Título: Argentina quer linha dura contra Assunção
Autor: Leo , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 25/06/2012, Internacional, p. A13

Deverá partir da Argentina as propostas mais duras contra o Paraguai na cúpula do Mercosul, que começa em Mendoza, nesta quinta-feira. No encontro, do qual o Paraguai teve a participação suspensa ontem, a Argentina deverá transferir a presidência pro-tempore do bloco para outro país. Pela regra do Mercosul, que determina um rodízio da presidência a cada seis meses, seria a vez do Paraguai. O país seguinte é o Brasil.

Enquanto Brasil, Uruguai e países extra-bloco, como a Colômbia, retiraram seus embaixadores para consulta, a Argentina decidiu na sexta-feira remover seu representante em Assunção "até que se restabeleça a ordem democrática no país", segundo o comunicado da chancelaria. A mesma decisão tomou o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, que também anunciou ontem a interrupção das exportações de petróleo ao Paraguai, em repúdio ao "golpe de Estado".

O tom duro da Argentina sobressaiu em uma entrevista publicada ontem pelo jornal oficialista "Página 12" com o chanceler argentino, Hector Timerman.

Ele relatou ter feito ameaças ao novo presidente paraguaio, Federico Franco, horas antes da destituição do então presidente Fernando Lugo, na sexta-feira, quando os chanceleres dos países da Unasul estavam em Assunção para tentar impedir a votação do impeachment.

Segundo Timerman, ele e o chanceler brasileiro, Antonio Patriota, se reuniram com Franco quinze minutos antes do início da sessão do Senado paraguaio. "Vou lhe dizer a verdade sobre o que vai acontecer. O Paraguai sofrerá e ficará isolado. Você irá governar em difíceis condições", teria dito Timerman, segundo relatou na entrevista. Patriota, segundo Timerman, sugeriu uma última mediação para que Lugo fizesse um apelo contra a violência, o que seria um primeiro passo para uma licença presidencial por seis meses.

A Argentina é a maior defensora dentro do bloco do ingresso da Venezuela como membro pleno do Mercosul, mesmo sem a concordância formal do legislativo paraguaio, único país que não fez a ratificação. Em 21 de dezembro do ano passado, na cúpula organizada pelo Uruguai, o presidente anfitrião, José Mujica, apresentou uma proposta diretamente inspirada pela administração de Cristina Kirchner, que assumiu a presidência do bloco: a de se criar uma comissão intergovernamental específica para chancelar a entrada venezuelana no grupo, passando por cima das sanções congressuais.

A proposta foi esvaziada pela resistência do próprio Lugo, que temia confrontar diretamente a oposição em seu país. Com a ausência paraguaia nas reuniões de cúpula, a tese poderia ser relançada, hipótese minimizada pelo governo argentino. "A Argentina, o Brasil e o Uruguai estão interessados no ingresso da Venezuela, como se sabe, mas não creio que uma situação leve à outra", disse Timerman na entrevista.

A Argentina divide a usina hidrelétrica de Yaciretá com o Paraguai e sua dependência energética em relação ao país vizinho é proporcionalmente maior que a existente em relação ao Brasil. A usina de Itaipu fornece 7% da energia brasileira, enquanto Yaciretá responde por 12% da eletricidade argentina. Ao contrário do que fez o Brasil, que fechou um acordo para reajustar a energia comprada ao Paraguai, a Argentina ainda exige uma compensação financeira pela construção da usina. Há apenas três meses, o Paraguai se comprometeu a pagar US$ 15 bilhões.