Título: Empresas aceleram internacionalização
Autor: Lamucci, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 21/09/2006, Brasil, p. A4

As empresas brasileiras aumentaram fortemente a presença no exterior neste ano. De janeiro a julho, o saldo líquido de investimentos brasileiros diretos fora do país totalizou US$ 5,158 bilhões, 105% a mais que os US$ 2,516 bilhões registrados em todo o ano passado. Ao mesmo tempo, os investimentos estrangeiros produtivos no Brasil mostraram uma tendência de queda nos primeiros sete meses do ano, somando US$ 8,973 bilhões, 15% a menos do que o observado de janeiro a julho de 2005.

Para os analistas, a crescente internacionalização das companhias brasileiras se deve em boa parte ao acesso ao crédito externo a um custo mais baixo e a prazos mais longos obtido por algumas companhias. Com isso, elas conseguiram conquistar mercados em outros países em setores nos quais se mostram competitivos.

Empresas como a Companhia Vale do Rio Doce e a Gerdau conseguem empréstimos no mercado internacional a juros muito baixos, aumentando seu poder de fogo para atuar no exterior, como diz o professor Fernando Ribeiro, da Universidade Mackenzie e da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). "Algumas empresas têm hoje um acesso muito maior ao mercado de capitais, contando com financiamento internacional muito mais facilitado", confirma André Castello Branco, sócio da KPMG Corporate Finance. Ele cita o caso da Vale do Rio Doce, que tem ampla oferta de crédito para sua proposta de compra da canadense Inco, por US$ 17,7 bilhões.

Segundo números da KPMG, no primeiro semestre deste ano houve 18 operações em que empresas brasileiras compraram companhias no exterior. "Em todo o ano passado, ocorreram 24 transações", afirma ele, o que confirma o movimento de internacionalização.

Segundo analistas, neste ano não houve nenhuma megaoperação como a troca de ações entre a Ambev e a belga Interbrew, ocorrida em 2004, de US$ 5 bilhões. Ocorreram até o momento algumas operações de menor porte, como a compra da americana Sheffield Steel e da peruana Siderperu pela Gerdau e a associação entre a Marcopolo e a indiana Tata Motors. O total de US$ 5,158 bilhões de investimentos brasileiros diretos no exterior também inclui a transações fechadas em anos anteriores e que tiveram desembolso de recursos neste ano, como nota Castello Branco.

A tendência de internacionalização das companhias é bem vista por analistas como Ribeiro, por mostrar uma diversificação de mercados e a competitividade das empresas do país. O economista Sérgio Vale, da MB Associados, também considera o processo positivo, mas avalia que ele está ocorrendo em parte "pelos motivos errados". Com câmbio valorizado, juros altos e expectativa de crescimento medíocre por aqui, há companhias que passaram a apostar a investir no exterior para compensar esses problemas domésticos e tentar obter maior rentabilidade em outros mercados. Ele cita a Marcopolo como um exemplo de empresa cuja internacionalização se deve em parte ao impacto negativo do dólar barato sobre suas operações no Brasil. Em alguns casos, diz Vale, o investimento poderia ser feito por aqui mesmo. Ele prevê que o total investido por empresas brasileiras no exterior deve chegar a US$ 7 bilhões neste ano.

O volume de investimentos estrangeiros diretos no Brasil, por sua vez, parece acomodar-se na casa de US$ 15 bilhões por ano, bem distante dos US$ 32,779 bilhões registrados no ano 2000, número inflado em parte por receitas obtidas com privatizações. Não é um número que possa ser considerado ruim, na visão de Ribeiro, mas está muito longe do obtido por um país como a China, que recebeu, apenas nos sete primeiros meses do ano, US$ 32,7 bilhões de investimentos produtivos. Ribeiro diz que o tamanho da economia brasileira, com sua matriz produtiva complexa e diversificada, deve fazer com que o Brasil continue a receber algo como US$ 15 bilhões por ano. Segundo ele, nos últimos dez anos, o fluxo de investimentos diretos para o país só foi menor que o destinado para a China. "Não é um resultado ruim." Castello Branco, diz que o Brasil mantém-se atraente para companhias estrangeiras, por ter um mercado grande e uma política econômica estável, o que dá maior previsibilidade para os investimentos.

Vale tem uma visão mais cética. Ele acredita que os estrangeiros devem investir US$ 14 bilhões neste ano, número que pode cair nos próximos anos. Uma economia que cresce pouco e tem um câmbio que não estimula as exportações é pouco atraente para o investimento produtivo, diz ele. Vale lembra que a indústria automobilística, por exemplo, reduziu suas apostas por aqui. De janeiro a julho, os investimentos estrangeiros em participação no capital no setor totalizaram US$ 232 milhões, bem abaixo dos US$ 609 milhões do mesmo período de 2005.