Título: 'Aqui é desconforto 365 dias por ano
Autor: Schüffner , Cláudia
Fonte: Valor Econômico, 26/06/2012, Empresas, p. B7

Aqui é desconforto 365 dias por ano, 24 horas por dia." Essas foram as últimas palavras da presidente da Petrobras, Maria das Graças Foster, no encerramento da apresentação do novo plano de negócios da companhia a acionistas e analistas, no Rio.

O aviso da executiva foi dado após uma questão da plateia sobre o nível de conforto da empresa com a nova curva de produção projetada para os próximos anos, que é bem mais conservadora que a anterior. "Aqui ninguém trabalha com conforto de absolutamente nada. Conforto é uma palavra proibida", disse.

Essas afirmações deram mais uma amostra do novo estilo de gestão que Graça, como é conhecida, está implantando na estatal.

Logo no início de sua fala no evento, em vez de se concentrar nos aspectos positivos, a executiva foi direto ao ponto e tratou dos temas mais sensíveis na administração da companhia: as metas de produção não cumpridas, o atraso na execução de projetos de investimento, a exigência de conteúdo nacional e a política de preços.

Graça reconheceu alguns problemas, negou outros e deixou bem claro as mudanças que pretende implantar, chegando a dizer que a empresa não pode "contar com milagres" ao elaborar seus planos de longo prazo, numa crítica ao modelo antigo.

Quando passou a palavra a um dos diretores que faria a apresentação seguinte, Graça fez um alerta ao executivo. "Apresente para nós, dentro do prazo que você tem, que você sabe qual é."

Esse novo estilo de gestão tem impacto direto no dia a dia da companhia, que realmente não está num momento confortável, com seu valor de mercado tendo caído ontem para apenas 70% do patrimônio líquido, menor nível histórico, de acordo com dados da Economatica.

Entre um grupo de funcionários da Petrobras ouvidos pelo Valor, a avaliação é de que a nova presidente está fazendo uma minirrevolução na empresa.

Além de ter reformulado quase que totalmente a diretoria, Graça trocou 23 gerentes-executivos (cargo mais alto na hierarquia da Petrobras antes do de diretor) e criou quatro novas gerências exclusivas para acompanhar a construção e entrega de sondas de perfuração e plataformas de produção.

Até agora, as novidades foram bem vindas. E são vários os elogios à coragem da presidente da República, Dilma Rousseff, por dar seu aval para as mudanças que Graça está introduzindo.

"É o resgate da meritocracia na Petrobras. As pessoas que estão sendo promovidas são técnicos que conhecem a empresa e são respeitadas na companhia. As mudanças que estão acontecendo são radicais. No passado recente a influência política na Petrobras desceu a níveis de gerências menores, quando antes de 2002 ficavam restritas à diretoria. Agora o grupo anterior está sendo colocado fora de cenário", avalia um executivo da estatal com mais de 20 anos na companhia.

As reuniões da diretoria-executiva, que sempre aconteceram na quinta-feira, agora têm uma prévia na segunda. Reuniões nos fins de semana não são incomuns. "Agora entrou uma locomotiva na frente da composição", resume um executivo da companhia, impressionado com a gestão de Graça Foster até agora.

"Ela é dedicada. Quer saber tudo, projeto por projeto, e conhecer os desvios. Tem gente mais estressada, mas eu acho bom", diz outro funcionário da estatal.

Na apresentação feita ontem à tarde em São Paulo, Graça enfatizou que sua diretoria é formada por técnicos de carreira, que estão há décadas na estatal, e que apresentaram os melhores números possíveis ao mercado.

A impressão de alguns funcionários antigos da empresa não ligados a correntes políticas é que as mudanças nos cargos de gerentes estão apenas começando. E que vem mais por aí. "Os novos gerentes executivos terão que consertar os níveis mais baixos em uma linha mais ligada à meritocracia", diz.