Título: Mais caro que o Primeiro Mundo
Autor: Hessel, Rosana
Fonte: Correio Braziliense, 16/10/2010, Economia, p. 16

O forte crescimento econômico, o peso dos impostos e o fortalecimento do real tornam o valor dos produtos e dos serviços no Brasil muito salgado. Custo assusta estrangeiros

O Brasil está cada vez mais caro. Em grande medida, isso é resultado do forte crescimento da economia, da alta carga tributária e também da força do real frente ao dólar. O custo de vida é maior do que o de muitas economias desenvolvidas. O brasileiro paga mais do que o europeu, o chinês ou o norte-americano para comer um simples sanduíche. O preço de um carro importado chega a ser o dobro do cobrado no país de origem. Uma Range Rover Sport, por exemplo, custa US$ 60,5 mil (R$ 100,5 mil) nos Estados Unidos. Aqui, o modelo não sai por menos de R$ 279 mil (US$ 167,9 mil).

¿Mesmo com o dólar favorável, o carro importado fica mais caro aqui devido aos impostos. Mas as vendas saltaram 145% no terceiro trimestre¿, conta Flávio de Oliveira, gerente de marketing da Caltabiano, revenda de marcas de luxo. Ele destaca o acesso mais fácil ao financiamento, até com o parcelamento pelo cartão de crédito, como uma das alavancas das vendas. Modelos nacionais, sem itens opcionais de série exigidos lá fora, nem sequer teriam mercado no exterior. ¿O brasileiro paga caro por carros nacionais populares, que têm uma mecânica muito inferior.¿

Para se divertir ou viajar, o brasileiro paga muito mais que os estrangeiros. A entrada no show do ex-Beatle Paul McCartney custa mais aqui do que nos EUA ou na vizinha Argentina. O mesmo ocorre com o ingresso para um concerto de música clássica em São Paulo, se comparado ao do Carnegie Hall, em Nova York. Já uma diária em um hotel cinco estrelas no Brasil é bem mais salgada do que em Londres, dona de um dos custos de vida mais altos do planeta. Quem quiser passar o Reveillón no Hotel Sofitel de Copacabana, no Rio de Janeiro, vai pagar de R$ 1,3 mil a R$ 2 mil pelo caviar e o champanhe francês.

Assimetria O aumento da renda do brasileiro elevou o número de passageiros de avião num ritmo quase 50% acima da oferta de assentos. A demanda aquecida lota os aviões a ponto de não haver mais baixa temporada no país, época em que as passagens ficavam mais baratas. Dependendo do destino, viajar para fora do país é mais barato. ¿Existe uma assimetria dos preços das passagens com relação ao câmbio. Quando ele desvaloriza, há pressões de custos, reclamações de toda parte e, por fim, aumento dos preços. Quando ele cai, a tarifa não baixa¿, critica o analista de aviação Alessandro Oliveira.

¿O Brasil está caro e a tendência é ficar cada vez mais, se as medidas necessárias não forem adotadas, como a redução da taxa de juros e dos gastos do governo. Se isso não for feito, a bomba vai estourar no colo do próximo presidente e todos nós vamos pagar a conta¿, alerta o economista e professor da Faculdade Ibmec-DF José Ricardo da Costa e Silva.

As amigas Cíntia dos Santos Souza, 24 anos, e Cíntia Alves, 23, têm consciência de que pagam mais pelo Big Mac do que o cobrado em outros países, mas não abrem mão do sanduíche. Elas atribuem o preço à carga tributária. ¿Os aparelhos eletrônicos e os combustíveis também são muito caros. Os salários não acompanham essa elevação¿, diz Cíntia Souza.

Outro exemplo de discrepância de preços é o iPhone 4, smartphone recém-lançado no mercado doméstico. Ele custa mais de cinco vezes o valor cobrado nas lojas da Apple nos Estados Unidos. O casal de namorados Gustavo Cibim, 38 anos, e Fabíola Alves Gomes, 31, também acredita que os impostos são responsáveis por encarecer o preço final dos produtos. Cada um recebeu um aparelho da operadora de telefonia, mas Cibim admite: ¿Se não tivesse ganho, não teria comprado¿.

Os estrangeiros que moram no Brasil também se assustam. ¿É impressionante como tudo é mais caro aqui, desde a alimentação até o creme de barbear¿, reclama o economista alemão Ferdinand Rogoschewski, da Vector Investments, no país há cinco anos. ¿O pior de tudo é a carga tributária. Aqui, os impostos são maiores que na Suíça e quase iguais aos da Alemanha. Mas lá não se paga escola, as cidades são limpas e a polícia funciona.¿