Título: STF acende luz vermelha para ficha suja
Autor: Correio, Visão do
Fonte: Correio Braziliense, 29/10/2010, Opinião, p. 18

A decisão do Supremo Tribunal Federal que considerou inelegíveis os candidatos com histórico de renúncia aos mandatos para escapar de cassações estabeleceu em definitivo a aplicação da Lei da Ficha Limpa para casos da espécie. Não foi atingido apenas o deputado Jader Barbalho, impedido de chegar ao Senado, para o qual foi eleito, em virtude do pecado apreciado pela Corte nesta semana. Os políticos que se encontram na mesma situação, uma vez dispostos a recorrer tal qual Barbalho, terão igual destino.

Cumpre ressaltar, contudo, que o aresto do STF foi além do cumprimento da Lei da Ficha Limpa. Aditou-lhe o respeito ao conjunto de garantias constitucionais que desfavorece a imoralidade pública e a conduta de gestores incompatibilizados com a lisura. O resultado contrário a Jader Barbalho abre expectativa para que os demais implicados em rejeição pelo Tribunal Superior Eleitoral por renúncia ou por outra causa sejam também condenados.

É a lógica que se extrai das inspirações que nortearam o pronunciamento da mais alta instância judicial do país. O que fica como valor político é a disposição da judicatura, do primeiro ao último grau, de não admitir a contaminação das entidades legislativas pela corrupção. Contribui para tirar semelhante ilação a denúncia contra 40 envolvidos no esquema do mensalão e acolhida pelo ministro relator, Joaquim Barbosa.

Trata-se de precedente didático e moralizador. Os que, no exercício de representação política, cultivavam a ideia de que o mandato lhes garantia a impunidade pensarão duas vezes antes de embarcar em aventuras ilegais. Agora ficam conscientes de que a Justiça, em particular o STF, se mantém disposta a puni-los.

Aí se registra o ajustamento da interpretação jurídica aos anseios moralizadores da coletividade nacional. É confortável observar que o avanço da instituição judiciária quanto a tarefas desse porte prenuncia mais rigor no julgamento dos que, protegidos por certas salvaguardas funcionais, esperam a indulgência dos magistrados.

Há muito os brasileiros queriam dar esse passo ético. Os partidos políticos se negaram a ouvir os apelos dos cidadãos de bem. O Congresso, formado por vencedores, tampouco se mobilizou efetivamente para impedir que fichas sujas continuassem a disputar mandatos. Foi necessário recorrer à iniciativa popular para iniciar a faxina nas instituições. A decisão do Supremo Tribunal Federal veio ao encontro dos anseios da sociedade.