Título: O papel das empresas na Rio+20: de inimigos a amigos?
Autor: Bapna ,Manish
Fonte: Valor Econômico, 22/06/2012, Opinião, p. A14

Na reunião dos líderes mundiais na Rio+20, as empresas estarão amplamente representadas nas mesas de negociações. Os tempos mudaram. Durante a Cúpula da Terra original, o setor privado era visto com ceticismo, para não dizer hostilidade explícita, por ONGs e a sociedade civil. Hoje, os governos e grupos ambientalistas acreditam que as empresas devam ser parceiras e não adversárias na busca de um desenvolvimento sustentável.

O que provocou essa mudança marcante de atitude? Com a intensificação das crises ambientais e sociais, há um reconhecimento crescente de todos os lados - incluindo CEOs de olho no futuro - de que as empresas devam ser parte da solução. O setor privado tem dois papéis cruciais a desempenhar. As empresas, especialmente as corporações de alcance global, podem e devem minimizar os impactos negativos sociais e ambientais de suas operações. Segundo, que as empresas devem focar em inovação e empreendedorismo para a criação de novos mercados e produtos baseados no desenvolvimento econômico sustentável.

As multinacionais e os investidores estão cada vez mais cientes dos riscos para suas operações e lucros por falhas na gestão ambiental, ou pela escassez de recursos e das mudanças climáticas. A expectativa é que, por volta de 2025, a demanda de água doce tenha um aumento de 50% nos países em desenvolvimento e de 18% nas nações desenvolvidas. Esse aumento atinge diretamente o setor agrícola e outros dependentes de um fornecimento regular de água. As mudanças climáticas já causam problemas da agricultura à silvicultura, do planejamento urbano ao desenvolvimento.

Corporações podem usar sua habilidade de inovar para conduzir a economia global por um caminho sustentável

Algumas empresas têm reagido com estratégias de redução de riscos ao contratarem seguros contra desastres naturais ou promoverem uma utilização mais eficiente de água e energia. Outras têm procurado limitar o impacto nos ecossistemas naturais. No mês passado, a Wal-Mart e a PepsiCo se uniram às empresas brasileiras Vale e Votorantim como sócias fundadoras, juntamente com a World Resources Institute (WRI), Fundação Getúlio Vargas (FGV) e o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), da Parceria Empresarial pelos Serviços Ecossistêmicos (PESE). O objetivo é ajudar as empresas no Brasil a desenvolver estratégias de negócios que melhorem tanto o desempenho corporativo como a conservação de ecossistemas, particularmente na Amazônia.

Gerenciar riscos é apenas o começo. As corporações podem usar sua habilidade de inovar e expandir negócios para conduzir a economia global por um caminho mais sustentável. Empresas nos Estados Unidos e na Europa já iniciaram essa jornada, exibindo resultados lucrativos. GE, Kimberly Clark, Nike e Ikea são apenas algumas das muitas companhias que estabeleceram metas de geração de novos produtos e serviços que levam em conta a sustentabilidade e, ao mesmo tempo, garantam a produção de lucros.

No Brasil, a Natura é provavelmente o exemplo mais conhecido de empresa próspera que, em parceria com comunidades locais, incorpora a utilização responsável dos recursos naturais. Em uma escala menor, outros empreendedores locais têm seguido esse exemplo, incluindo a Ouro Verde, uma unidade de processamento de castanhas do Pará e de açaí com base no Mato Grosso, que tem trabalhado na expansão de seus negócios ao mesmo tempo em que cuida da preservação das florestas.

Até mesmo as empresas mais progressistas só irão aderir à sustentabilidade na medida em que ela ajude, ou pelo menos não prejudique, seus resultados. E as retardatárias - ainda uma grande proporção das maiores empresas - não tomarão qualquer atitude mais sustentável até que sejam estimuladas por políticas ou regulamentações governamentais.

Como os governos e negócios pioneiros podem ajudar na realização de avanços reais em relação à sustentabilidade?

Diretrizes claras e consistentes são essenciais para impulsionar decisões empresariais mais sustentáveis. Isso inclui valorizar recursos de benefício público, tal como garantir que temos água potável, florestas preservadas e um clima estável. Sem os sinais corretos, as empresas não agirão com a rapidez exigida. Não esperamos que a Rio+20 resolva esse desafio de políticas, mas há vários passos que podem ajudar a criar a base para ações empresariais mais ambiciosas quanto à sustentabilidade.

Os governos e as empresas deveriam adotar o requisito do projeto de declaração da Rio+20 que exige relatórios mandatórios de desempenho ambiental, social e de governança. Isso ajudaria a estabelecer a confiança da sociedade civil e nivelaria o grau de competitividade entre as empresas que agem em relação à sustentabilidade e aquelas que a ignoram.

Governos e empresas deveriam apoiar a Declaração de Capital Natural, começando pelo setor financeiro internacional, o que inclui participantes influentes do mundo bancário multilateral e do comercial. Ao estabelecer um valor para os bens naturais, essa medida visa proteger melhor os ecossistemas, o que é essencial para acelerar a ação empresarial quanto à sustentabilidade.

Governos e empresas deveriam explorar abordagens e arenas concretas para o aumento das parcerias entre os setores público e privado e promover o desenvolvimento sustentável. Uma das áreas em que poderia fazer uma grande diferença seria na criação de condições para alavancar investimentos privados e aumentar o uso de tecnologias verdes em setores como o das energias renováveis. Outra, no combate ao desafio do gerenciamento equitativo e sustentável de recursos hídricos.

Nos 20 anos mais recentes aprendemos que, com políticas e incentivos corretos, é possível amalgamar um crescimento econômico robusto e a proteção ambiental. Os líderes empresariais e governamentais que retornam ao Rio devem proferir quais são os próximos passos concretos para criarmos um futuro mais sustentável.

Manish Bapna e Kirsty Jenkinson são, respectivamente, o presidente interino e a diretora do Programa de Mercados e Empreendimentos do Instituto de Recursos Mundiais (World Resources Institute).