Título: Serra propõe agência para facilitar acesso a financiamentos
Autor: Felício, César e Agostine, Cristiane
Fonte: Valor Econômico, 22/09/2006, Política, p. A6

O primeiro ano de governo de José Serra (PSDB) no Estado de São Paulo, caso seja eleito, servirá de cartão de visita para seu credenciamento à disputa pela Presidência em 2010 e consolidará o partido no Estado, em seu quarto mandato seguido. Na hipótese de vitória do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na eleição presidencial, o tucano deverá se comportar como um adversário duro de um governo federal petista, para manter unida uma oposição que sairia de sua segunda derrota presidencial seguida.

O embate se dará na discussão econômica e na discussão política. Na definição de um aliado, Serra trabalhará com "um olho na microeconomia e outro na macro", referindo-se às variáveis que afetam o governo estadual e em relação às quais o governador não tem controle, como câmbio e juros.

O programa de governo de José Serra, que será lançado na terça-feira, faz uma menção inicial ao governador Franco Montoro (1983-1987) de quem foi secretário de Planejamento e que foi marcado por uma tentativa de racionalizar a máquina pública. Mas Serra não pretende ser um gerente de crises, e sim ser lembrado por obras de vulto, dentro do molde das parcerias público-privadas (PPPs). "Serra será o governador do empreendedorismo", disse o coordenador do programa de governo, Hubert Alqueres, presidente da Imprensa Oficial do Estado. "Ele não é o homem dos gerúndios. Não tem frases como 'estou fazendo', 'estou trabalhando', vai querer mostrar resultados", aposta o economista Roberto Macedo, integrante da coordenação da campanha e redator do programa.

Tendo em vista a maior crise administrativa do Estado no momento, as primeiras ações do tucano serão aumentar os investimentos e reestruturar a pasta de Segurança, para a estancar a série de ataques do crime organizado no Estado. O tucano acena em seu programa de governo com a prioridade à inteligência policial e à construção de mais penitenciárias de segurança máxima. Serra já descartou as sugestões que recebeu para fundir as pastas de Administração Penitenciária e Segurança.

A situação financeira do Estado é melhor do que a herdada pelo governador Mário Covas (1995-2001) doze anos atrás, mas está longe de ser "confortável". A relação dívida / receita líquida do Estado permanece alta, apesar do ajuste financeiro feito nas três gestões. "Quem está em situação de conforto fiscal é o Lula", afirmou Macedo. O economista procura dar uma contextualização nacional ao problema. "Vejo uma crise crônica, endêmica, que permeia toda a questão fiscal do Brasil", disse.

O programa tucano não pretende reforçar o aparelho do Estado. Em seu principal projeto para o crescimento, Serra planeja criar uma agência de fomento para intermediar financiamentos com o BNDES, contatos com organizações multilaterais, dar prestação de garantias e administrar fundo de desenvolvimento. Mas com equipe mínima. O modelo é o antigo Banco de Desenvolvimento de São Paulo (Badesp), desaparecido nos anos 80. "Vai ser um tipo de 'Poupatempo' para os empresários que querem investir. Em vez de eles ficarem procurando as melhores taxas, irão direto lá. Será um balcão único para atender os empresários", disse Macedo.

Em quase 62 páginas de propostas o documento tucano evita quantificar e traçar metas para o governo. Uma das poucas exceções aparece na Educação, tema que abre o caderno, e que traz como promessa a duplicação das faculdades de tecnologia (Fatecs), criar novas escolas técnicas e reforçar o ensino fundamental, com duas professoras na primeira e na quarta séries, gerando uma demanda de 7, 8 mil novos professores. A intenção é baratear a contratação, admitindo estagiários, ao invés de promover concurso.

Na Saúde, Serra vai investir na área básica, criando postos de atendimentos médico-ambulatorial (AMAs). Novamente demonstra a preocupação em manter sob controle a máquina estatal: o modelo a ser adotado será o das Organizações Sociais, e em parcerias com municípios.

Na área do Trabalho, o candidato adotou uma proposta polêmica, a de estabelecer pisos salariais para a iniciativa privada. "Essa experiência já existe no Rio Grande do Sul, no Paraná e no Rio de Janeiro. Não se pode colocar um piso único e teremos muito cuidado para não aumentar a informalidade. A remuneração será convertida por horas, para não afetar os trabalhadores domésticos, por exemplo", relatou Macedo.

Questões em debate dentro do partido devem ficar de fora do programa. É o caso, por exemplo, da possível privatização do banco Nossa Caixa. O tema divide o PSDB e o candidato não se posicionou sobre ele. Serra pretende retomar as concessões no setor rodoviário, repassando para a inciativa privada rodovias sobre administração do Dersa. Ainda planeja terceirizar a gestão dos parques florestais estaduais passíveis de exploração turística. A companhia de energia elétrica Cesp em um primeiro momento, não deverá ser vendida. A preocupação inicial será consolidar o saneamento da empresa.

A composição da equipe de Serra é mantida como um segredo a sete chaves, mas as especulações são abundantes. O ex-presidente do BNDES e ex-secretário estadual do Planejamento Andrea Calabi é cotado para a relação com o setor produtivo e estruturação de investimentos. O secretário municipal de Finanças, Mauro Ricardo Machado Costa, que trabalhou com Serra nos ministérios do Planejamento e Saúde, está analisando os números do Estado e é cogitado para a pasta da Fazenda. A operação política deve ser compartilhada pelo candidato a vice-governador, Alberto Goldman e pelo secretário municipal de Governo, Aloysio Nunes Ferreira Filho, ex-ministro da Justiça. Aloysio deverá influir também nas áreas de Justiça, Administração Penitenciária e Segurança Pública.

A economista Dilma Pena, ligada ao ex-ministro do Planejamento Martus Tavares, é mencionada como um possível nome para a área de Energia. O atual secretário da Saúde, Luiz Barradas, dos poucos que tem chance de ficar no cargo. O coordenador geral de campanha, José Henrique Lobo, pode ir para a pasta da Cultura, se o cargo for retirado da cota política. Hoje, é ocupado pelo PPS.