Título: Apesar da tensão, economia passa por bom momento
Autor: Leo, Sérgio e Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 15/09/2006, Internacional, p. A12

A situação política é tensa, há queixas de empresários em relação à insegurança nos contratos de prazo mais longo, mas neste ano, o desempenho da economia boliviana sob o governo Evo Morales pode ser classificada de excelente. Beneficiada pelo aquecimento na economia mundial, que elevou os preços de minérios e do óleo, e fortalecida com novos recursos propiciados pela nacionalização das reservas de gás e petróleo, a Bolívia deve crescer 4,5% este ano. Concluiu o primeiro semestre com baixa inflação, níveis recordes de exportação e reservas internacionais e um inédito superávit nas contas do governo.

Apesar de ter ensaiado pedir dinheiro ao Banco Central para cobrir as necessidades financeiras da YPFB, Morales respeitou a autonomia da autoridade monetária, e nomeou um técnico quando o presidente do BC pediu demissão. Esse técnico recusou a ajuda à YPFB. Morales também enfrentou críticas ao garantir a responsabilidade fiscal e conceder um aumento inferior a 14% ao salário mínimo, hoje de 500 bolivianos (pouco mais de de US$ 60). As queixas foram abafadas pela euforia com a nacionalização do setor de gás e petróleo.

Os esforços do governo de estender impostos a setores não tributados tem gerado protestos, mas conseguiu impor a medida a empresas de ônibus. O governo reduziu um pouco cargos e gastos.

"A situação econômica não poderia ser melhor", comenta o diretor de Mestrado em Desenvolvimento na prestigiada Universidade Católica de Bolívia, apontando os fatores externos e as rendas do setor de gás e petróleo como fortes responsáveis. "Estou quase me convencendo de que o governo tinha razão", diz o analista independente, ironizando a estabilidade na economia boliviana, apesar das incertezas apontadas pelo setor privado. Ele nota que o sistema bancário, apesar das turbulências, se mantém saudável - é o setor de mais alta lucratividade no país. "A nacionalização foi um trunfo para o governo; quanto ao longo prazo, os políticos na América Latina não pensam nesses termos".

O próprio Morales reconheceu, no início da semana, que falta de competência administrativa - que ele atribui à inexperiência de governo - impediu a Bolívia de aproveitar vantagens em acordos assinados com a Venezuela, e levou a uma baixa execução do orçamento federal.

É na esfera política que Morales encontra a maior dificuldade. Em meio a disputas nas correntes internas do partido governistas, o MAS, até agora ganharam os que defendem uma radicalização na luta política para tirar privilégios das elites tradicionais e dar maior poder aos movimentos sociais.

O enfrentamento na Assembléia Nacional Constituinte praticamente paralisou os trabalhos, aumentando a incerteza para os investidores. É a Constituição que definirá, por exemplo, o marco legal para investimentos e para o uso das reservas naturais. O governo, que ganhou maioria na Constituinte mas não os dois terços de votos necessários para sua aprovação, decidiu que os artigos da futura Constituição serão aprovados por maioria simples. A decisão provocou críticas da oposição, que saiu da inércia e ganhou popularidade, com uma paralisação de um dia na região mais rica do país. (SL)