Título: "Pior que jornalista, só os políticos"
Autor: Santos, Chico
Fonte: Valor Econômico, 25/09/2006, Especial, p. A14

-"Você está me seguindo?"

- "Claro, senadora, eu não disse para a senhora que estava fazendo uma reportagem a sobre sua campanha?"

- "Mas eu não quero ser seguida. Tenho um compromisso particular, vou visitar uma pessoa doente e não quero ser seguida".

- "Tudo bem senadora, mas a informação passada foi de que a senhora teria um compromisso marcado por Brasília. Não se preocupe, eu só quero reportar sua campanha".

- "Só tem uma raça pior do que jornalista: é político".

O diálogo foi travado entre o repórter do Valor e a candidata do P-SOL à Presidência, Heloísa Helena, em uma ladeira íngreme, transversal à rua Vergueiro, na zona sul de São Paulo, por volta das 18h do dia 13 deste mês, após uma longa perseguição desde o centro de Santo André, onde a candidata acabara de fazer uma caminhada pelo comércio. Sem conseguir se desvencilhar do carro da reportagem, a própria senadora desceu de seu veículo e partiu para a interpelação, sem descuidar dos cumprimentos aos moradores que presenciaram a cena.

A idéia era apenas saber o que Heloísa Helena iria fazer até a hora do debate entre candidatos, marcado para as 22h30, na TV Gazeta. A curiosidade foi instigada pelo visível esforço para se desvencilhar da reportagem feito pelo carro da senadora, um Gol dirigido por seu anfitrião do dia, o deputado federal Ivan Valente (P-SOL-SP). Ainda que a ironia final tenha soado como um pedido de desculpa, o episódio ilustra o estilo esquivo da candidata, especialmente na relação com a imprensa, contrastando com a postura generosa que exibe, e que é correspondida, no trato com a população em geral.

Sempre de camiseta branca, calça jeans, rabo de cavalo e, freqüentemente, com flores recebidas de populares, Heloísa Helena criou uma personagem para além do seu jeito nordestinamente desconfiado.

"Heloísa Helena é uma mulher aguerrida que passa à opinião pública a idéia de honestidade e ética em um momento adverso para essas duas qualidades. Passa também uma imagem espartana, de uma mulher que não é vaidosa, dedicada e que não se deixa levar pelo poder. Quase uma personagem", analisa o cientista político Rubens Figueiredo.

Vera Chaia, também cientista política, atribui a imagem da candidata a um misto de marketing e efetiva pobreza da campanha. "O rabo de cavalo, a calça jeans, a blusa branca... é uma marca". Para a cientista, o estilo da senadora no Congresso já passava uma idéia de como ela seria em campanha. "Era a performance de alguém que queria se impor. Uma mulher querendo se impor em um ambiente predominentemente masculino".

Para a analista, o resultado final colhido pele candidata, admitindo que ela terá uma votação em torno de 10% do total, "é muito bom", ainda mais considerando ser sua primeira candidatura de âmbito nacional. "Não é uma candidata de multidões, que consiga se viabilizar em um cargo federal (Presidência). Para o governo de Alagoas, talvez". (CS)