Título: Na esteira do juro menor
Autor: Pavini, Angelo e Cotias, Adriana
Fonte: Valor Econômico, 20/09/2006, EU & Investimentos, p. D1

Os recentes números mais favoráveis de inflação e sinais de fraqueza da economia brasileira fizeram o mercado rever para baixo as projeções para os juros básicos, o que deve mexer com as estratégias dos investidores. A expectativa média do mercado, segundo pesquisa do Banco Central (BC), é de que a taxa Selic termine o ano em 13,75% e, em 2007, recue para 12,50%. Mas há analistas que já esperam uma queda maior, para menos de 13% já neste ano e até 11,5% no fim do ano que vem. A recomendação geral é a de que quem ainda não iniciou a diversificação e está basicamente em fundos DI comece logo.

A queda mais acelerada da Selic reduz a rentabilidade das aplicações de renda fixa atreladas ao juro diário das LFTs, como os fundos DI. Saem beneficiadas as aplicações prefixadas, que travam o juro mais alto de hoje por um, dois ou até três anos. Na visão dos analistas, os prefixados ainda não se ajustaram totalmente às novas projeções. Papéis indexados à inflação e que hoje pagam juros reais de quase 10% ao ano também são alternativas para quem quer prolongar o ganho com menor risco. E os fundos de renda fixa, que em geral possuem papéis prefixados e de inflação, tornam-se interessantes.

Para este ano, a dúvida com relação à inflação é se a Petrobras reajustará os preços da gasolina, afirma Ronaldo Patah, gestor de fundos de renda fixa da Unibanco Asset Management (UAM). O cenário externo relativamente tranqüilo, com a queda dos preços do petróleo e das commodities, e os sinais de crescimento da economia mundial apesar do desaquecimento nos Estados Unidos também favorecem a queda dos juros no Brasil. Patah trabalha com a Selic fechando o ano em 13,75% e, no ano que vem, recuando para 12,75%.

Nesse cenário, para um horizonte de 12 meses, Patah vê melhores oportunidades em fundos de renda fixa que aplicam em papéis prefixados ou corrigidos pela inflação do IPCA. "Os títulos do Tesouro corrigidos pelo IPCA, as NTN-Bs, estão pagando juros de 9,35% para os vencimentos em 2010", diz. Ele não recomenda papéis em IGP-M pela alta correlação com o dólar e, como a expectativa não é de grandes desvalorizações do real, o IPCA tem chances de maior ganho.

Patah lembra que o país já tem reservas para comprar toda a dívida externa e a dívida interna já não sofre o impacto da moeda americana, o que reduziria o efeito de uma crise internacional. "Já tivemos turbulências este ano e o efeito no dólar foi bem menor."

Mesmo no caso de uma crise interna, como um choque de preços agrícolas, por exemplo, o impacto seria limitado. "Se a inflação subir de 4% para 6% no ano que vem, o BC subiria os juros em até 4 pontos percentuais, muito longe das puxadas de 20% que ocorriam seis anos atrás", diz. E isso reduz a volatilidade dos mercados de juros e permite que se negocie taxas prefixadas até 2015. "O investidor médio tem de migrar para posições mais arrojadas para manter rentabilidade", diz. "Se continuar conservador, vai perder retorno."

Neste cenário, um investidor com horizonte de aplicação de 12 a 18 meses com perfil de risco moderado pode ter ganhos com prefixados, como as LTNs, e papéis indexados à inflação, como as NTN-Bs, diz Marcelo Assalin, da SulAmérica Investimentos. Num horizonte mais longo e de maior tolerância ao risco, ele vê espaço para aplicação de parte dos recursos em ações, especialmente as ligadas ao mercado interno, como comércio varejista, alimentos, material de construção (aço principalmente) e papel e celulose. "O ciclo de queda da Selic deve reativar a economia no fim do ano e melhorar os resultados dessas empresas."

O BC errou a mão na condução da política monetária e o processo de queda do juro básico terá de avançar pelo primeiro trimestre de 2007, segundo o diretor da Fundação Cesp, Jorge Simino. Para ele, tal percepção abre oportunidades em prefixados e papéis indexados à inflação. Tesourarias e fundos de investimento vêm recheando suas carteiras de prefixados, já antevendo um ciclo mais duradouro de corte para a Selic. E, apesar da inflação baixa, outra frente de ganhos atraentes, diz, são as NTN-B. "Todos os prazos têm implícito juros reais acima de 8%, o que representa taxas descoladas dos atuais fundamentos da economia."

Para o médio prazo, as NTN-B com vencimento em 2010, 2011 e até 2015 são oportunidades excelentes para se manter em carteira, avalia o diretor da Safra Asset Management, Carlos Alberto Torres de Melo. Mesmo que no curto prazo haja aplicações rendendo mais.

Este é o momento para o investidor diversificar suas aplicações, diz Regis Abreu, sócio da Mercatto Gestão de Recursos. Para ele, a Selic pode chegar aos 11,5% no fim do ano que vem, tornando o porto seguro da LFT um risco. "E juros de 10% ao ano além da inflação, como pagam as NTN-Bs, são boas oportunidades se comparadas aos 3% que paga o México ou os 2% do Chile", diz. Ele vê oportunidades também em ações, especialmente no setor de consumo, beneficiado pela queda dos juros e pelo aumento do número de consumidores. "Isso não significa que, no curto prazo, não haverá quedas nas ações, pois hoje o mercado brasileiro é dependente dos fluxos de investimentos estrangeiros", diz.

A queda dos juros também aumenta o impacto das taxas de administração dos bancos, especialmente nos fundos DI. Taxas acima de 3% ao ano tornam a aplicação praticamente igual à caderneta de poupança.