Título: País eleva vendas para vizinhos que estão fora do Mercosul
Autor: Pedroso , Rodrigo
Fonte: Valor Econômico, 25/06/2012, Brasil, p. A3

A queda das exportações à Argentina, em função das medidas protecionistas adotadas pelo governo de Cristina Kirchner, fez com que o Mercosul diminuísse as compras de produtos brasileiros entre janeiro e maio. Por outro lado, o Brasil aumentou as vendas a parceiros não tão tradicionais, como Colômbia e Venezuela, fazendo com que os países fora do bloco ganhassem importância na pauta de exportações brasileiras para a América do Sul.

De janeiro a maio, as exportações para Argentina, Paraguai e Uruguai encolheram 10,3% em relação ao mesmo período do ano passado, segundo estatísticas do Ministério do Desenvolvimento (Mdic). Dos US$ 9,4 bilhões gerados com as vendas ao bloco, US$ 7,5 bilhões vieram da Argentina, maior parceiro sul-americana - a Venezuela aparece em segundo lugar, com US$ 1,9 bilhão.

Nos cinco primeiros meses de 2011, os argentinos compraram US$ 8,4 bilhões do Brasil. Essa queda em relação ao ano anterior praticamente corresponde à perda de US$ 1 bilhão nas vendas para todo o bloco, porque o Paraguai manteve US$ 1 bilhão em compras, e o Uruguai recuou de US$ 932 milhões para US$ 838 milhões.

O restante do continente apresentou tendência inversa, com as exportações crescendo 9% e alcançando um total de US$ 6,9 bilhões. A diferença pode ser explicada como uma forma de os exportadores buscarem mercados alternativos, na visão de José Augusto de Castro, vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).

"As empresas estão procurando novos compradores, pois todos os cenários são péssimos, já que a economia argentina está em desaceleração e não há perspectivas de incremento nas trocas com Paraguai e Uruguai", explica Castro. "Sabendo disso, elas não vão esperar piorar o comércio para se mexer, sendo que há espaço em outros mercados, que também são próximos e contam com relativa facilidade de acesso."

O principal salto neste início de ano foi dado pelos venezuelanos, que compraram US$ 557 milhões a mais, impulsionados pela maior demanda por carne e máquinas e aparelhos mecânicos brasileiros. Os colombianos, por sua vez, importaram US$ 1,1 bilhão, soma 11,5% maior em relação a 2011. As importações brasileiras de toda a América do Sul mantiveram-se estáveis ao redor de US$ 12 bilhões.

Para Fabio Silveira, sócio-diretor da RC Consultores, o desaquecimento das economias mais desenvolvidas impede um crescimento mais expressivo do comércio entre o Brasil e seus vizinhos. Segundo ele, o continente depende da flutuação do preço das commodities e da demanda de outros parceiros para gerar receitas, que por sua vez possibilitam mais importação.

"Há uma evolução positiva nos mercados fora do Mercosul, mas em valores não é muito significativa. O resultado de agora acontece mais pelo enfraquecimento do mercado doméstico argentino, que está gerando esse protecionismo. A adoção de barreiras faz parte da cultura deles. Sempre quando o cenário muda, eles dificultam", diz Silveira.

O momento econômico da América do Sul favorece as vendas brasileiras. "O continente está com média de crescimento maior do que outras regiões. Por ser um polo, o Brasil se beneficia desse aumento de demanda. A única exceção é a Argentina", afirma Rafael Bistafa, economista da Rosenberg & Associados.

A projeção de elevação do Produto Interno Bruto (PIB) da Colômbia e da Venezuela para este ano é maior que o da Argentina. Dados da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) apontam crescimento de 4,5% para os colombianos e 5% para os venezuelanos, enquanto os argentinos estão com estimativa de 3,5%.

A maior demanda desses países é movida principalmente por dois setores, na visão de Sandra Manuelito, economista da divisão de desenvolvimento econômico da Cepal: petróleo e construção civil. "Além de ser ano eleitoral na Venezuela, a commodity ainda está sendo vendida a um patamar alto. A Colômbia está exportando volume maior do produto e tem expansão puxada pela habitação", diz a economista.

O ritmo mais intenso aumenta a capacidade de consumo desses mercados internos. "Há um redirecionamento também por causa do cenário externo. Mas ainda enfrentamos sérios problemas de infraestrutura e integração física. Isso tira competitividade dos produtos em relação aos asiáticos, o que dificulta uma expansão maior ou mais sustentada", afirma Sandra.

O primeiro trimestre do ano mostrou a diferença na estimativa da Cepal. Na comparação com o mesmo período de 2011, o PIB venezuelano cresceu 5,6%, enquanto o argentino teve expansão de 4,8%. A Colômbia ainda não divulgou os dados dos primeiros meses de 2012.

O "fator Argentina", como define Castro, deve fazer com que, para o resto do ano, a tendência seja de encolhimento do Mercosul e aumento ou estabilização do patamar de crescimento dos outros países. Desde 1º de fevereiro, encabeçada pelo secretário de Comércio Interior, Guilhermo Moreno, A Argentina reforçou políticas de controle às importações. A equipe econômica de Cristina Kirchner deseja manter o superávit de cerca US$ 10 bilhões alcançado na balança comercial do ano passado. Não fosse o Brasil, o resultado poderia ser melhor. Em 2011, a relação foi superavitária para os brasileiros em US$ 5,8 bilhões.

Aproveitando o alto preço da soja no mercado internacional, os argentinos venderam boa parte da safra nos primeiros meses de 2012, segundo Castro. De agora em diante, as exportações argentinas devem ter desempenho pior, afetando o nível de importação. "De janeiro a maio, as vendas brasileiras para eles caíram 11%. Como eles estão fazendo o possível para zerar o déficit com o Brasil, a queda deve se acentuar e fechar o ano em torno de 20%."