Título: Depoimento de Perillo deve levar CPI a recuar da quebra de seu sigilo
Autor: Junqueira , Caio
Fonte: Valor Econômico, 13/06/2012, Política, p. A6

O depoimento, ontem, do governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga as relações do empresário Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, com autoridades e empresas levou à ruína, ao menos por ora, os planos do PT de fragilizar politicamente o tucano.

Durante as mais de oito horas de depoimento, Perillo deu suas versões sobre assuntos complicados como a trama envolvendo a venda de sua casa em Goiânia, a participação de aliados de Cachoeira em seu governo e em sua campanha eleitoral. O governador levou uma claque para a comissão que o aplaudiu no começo e no final do depoimento aos gritos de "Brasil pra frente, Marconi presidente".

Chegou a apresentar um fato novo para as investigações, depreciativo a ele. Os cheques da transação envolvendo sua casa foram assinados por uma empresa, justamente uma das que foram irrigadas com recursos financeiros de uma empresa apontada pela Polícia Federal como fantasma e ligada à construtora Delta. Também confirmou a presença de pessoas em seu governo muito próximas a Cachoeira.

Mas nada disso foi suficiente para que o governador saísse do depoimento alvejado, conforme previam os petistas. Ao contrário, a avaliação comum ontem era de que quem perdera a batalha fora o PT. O que melhor comprovava esse cenário era a fala reinante entre os petistas, depois da sessão, de que o requerimento para quebrar os sigilos de Perillo não mais deveria ser votado na reunião administrativa de amanhã, contrariando a expectativa prévia no partido de que seria a fala de Perillo que fundamentaria a aprovação do requerimento.

"Sou contrário a qualquer forma de devassa na vida das pessoas", disse o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP). "Não vejo isso como uma prioridade agora. Não é a questão principal. O que deve ser feito agora é aprimorar as investigações a partir dos dados existentes", afirmou o vice-presidente da CPI, Paulo Teixeira (PT-SP).

A sessão favorável a Perillo começou com uma ajuda do PMDB, que deixou Perillo falar livremente durante o início da sessão. Foram cerca de 90 minutos, ante os usuais 20 minutos, de uma longa exposição sobre avanços sócio-econômicos de Goiás durante sua hegemonia política no Estado, que já dura 13 anos. Acusou ainda a perseguição política que disse sofrer por conta das acusações de sua relação com Cachoeira. Comparou-se a mártires políticos do imaginário nacional, como os ex-presidentes João Goulart e Juscelino Kubitschek. Falou sobre o que quis.

Agiu do mesmo modo ao responder às primeiras perguntas formuladas pelo relator Odair Cunha (PT-MG). Quando achava melhor não responder, dizia apenas que não conhecia determinada pessoa ou que algo tinha acontecido sem seu conhecimento. Por exemplo, sobre sua ex-chefe de gabinete, apontada pela Polícia Federal como ligada a Cachoeira - inclusive portadora de um telefone para com ele se comunicar -, disse: "Ela nunca me disse isso [sobre o telefone]. E ela não era a única chefe de gabinete. Quando ela saiu, me disse que poderia trazer constrangimento a mim por atos individuais dela."

Sobre as 237 citações a seu nome nos diálogos da organização criminosa captados pela polícia, defendeu-se: "Muitas das citações foram me xingando e as outras foram irresponsáveis." Em relação à ingerência de Cachoeira em seu governo, frisou: "Quero que memorizem: não há nenhum ato do governo em benefício do que suscitam. Falaram muito sobre seus planos, mas nada se concretizou."

À essa altura, os tucanos lotavam a sala da CPI. Quando isso não era possível, revezavam-se. Parlamentares do partido que dificilmente passam por ali compareceram, como o presidente do PSDB, deputado Sérgio Guerra (PE), e do DEM, Agripino Maia (RN), além do senador Aécio Neves. Muitos que nunca falaram tomaram o microfone para fazer uma avaliação positiva do desempenho do correligionário, caso dos senadores Mário Couto (PA) e João Campos (TO).

Até mesmo aliados do governo federal, como os deputados Sílvio Costa (PTB-PE) e Luiz Pitiman (PMDB-DF) elogiaram a postura de Perillo.

Era meio da tarde e nenhum petista, além do relator, havia ainda tomado a palavra. Foi quando o relator, percebendo o clima desfavorável ao PT, retomou a palavra para algumas perguntas adicionais. Uma delas, se o governador se disporia a abrir seus sigilos para a CPI. Houve protestos.

"O senhor disfarça um requerimento em forma de pergunta", disse o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP). Cunha rebateu: "O governador é sim investigado." A reação foi grande, uma vez que Perillo falava à CPI na condição de testemunha, não de investigado. A informação foi prontamente corrigida pelo presidente da comissão, senador Vital do Rego Filho (PMDB-PB).

Cunha, então, elencou razões que justificariam a quebra do sigilo do governador. "Ele diz que veio aqui, que não se lembra de nada, que foi traído. Vocês estão antecipando uma conclusão que eu não concordo", declarou.

Na sequência, orientado pelo seu advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, Perillo rejeitou abrir seu sigilo. "Pedi para vir na condição de testemunha. Não vejo motivos suficientes, justificativas plausíveis, fundamentação para que haja quebra de sigilo. De qualquer maneira, essa decisão não me cabe. Cabe a essa comissão e ao STJ. E a consciência de vocês." Ele também disse esperar que a "manifestação incisiva" do relator contra ele "não seja a antecipação daquilo que deseja manter no relatório" final da CPI.

Depois disso, alguns petistas resolveram contra-atacar, mas já era tarde. Insatisfeitos, colocaram a culpa em um suposto acordo entre PMDB e PSDB, com participação até mesmo de aliados de seus históricos aliados, PSB e PCdoB. Hoje será a vez do governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz (PT), depor. PT e PSDB negam que tenham feito acordo de não agressão em relação aos dois governadores.