Título: Problema no país é bancário, como foi nos EUA
Autor: Spiegel , Peter
Fonte: Valor Econômico, 11/06/2012, Finanças, p. C12

O anúncio feito pela Espanha, de que vai buscar a ajuda da União Europeia (UE) para amparar seus combalidos bancos, faz dela o quarto país da zona do euro a entrar em um programa de resgate. Mas o socorro à Espanha, que poderá chegar a €100 bilhões, será muito diferente dos planos montados para a Grécia, Irlanda e Portugal.

Ao contrário da Grécia, os problemas da Espanha não tiveram origem em um excesso de gastos pelo governo espanhol. Na verdade, Madri entrou na crise da zona do euro com um dos níveis de endividamento mais baixos na moeda única. A crise da Espanha é uma crise bancária ao estilo das ocorridas nos Estados Unidos e na Irlanda. Os bancos regionais de poupança do país, conhecidos como "cajas", investiram muito no boom imobiliário espanhol e tropeçaram quando a bolha estourou.

Enquanto nos EUA e na Irlanda os preços dos imóveis tiveram uma deflação em um período relativamente rápido, a bolha da Espanha só agora começa a entrar em colapso, graças em parte a uma grande desaceleração econômica. Como resultado, os bancos espanhóis precisam levantar ainda mais dinheiro para cumprir suas exigências internacionais de capital.

O Bankia, o quarto maior banco espanhol formado por um amálgama de sete "cajas" deficitárias, já foi parcialmente nacionalizado porque não conseguiu captar esses recursos por conta própria. Com o tamanho dos rombos dos banco ficando claro, as autoridades espanholas admitiram que outros bancos seguiriam o mesmo caminho e que precisavam do governo, em vez de dinheiro privado.

Enquanto isso, os custos dos empréstimos dispararam para o governo espanhol por causa das turbulências no resto da zona do euro, o que significa que o resgate concedido pelo governo seria caro. Ao obter ajuda dos fundos de socorro financeiro da zona do euro, que tomam recursos a taxas muito menores, os bancos conseguirão se recuperar mais rapidamente.

Até o ano passado, o fundo de resgate da zona do euro, de € 440 bilhões, tinha uma arma em seu arsenal: o socorro em plena escala. Mas após pressões de Bruxelas, a Alemanha concordou em conceder ao Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (EFSF, na sigla em inglês) vários instrumentos mais restritos, incluindo a capacidade de recapitalizar bancos.

Os empréstimos do EFSF precisam ir para um governo nacional antes de serem injetados em bancos deficitários, mas o novo "instrumento de recapitalização" permite que a ajuda seja fornecida sem os tipos de condições impostas à Grécia, Irlanda e Portugal. E o mais importante: o governo espanhol não terá que receber trimestralmente delegações das entidades emprestadoras para análise de suas contas.

Essas visitas trimestrais da chamada "troica" - Fundo Monetário Internacional (FMI), Comissão Europeia e Banco Central Europeu (BCE) - se transformaram em um para-raios político para Irlanda e Grécia. O governo espanhol não aceitou esse monitoramento.

O motivo de Madri ter saído vitoriosa é que ela já havia imposto grande parte desse tipo de austeridade exigida por Bruxelas. O orçamento de 2012 inclui € 27 bilhões em cortes de gastos e aumento de impostos. O governo também prometeu fazer cortes ambiciosos no ano que vem, para alcançar uma meta de déficit de 3% do PIB, exigida pela UE.

O governo espanhol conseguiu evitar qualquer outra coisa além dos compromissos pré-existentes com a UE para reduzir rapidamente seu endividamento e déficits aos limites da UE, mas haverá novas e significativas condições aos esforços de reestruturação de seus bancos. Sob os termos do "instrumento de recapitalização", a UE terá autoridade para realizar inspeções locais nos bancos que receberem ajuda e poderá contratar auditorias externas para ter certeza da solidez dos balanços dessas instituições.

As autoridades da UE estão preocupadas com a velocidade e a profundidade da reorganização e persistem as preocupações com o compadrio político nas "cajas", que por muito tempo sempre estiveram cheias de políticas locais.

Em um relatório divulgado na sexta-feira, o FMI listou 17 "recomendações de alta prioridade" para o setor financeiro espanhol, que ele quer ver implementadas imediatamente ou num "futuro próximo". Com o FMI desempenhando um papel central no programa espanhol, essa lista de controle deverá fornecer um modelo para novas condições.

Ao contrário dos resgates anteriores na zona do euro, este não incluirá dinheiro do FMI, que está impedido por suas regras de participar de resgates concentrados apenas no setor financeiro.

Em vez disso, todos os recursos virão do EFSF ou do novo fundo permanente de resgate da zona do euro de € 500 bilhões, o Mecanismo Europeu de Estabilidade (ESM, na sigla em inglês), que deverá estar funcionando no mês que vem, assim que todos os 17 países da zona do euro ratificarem o tratado do ESM.

Isso poderá se transformar em um ponto de discussão. Se os recursos vierem do EFSF, os empréstimos serão tratados como outros quaisquer, e neste caso os países da zona do euro não recebem nenhuma prioridade especial na fila de pagamento. Por outro lado, os empréstimos do ESM têm prioridade sobre quase todos os outros e alguns governos - incluindo o holandês e o finlandês - estão pressionando para que o programa seja estabelecido sob o ESM.

Um programa sob o ESM poderá fazer os credores governamentais se sentirem muito seguros, mas poderá assustar os credores privados, que não deverão gostar de ver € 100 bilhões em dívidas novas furando a fila. A última coisa que algumas autoridades querem é irritar os investidores privados, que ainda precisam emprestar dinheiro para o governo espanhol. Como resultado, há quem esteja pressionando para que o programa comece sob o EFSF, para que ambos os fundos participem, abrandando o problema da prioridade.