Título: Os extorsivos juros dos cartões de crédito
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Fonte: Correio Braziliense, 16/10/2010, Opinião, p. 26

Malgrado a legislação vigente não limite a cobrança de juros nos contratos de crédito bancários e com financeiras, encargos excessivos escapam ao princípio da razoabilidade. A imposição de obrigações extorsivas resulta no enriquecimento sem causa do operador do sistema. Não pode se sustentar ante os tribunais, quando o prejudicado busca defender-se da exorbitância. Mas são poucos os que têm condições de recorrer à Justiça. Não quebram, portanto, a obsessão por lucros abissais dos agentes em ação no mercado.

Empresas de cartões de crédito ocupam o topo no ranking da exploração desenfreada. A ganância para multiplicar resultados financeiros é tão grande que vai além das expectativas do mais ambicioso agiota. A conduta condenável a todos os títulos se tornou mais explícita depois que a Associação Brasileira das Empresas de Cartões e Serviços (Abecs) assumiu o compromisso de aumentar a transparência e a competição do setor. A tomada de posição veio como reação às censuras generalizadas contra os juros descomunais incidentes, sobretudo, no crédito rotativo.

Diante do alarmante ataque à economia popular, a indignação das vítimas ainda é bastante tímida. Segundo pesquisa mensal da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), a taxa de juros acumulada de 12 meses bate em 237,51%. Não fica aí o abuso. Há bancos e operadoras que cobram 300% ao ano. O cálculo geral da inadimplência das várias categorias contratantes de crédito é hoje de 1,6%. Mas poderia ser bem menor se, para semelhante variação, não houvesse a contribuição (7,2%) dos que não conseguem liquidar as dívidas contraídas mediante uso do dinheiro de plástico.

O problema é mais grave quando se sabe que os juros médios pagos pelos consumidores caíram 0,15% em setembro. Mas apenas duas linhas não acompanharam a queda: o crédito direto ao consumidor (CDC) dos bancos e o financiamento rotativo dos cartões. Houve iniciativa ao contrário. A taxa sobre a rotação de 10,66% ao mês, em janeiro, subiu para 10,69%, no mês seguinte. Não se contabilizam aí as despesas pela utilização dos serviços e multas contratuais.

É evidente que à grande parte do contingente social falece educação para usar de modo cauteloso serviços do gênero. Os agentes do mercado têm ciência dos clientes vulneráveis. Mas os cálculos empresariais mostram que, mesmo diante de riscos inevitáveis de inadimplência, o negócio permanece vantajoso. A voracidade rentista, portanto, não pode ser contida por ajustamento ditado pelas forças de mercado. A questão envolve direitos de milhões de brasileiros. Há plano estruturado para que o governo ¿ atual ou o que for eleito em 31 de outubro ¿ coloque-o de imediato em ação.