Título: EUA começam a privatizar malha rodoviária do país
Autor: Mandl, Carolina
Fonte: Valor Econômico, 21/09/2006, Empresas, p. B3

Os Estados Unidos começam a colocar suas estradas à venda. Com isso, abrem-se para as empresas de concessões rodoviárias as portas do país com a maior rede de rodovias do mundo.

Existem cerca de 320 mil quilômetros de vias que poderão ser concedidas à iniciativa privada. Atualmente, 8 mil quilômetros são pedagiados, sendo que apenas 110 quilômetros estão nas mãos de empresas particulares. O restante é explorado por companhias públicas.

Pode parecer estranho, mas a solução de delegar os investimentos em estradas a investidores privados chega aos Estados Unidos - maior ícone do capitalismo - com décadas de atraso em relação à Europa, onde o processo se iniciou em meados dos anos 60. No Brasil, a concessão rodoviária começou no fim dos anos 90.

A explicação para a demora é simples: até hoje, o governo americano vinha sendo capaz de construir as estradas. Mas a realidade mudou. "Não conseguimos mais dar conta dos investimentos, por isso estamos incentivando os parceiros privados. O trânsito atingiu níveis de epidemia", afirmou ontem Maria Cino, secretária federal dos transportes, durante o 74th International Bridge, Tunnel and Turnpike Association (IBTTA), encontro da entidade que reúne empresas do setor de concessão.

Segundo dados do Departamento de Transportes dos Estados Unidos, desde a década de 60 a frota americana de carros cresceu 300%, enquanto a estrutura viária aumentou 12%.

Além de estar sem fundos para construir novas vias, os Estados viram no processo de privatização das estradas uma fórmula para encher seus cofres.

Pela Chicago Skyway, uma ponte de pouco mais de 12 quilômetros, a cidade de Chicago recebeu US$ 1,8 bilhão no ano passado ao concedê-la por 99 anos a um consórcio formado entre a australiana Macquaire e a espanhola Cintra.

O assunto, entretanto, vem levantando polêmicas no país. "A privatização das rodovias não é totalmente aceita aqui. Muitas pessoas acreditam que as estradas são públicas e que, portanto, empresas privadas não podem ter lucro com elas", disse Patrick Jones, diretor-executivo do IBTTA. Além de ter de pagar pedágios onde antes o uso era livre, as pessoas verão o preço das tarifas subir com a privatização.

O processo vem atraindo as maiores empresas de concessão rodoviária do mundo, como Cintra, Abertis, CCR/Brisa e Autostrade. Em sua maioria européias, essas companhias querem se posicionar para ganhar uma fatia desse novo e atraente mercado que se abre.

"Temos uma vantagem competitiva. Enquanto os americanos estão aprendendo como explorar as estradas, nós já sabemos fazer isso", explicou Jordi Graells, diretor da área internacional da Abertis, empresa de concessões espanhola.

A brasileira Companhia de Concessões Rodoviárias (CCR), por exemplo, decidiu unir sua experiência em privatização de rodovias com o histórico da Brisa de construir e explorar novas estradas. Elas criaram um consórcio para atuar nos Estados Unidos.

Receosas em relação ao novo negócio, as companhias americanas têm preferido firmar parcerias com as concessionárias estrangeiras. Em geral, são construtoras que entram com uma pequena participação no negócio. Mas bancos, fundos de investimento e de pensão também estão se organizando.

Alguns investidores estrangeiros, entretanto, ainda querem ver solucionados alguns pontos do processo regulatório. Um deles é o prazo dos contratos de concessão. Em busca de uma receita mais elevada, alguns Estados americanos têm concedido suas rodovias por períodos superiores a 40 anos, prazo praticado na Europa.

O problema é que quanto mais tempo há pela frente, mais difícil fica de se prever como estará o negócio. "Existe a expectativa de que as pessoas comecem a trabalhar mais de suas casas e isso deve diminuir o trânsito sensivelmente. Como é possível quantificar isso hoje?", disse Edward J. Regan, vice-presidente da consultoria Wilbur Smith.

A repórter viajou a convite da Companhia de Concessões Rodoviárias (CCR)