Título: CPI quebra sigilo de contas nacionais da Delta
Autor: Junqueira, Caio
Fonte: Valor Econômico, 30/05/2012, Política, p. A9

A relação entre PT e PMDB se fragilizou ontem após a quebra do sigilo das contas nacionais da construtora Delta, ocorrida durante sessão da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga as relações do empresário Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, com autoridades e empresas.

O PT acusou a entrada em cena do líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN). Com o objetivo, segundo petistas, de angariar apoio dos deputados tucanos na sua eleição para a presidência da Câmara em 2013, o pemedebista articulou para derrubar, nos bastidores, os requerimentos de convocação e de quebra do sigilo bancário, telefônico e fiscal do governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB).

Na véspera, Alves acertou com o líder do PSDB na Câmara, Bruno Araújo (PE), que um deputado da base apresentaria uma questão de ordem em que questiona juridicamente a legitimidade de uma CPI para convocar governadores. O escolhido foi o deputado Gladson Cameli (PP-AC), que leu o documento e sustentou a seguinte tese: a investigação de governadores por meio de uma CPI fere o pacto federativo e a autonomia dos Estados.

Ocorre que a quebra de sigilo de Perillo se tornou prioridade para o PT na CPI. Até a semana passada, o partido queria constrangê-lo com uma convocação à CPI. Mas nesta semana passou a valer a avaliação de que um eventual depoimento seu na comissão apenas daria espaço para o tucano se defender.

Isso foi reforçado com a presença do governador ontem, na CPI. Marconi Perillo entregou ao presidente, senador Vital do Rego Filho (PMDB-PB), um documento em que pede para comparecer à comissão.

"Oportuno, por sinal, rememorar minha trajetória política, trazendo formalmente ao conhecimento do Parlamento minha história de trabalho sério e comprometido com o interesse público, construindo assim uma vida pública absolutamente honrada e transparente", disse Perillo no texto. O governador afirmou ainda que se colocaria à disposição da CPI "com a tranquilidade dos justos".

Vital disse que iria entregar o questionamento jurídico de Cameli à sua assessoria técnica e que, assim, seria necessário adiar o pedido de convocação dos governadores. "Como a matéria é controversa, a presidência não atende, não acata, nem nega a questão de ordem. Recolhe e determina parecer técnico e vai trazer a decisão para a próxima reunião imediatamente após esta", disse. Naquele instante, apenas os senadores Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) e Pedro Taques (PDT-MT) protestaram.

Isso levantou suspeitas entre integrantes da CPI de que havia um acordo entre os três principais partidos, PT, PMDB, e PSDB, para poupar seus governadores da investigação. Respectivamente, Agnelo Queiroz, do Distrito Federal; Sérgio Cabral, do Rio de Janeiro; e Perillo.

Na sequência, o relator, Odair Cunha (PT-MG), disse que colocaria em votação três requerimentos. Dois deles, de autoria dos deputados Rubens Bueno (PPS-PR) e Onyx Lorenzoni (DEM-RS) eram semelhantes: quebrar o sigilo das contas nacionais da Delta. O terceiro, do PMDB, apoiava essa quebra de sigilo, mas desde que limitado às contas nacionais relacionadas com o Centro-Oeste do país.

Foi aí que a relação entre PT e PMDB azedou de vez. No primeiro documento a ser votado, de Onyx Lorenzoni, a ordem da votação era pelo bloco de senadores petistas. Os dois primeiros, José Pimentel (PT-CE) e Humberto Costa (PT-PE), votaram pela aprovação do requerimento. Mas segundo pemedebistas, havia um acordo prévio para que o PT apoiasse o requerimento do PMDB.

O PT confirma esse acordo prévio. Argumenta, contudo, que houve uma divisão nas bancadas da Câmara e do Senado e que, quando todos notaram, pelos votos subsequentes, que a quebra do sigilo nacional da Delta seria inevitável, passaram a apoiar o requerimento de Lorenzoni.

Nesse sentido, o único a manter o acordo, no voto, foi o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP). Nem o PMDB o seguiu. Os deputados Luiz Pitiman (PMDB-DF) e Leonardo Picciani (PMDB-RJ) votaram sim. Assim como os senadores Ricardo Ferraço (PMDB-ES) e Sérgio Souza (PMDB-PR).

Aí passou a valer uma guerra de versões, de modo que o único entendimento mais comum era a de que o que ocorreu ontem na CPI explicitou mais ainda a falta de comando e organização da base governista na comissão.

O PMDB e PT, da Câmara e do Senado, têm tido dificuldades em acertar o passo na CPI. Por essa razão, nem todos endossam os acordos feitos pelos seus correligionários.

Por exemplo, ontem, o PMDB mais ligado a Sérgio Cabral se preocupava muito mais em evitar a quebra de sigilo nacional da Delta do que articulações favoráveis a Perillo. Ao mesmo tempo, enquanto o PT da Câmara tenta seguir afinado, o do Senado evita compactuar da sua estratégia de acordos com o PMDB.

A sessão acabou devido ao início da ordem do dia no Senado. Pelo regimento, nenhuma comissão atuar enquanto há votações no plenário. Hoje, comparece à reunião o ex-diretor da Delta no Centro-Oeste, Cláudio Abreu. Antes da sessão, porém, o PT vai tentar aprovar a quebra do sigilo de Perillo.

Também podem ser colocados em votação os requerimentos de convocação dos governadores. Para tanto, o presidente da CPI terá de dar sua posição sobre a questão de ordem apresentada por Gladson Cameli. A tendência é que ele não dê a resposta hoje.