Título: China resiste a pressões para acelerar reformas
Autor: Balthazar, Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 20/09/2006, Finanças, p. C3

A China emitiu vários sinais nos últimos dias de que continuará resistindo às pressões que sofre para acelerar suas reformas econômicas, numa demonstração de que aumentar sua influência em organizações como o Fundo Monetário Internacional (FMI) vai contribuir pouco para tornar o país maleável diante de pressões externas.

Num discurso que fez no domingo para o comitê de ministros que estabelece diretrizes para a atuação do Fundo, o presidente do Banco Central da China, Zhou Xiaochuan, disse que a organização precisa respeitar a autonomia que seus membros têm para adotar o regime cambial que quiserem e pediu que o FMI preste mais atenção no que outros países andam fazendo.

"Cada país deve escolher o regime cambial apropriado de acordo com suas próprias necessidades de desenvolvimento", afirmou Zhou em seu discurso. "O Fundo deveria ampliar o monitoramento das políticas macroeconômicas dos países que emitem as principais moedas", acrescentou, numa referência aos Estados Unidos e à Europa.

Desde julho do ano passado, quando a China mudou a maneira como administra sua política cambial, o yuan se valorizou cerca de 2% em relação ao dólar. Países como Estados Unidos têm pressionado o governo da China a acelerar o ritmo da valorização da moeda, porque a política em vigor torna os produtos chineses mais competitivos no mercado internacional.

O secretário do Tesouro dos EUA, Henry Paulson, embarcou ontem para visita de dois dias a Pequim, em que procurará convencer as autoridades chinesas a acelerar o passo das reformas no país. Mas ele é o primeiro a reconhecer as dificuldades da sua missão. Numa entrevista em Cingapura horas antes de viajar, Paulson disse que ninguém deveria esperar resultados imediatos das suas conversas.

Num seminário organizado pelo Fundo e pelo Banco Mundial no sábado, Zhou disse que a intenção da China é "criar gradualmente as condições" para soltar as amarras existentes sobre a política cambial e os fluxos de capital. "A questão difícil é saber como podemos nos mover mais rapidamente", disse Zhou.

O governo chinês teme fuga de divisas se as restrições existentes hoje forem removidas de uma hora para outra e quer aprofundar as reformas em andamento no setor financeiro antes de mexer na política cambial. "É como o ovo e a galinha", afirmou Zhou. "Não podemos avançar na convertibilidade da conta de capital sem essas reformas."

A China foi o país que mais se beneficiou com a resolução do FMI que aumenta a influência de um grupo de nações em desenvolvimento em seu processo de decisão, aprovada na segunda-feira pela maioria dos integrantes da organização. Os chineses tinham 2,98% dos votos do Fundo e agora ficaram com 3,72%, a sexta maior cota da instituição.

Funcionários americanos alimentaram nas últimas semanas a expectativa de que isso ajudará a tornar o país mais sensível às pressões internacionais. Mas vários analistas consideram uma tolice acreditar que a China, um país que acumulou nos últimos anos mais de US$ 1 trilhão em reservas, vá mudar seu comportamento agora só porque ganhou 0,74% dos votos no FMI.

"Os americanos ficam falando, mas é perda de tempo", disse o economista Andy Xie, diretor do banco de investimentos Morgan Stanley em Hong Kong, durante seminário paralelo à reunião de Cingapura. "O gradualismo é o caminho menos arriscado para a China, e é ingênuo pensar que o país adotará o modelo econômico ocidental."

As autoridades chinesas também deixaram claro nos últimos dias que se opõem ao plano em discussão no FMI para reforçar os mecanismos de monitoramento sobre as políticas cambiais dos seus membros, uma área em que os EUA têm pressionado a direção do Fundo a atuar de forma muito mais agressiva.

A China também deu de ombros diante das pressões que recebeu em Cingapura por causa de seu avanço na África. Países pobres da região que tiveram recentemente suas dívidas com o FMI e o Banco Mundial perdoadas pelos países ricos tomaram bilhões de dólares emprestados da China. Os recursos têm financiado projetos de infra-estrutura e a aquisição de produtos de empresas chinesas.

Alegando que estão preocupados com a possibilidade de que esses países voltem a ficar muito endividados, os Estados Unidos e o Banco Mundial fizeram nos últimos dias vários alertas sobre os riscos do endividamento imprudente e excessivo. A China, que está de olho nos recursos naturais da África e tem feito bons negócios no continente, avisou que continuará financiando projetos na região.