Título: Economia com dívida pode chegar a R$ 56 bi
Autor: Garrido , Juan
Fonte: Valor Econômico, 31/05/2012, Especial, p. F2

Analistas de contas públicas calculam que se a taxa Selic mantiver o equilíbrio num patamar médio de 8% ao ano até o final de 2014, poderá haver uma economia de R$ 56 bilhões em serviço da dívida do governo federal no período. Isso significaria R$ 18,5 bilhões anuais de redução de despesas com o carregamento da dívida. "Para que esta meta se concretize será necessário que o ritmo de crescimento do estoque da dívida acompanhe a onda descendente e oscile levemente para baixo, algo como 9% de expansão ao ano doravante - o que é bastante factível -, em vez dos 10% anuais verificados nos últimos três anos", diz Ernesto Lozardo, professor de Economia da Escola de Administração da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP).

O especialista lembra que o perfil de vencimento da dívida do governo federal é de 40 meses. Nesse espaço de tempo todo o estoque da dívida é resgatado e renovado. "Para facilitar os meus cálculos, arredondei esse perfil para 36 meses, três anos cheios", justifica Lozardo, acrescentando que tal rolagem é a que tem provocado o crescimento do estoque em 10% ao ano ultimamente, o que resultou num valor total de pouco mais de R$ 1,8 trilhão em dezembro de 2011.

Se o estoque da dívida do governo federal continuasse crescendo anualmente 10% nos próximos três anos (a contar de dezembro passado), em 2014 a soma chegaria a R$ 2,4 trilhões. "Mas se a taxa de expansão do estoque se reduzisse na faixa de 1% ao ano - ou seja, crescesse 9% ao ano no triênio -, este chegaria ao último mês do governo Dilma Rousseff com um valor total de R$ 2,3 trilhões", calcula Lozardo. "Essa taxa média considera tudo o que o governo federal deve no curto, médio e longo prazo, ou seja, as LFTs - diretamente vinculadas à Selic -, LTNs e variadas séries de NTNs", explica.

Para o professor da FGV-SP, se a taxa Selic média permanecesse no patamar de 10% ao ano nos próximos três anos - e o ritmo médio de expansão do estoque se mantivesse em 10% anuais -, o montante de juros a ser pago de janeiro de 2012 a dezembro de 2014 seria de R$ 240 bilhões. Mas com a Selic média de 8% ao ano e o estoque crescendo 9% anuais, o gasto com juros diminuiria para R$ 184 bilhões até o final do triênio. "Ou seja, no final do período haveria uma redução de R$ 56 bilhões, o que daria uma média de gastos com juros da dívida de R$ 18,5 bilhões ao ano."

Na visão de Lozardo, a redução da Selic vai ter reflexos tanto na melhoria do capital de giro das empresas como na capacidade de consumo das famílias. "Mas o governo sinalizou que só isso não basta, é preciso reduzir o spread bancário que foi praticado em níveis absurdos nos últimos tempos", comenta.

O economista Paulo Kliass, especialista em políticas públicas e gestão governamental, exprime entusiasmo com o atual contexto de queda da Selic, mas alerta que o brasileiro tem memória curta. Segundo ele, apesar das evidências induzirem a análises otimistas, é preciso cautela na projeção de cenários futuros, em primeiro lugar pelo fato de que há muito pouco tempo a Selic chegou a permanecer em nível até mais baixo que o de hoje. "Pouco se fala que entre 23 de julho de 2009 e 28 de abril de 2010 a taxa básica foi de 8,75%", aponta. Durante nove meses viveu-se uma situação semelhante à atual, com possibilidades objetivas para romper com a política monetária restritiva. "Mas a opção do ex-presidente Lula foi outra e a taxa voltou a subir logo depois", comenta, lembrando que Lula passou a faixa presidencial com a Selic em 10,75%.

Em relação à recente queda de braço entre o governo e o sistema financeiro privado - com o primeiro promovendo queda acentuada das taxas de juros dos bancos oficiais - o consultor Amir Khair, mestre em finanças públicas pela FGV, acha que os movimentos iniciais da disputa favorecem amplamente o governo. "Os bancos privados já diminuíram de forma razoável os níveis máximos e mínimos das taxas de suas diversas modalidades", diz, acrescentando, porém, que essa baixa está distante daquela que ainda deverá ocorrer. "Além de derrubar as taxas do Banco do Brasil e da Caixa, o governo tem outros elementos para induzir os bancos a diminuir mais os juros, em caso de haver uma resistência muito pesada por parte deles."

Para Khair, se a queda nos níveis da Selic reduz os ganhos de tesouraria das instituições privadas que compram títulos do governo, o tabelamento das tarifas bancárias teria função semelhante. Ele prevê que os bancos vão continuar tentando compensar as perdas de tesouraria encarecendo tarifas de serviços e/ou reduzindo o crédito. "Acho que está na hora de tabelar tarifa mesmo", defende, sugerindo ainda que uma política passível de ser adotada em nível de Conselho Monetário Nacional seria atrelar o depósito compulsório à taxa de juros praticada pelos bancos.

O consultor explica que, por meio de uma política dessas, o banco que praticasse taxa média de juros alta teria um percentual de depósito compulsório maior do que o atual. Na outra ponta, aquele que operasse com uma taxa média mais baixa teria o benefício de um compulsório menor. Ao mesmo tempo, incentivaria a competição no mercado.