Título: Gordura trans perde espaço nas prateleiras do varejo
Autor: D'Ambrosio, Daniela
Fonte: Valor Econômico, 20/09/2006, Empresas, p. B6

Até o começo deste ano, pouco se falava ou se sabia sobre gordura trans, que sequer aparecia na tabela de informações nutricionais. Em pouco tempo, porém, ela virou a grande vilã dos alimentos industrializados. Como o consumidor é quem dita as regras e dá sinais claros de preocupação com a saúde, as empresas correm contra o tempo para sair na frente da concorrência e estampar o selo "livre de gordura trans" em suas embalagens.

Depois das margarinas, as primeiras a eliminar esse tipo de gordura das suas formulações no ano passado - o pontapé inicial foi dado pela Unilever, que foi seguida por boa parte do mercado - agora outras categorias de produtos como sorvetes, pães e biscoitos começam a aparecer nas prateleiras isentos ou com redução da trans, que não só aumenta o colesterol ruim (LDL) como diminui o bom (HDL).

Em 2003, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) fez uma portaria determinando que as empresas tinham até julho deste ano para especificar na embalagem a quantidade de gordura trans dos produtos.

Uma pesquisa mais atenta às gôndolas, mostra, no entanto, dois cenários bem distintos: marcas que ainda não informam separadamente o percentual de gordura trans e, no outro extremo, empresas que foram além da determinação e retiraram essa gordura de seus alimentos.

"Por conta dos estoques, resolvemos estender o prazo até o final deste ano, antes disso as empresas não serão multadas", diz Rodrigo Martins de Vargas, especialista em regulação e vigilância sanitária da Anvisa. "Percebemos uma mobilização da indústria para retirar a gordura trans", observa.

A gordura trans surge no processo industrial da hidrogenação que transforma óleos fluídos em sólidos. Ela garante cremosidade, crocância e mais sabor, além de aumentar a vida útil dos produtos. O grande desafio, portanto, é conseguir um produto sem a tal gordura, mas que mantenha as características da fórmula anterior. E, claro, sem mexer no preço. "A complexidade técnica é muito grande", diz Jurema Aguiar, diretora de marketing, da M.Dias Branco, que produz a marca Adria.

A M. Dias Branco colocou no mercado, há dois mesers, a primeira marca de biscoito recheado livre de trans. Batizado de Plugados, o novo biscoito destina-se ao público de até 13 anos. "Escolhemos um produto infantil, pois percebemos que a preocupação das mães é muito grande", diz Jurema.

O produto ficou pronto depois de três anos de desenvolvimento e as outras linhas de biscoito da marca Adria continuam com gordura trans. "O fato de termos chegado a uma formulação ideal para um biscoito não significa que servirá para todos os outros produtos", diz a diretora de marketing. "Precisamos partir do zero nos demais biscoitos, mas o objetivo é levar para todo o portfólio." A água e sal da Adria, por exemplo, informa na embalagem a presença de 1g de gordura trans para cada 100 gramas de bolacha.

A argentina Arcor, que fez uma joint venture com a Danone na área de biscoitos, já tem em todas as suas embalagens a informação sobre a trans, mas não retirou a substância dos alimentos. O biscoito wafer da Triunfo, por exemplo, tem 8,2 gramas de trans por porção de 100 gramas. "A Arcor tem trabalhado no sentido de buscar alternativas para reduzir o teor de gordura trans sem prejudicar a qualidade e oferecendo produtos com preços acessíveis aos nossos consumidores", disse a empresa por e-mail. "Estamos trabalhando no desenvolvimento de uma linha livre de trans."

A Bimbo, que fabrica as marcas Pullman, Plus Vita e Ana Maria, fez uma parceria com seus fornecedores (Bunge e Cargill) para, num primeiro momento, reduzir o teor de gordura trans. A empresa não diz de quanto é essa redução. Até março de 2007, a Bimbo pretende eliminar a gordura de todos os alimentos. A Seven Boys colocou um pequeno texto nas suas embalagens informando que retirou a gordura trans dos seus alimentos.

Depois de cinco anos de pesquisas, a Kibon começou a retirar a gordura trans de seus sorvetes no verão do ano passado. Hoje, toda a linha está livre da gordura, mas não está em destaque nas embalagens (somente na tabela de informações nutricionais). "O grande desafio é preço, já que o mercado é muito competitivo e mudança de um processo como esse é caro", diz Alexandre Bouza, diretor de marketing da Kibon, da Unilever.

Grandes empresas, como Nestlé e Bauducco ainda não retiraram a gordura trans de seus alimentos, mas já estão revendo os processos ou fazendo a retirada de forma gradativa. A Nestlé, por exemplo, retirou a gordura dos biscoitos wafer Tostines, mas o ingrediente continua no restante da linha.

No caso de alimentos fritos, por exemplo, a substituição do óleo de soja por óleo de palma já garante a eliminação de trans. Por conta disso, a maioria dos salgadinhos do mercado não contêm a gordura. A Elma Chips, por exemplo, agora estampa na frente das embalagens de toda a sua linha de salgadinhos a frase "0% de gordura trans".