Título: Rio Grande do Sul discute se vinho é alimento ou bebida
Autor: Bueno, Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 25/09/2006, Empresas, p. B4

O veto do governador gaúcho Germano Rigotto à lei que classifica o vinho como "alimento funcional" no Rio Grande do Sul está longe de colocar um ponto final na polêmica que se instalou no Estado desde a aprovação da matéria pela Assembléia Legislativa, no fim de agosto.

O autor do projeto, deputado Estilac Xavier (PT), promete "mobilizar" os colegas parlamentares e os produtores do setor vinícola para derrubar o veto, enquanto entidades contrárias à lei, como o Sindicato Médico (Simers), querem evitar que classificação permaneça na proposta alternativa que o Executivo pretende encaminhar ao Legislativo em até três semanas.

Semelhante aos projetos do senador Pedro Simon (PMDB-RS) e do deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS) que tramitam no Congresso, a lei vetada por Rigotto sustenta que o consumo regular do vinho em doses moderadas traz benefícios à saúde porque contém "dez tipos de vitaminas" e "nove tipos de minerais", além de elevar os níveis de HDL (o "bom colesterol"). Segundo o Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin), o consumo da bebida no país é de apenas 1,7 litro por pessoa por ano. De cerveja são 47 litros e de cachaça, 12. O Rio Grande do Sul produz mais de 90% dos vinhos finos do Brasil.

Embora o deputado estadual e as entidades do setor vinícola afirmem que a lei não tem por objetivo reduzir impostos, a classificação como alimento abriria espaço para a queda do ICMS sobre o vinho, que hoje é de 12% no Estado - chega a 28% no Rio de Janeiro. Com a nova classificação, ele poderia ter a alíquota reduzida para, pelo menos, 7%. Rigotto também admitiu que a aprovação da lei no Estado poderia "balizar" as votações no Congresso, o que acabaria forçando uma alteração do imposto cobrado por todos os Estados e também protegeria o vinho, no caso de uma eventual reforma tributária elevar a tributação sobre bebidas alcoólicas.

Além disso, a lei poderia funcionar como uma ferramenta de marketing para as vinícolas. "O conceito ajudaria a implantar a cultura do vinho", diz o presidente da União Brasileira de Vitivinicultura (Uvibra), Antônio Salton. O setor não tem a intenção de estimular o consumo irresponsável, mas o vinho não pode permanecer na "vala comum" das demais bebidas alcoólicas, especialmente as destiladas, diz Salton. O veto também "complica" a aprovação dos projetos no Congresso. "Se o Estado que é o maior produtor vetou a lei, como votarão os deputados e senadores?", indaga.

O governador gaúcho, que é de Caxias do Sul, região que concentra a produção vinícola do Estado, assumiu o ônus de vetar a lei porque ela não explicita "limitações" quanto à publicidade do produto e às quantidades que podem ser consumidas sem danos à saúde e também porque ela poderia "ensejar o consumo de bebida por crianças e adolescentes". Segundo Rigotto, simplesmente definir o vinho como alimento é "impróprio" e até "temerário".

Desde a aprovação da lei na Assembléia, Rigotto recebeu, de um lado, pedidos de veto por parte de entidades médicas, nutricionistas e do Ministério Público Estadual. Na outra ponta, representantes dos produtores de vinho pediam a sanção da lei.

Rigotto reconhece que o vinho é importante para a "economia", a "cultura" e que contém "nutrientes benéficos ao organismo". O novo projeto de lei diferencia o vinho das demais bebidas, mas não há garantias de que será classificado como alimento.

O presidente do Simers, Paulo de Argollo Mendes, diz que a lei vetada tenderia a estimular o consumo do vinho e poderia, em alguns casos, induzir ao alcoolismo. "Entre 10% e 20% da população tem predisposição genética a se tornar dependente do álcool", observa.