Título: PF não viu envolvimento de ministro com bicheiro
Autor: Cunto , Raphael Di
Fonte: Valor Econômico, 30/05/2012, Política, p. A8

Colocado pelo PT entre os investigados pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Cachoeira, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), é citado em conversas telefônicas gravadas na Operação Monte Carlo, mas não é detectada nenhuma irregularidade, segundo relatório elaborado pelo delegado da Polícia Federal Matheus Rodrigues - responsável pela prisão do bicheiro.

Segundo a PF, o senador Demóstenes Torres diz a Carlinhos Cachoeira que teria conseguido que o ministro "puxasse" o processo que discute dívida da Companhia de Eletricidade de Goiás (Celg) para o STF. Demóstenes diz que Mendes "mandou buscar e dar repercussão geral" ao processo, que poderia reerguer a empresa em caso de vitória.

"Note-se que não há qualquer referência de ilegalidade no procedimento de Demóstenes com o ministro Gilmar Mendes. Este diálogo, dentre outros, serve fundamentalmente para demonstrar que Demóstenes Torres tem o hábito de informar Carlinhos Cachoeira de sua atuação política, além de já ter pedido alguns conselhos políticos a Cachoeira", diz o relatório. Entre esses assuntos estava a ideia do senador de trocar o DEM pelo PMDB.

Em depoimento no Conselho de Ética do Senado ontem, o parlamentar negou que tenha procurado o ministro do STF para "puxar" o processo. "Eu simplesmente comemorava uma decisão de um ministro do Supremo que poderia salvar uma empresa importante para o Estado de Goiás", disse.

Outra gravação mostra o interesse de se aproximar do ministro. Demóstenes liga em agosto para Cachoeira para desmarcar um jantar porque foi convidado para o aniversário da esposa de Mendes. "Desculpa aí, mas é que tem que fazer esse relacionamento aqui, que é bom pra gente, né?", disse o senador.

O alvo do PT é uma viagem feita por Demóstenes e Mendes a Berlim em abril de 2011, quando, segundo a versão dos dois, ambos se encontraram em Praga após cumprir compromissos profissionais e foram até a Alemanha, onde mora a filha do magistrado. Esse passeio foi, segundo o ministro, usado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como forma de pressionar pelo adiamento do mensalão - o que o petista negou.

Nas gravações, Cachoeira e o ex-vereador de Goiânia Wladimir Garcez (PSDB) discutem o empréstimo de um avião para o senador utilizar no traslado de São Paulo a Brasília, logo após voltar de Berlim, que ocorreria em dois dias. Wladimir diz que "o Gilmar" está com Demóstenes e consegue reservar o jatinho de Rossini Aires Guimarães, sócio de Cachoeira em duas empresas.

Os telefonemas não deixam claro se Gilmar embarcou com Demóstenes no jatinho. Ontem, o senador disse que voltou antes da viagem. "Eu usei o avião, e não o ministro Gilmar Mendes", disse. Na entrevista acima, Mendes disse ter comprovantes das milhas usadas para o vôo entre Guarulhos e Brasília, mas confirma ter viajado duas vezes em aviões particulares para eventos relacionados a Demóstenes.