo estimativas. A lista do Ministério da Saúde atende apenas oito princípios ativos, que incluem medicamentos de marca e genéricos, em 200 apresentações.

O diretor-presidente da Farmais, Paulo Shima, avalia que o programa poderá beneficiar a população mais carente. "Em alguns casos, o sujeito pode ir na farmácia pagar R$ 1 por um medicamento e economizar a passagem de ônibus que gastaria caso fosse pegar o mesmo remédio de graça num posto de saúde", exemplifica.

A Farmais, que possui mais de 600 lojas por meio de franquias em sete Estados, homologou seu sistema de informática junto ao Datasus no fim de agosto e prevê credenciar metade dos estabelecimentos em 90 dias.

O Ministério da Saúde informou que não tem uma meta de credenciamentos. "A adesão ao programa é uma decisão ou opção da farmácia ou drogaria", disse o ministério por meio de sua assessoria de imprensa.

O ministério avalia que a segunda fase do Farmácia Popular está em processo de avaliação. "O programa foi concebido com o objetivo de atender a pacientes de duas doenças bastante prevalentes no país e cujo tratamento deve ser continuado", disse.

O ministério informou que o elenco de medicamentos poderá ser modificado caso seja verificada a necessidade de ampliação ou readequação da lista dos remédios conforme a demanda social. Calcula-se que existam 16,8 milhões de pacientes hipertensos e outros 5 milhões que sofrem de diabetes no Brasil.