Título: Clima de mudança faz candidatos apelarem à "agenda do novo" em SP
Autor: Klein , Cristian
Fonte: Valor Econômico, 05/07/2012, Brasil, p. A6

A corrida pela Prefeitura de São Paulo neste ano terá como mote a busca por uma espécie de fonte da juventude. A palavra "novo" e ideias correlatas estão na ponta da língua dos candidatos que tentam impingir ao até agora favorito, o ex-governador José Serra (PSDB), de 70 anos, a pecha de velho.

Os principais concorrentes do tucano pertencem a pelo menos uma geração posterior. Cresceram politicamente no período da redemocratização. Pela ordem etária, Gabriel Chalita (PMDB), com 43, Soninha Francine (PPS), 44, Fernando Haddad (PT), 49, Celso Russomanno (PRB), 55, e Paulinho da Força (PDT), 56, se apresentam como alternativa ao longo e conhecido currículo de José Serra.

O ex-prefeito, ex-senador, ex-ministro e candidato à Presidência da República em 2002 e 2010 aparece estável, em primeiro lugar, na última pesquisa Datafolha, com 31% das preferências.

A "agenda da juventude" é uma invenção do PT e foi aberta pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Lula tirou a senadora e ex-prefeita Marta Suplicy, 67 anos, do páreo que ela liderava e impôs ao partido o nome de seu ex-ministro da Educação, Fernando Haddad.

Haddad tem pouca experiência política. É a primeira eleição de que participa. Mas espera que Lula lhe faça o que fez com a presidente Dilma Rousseff: impulsioná-lo para a vitória, contra o mesmo Serra. A tarefa está atrasada. O petista tem 6% das intenções de voto, tecnicamente embolado com os outros candidatos, à exceção de Celso Russomanno.

O ex-deputado federal e apresentador de TV subiu progressivamente nos últimos levantamentos e chega ao fim do período de pré-campanha com 24% das preferências. Russomanno, porém, terá contra si a baixa exposição de sua imagem na propaganda eleitoral no rádio e na TV. Sua coligação (PRB-PTB-PTdoB-PRP-PHS-PTN) é a que tem mais partidos, seis, mas a maioria sem expressão. Seu programa ocupará 2min10s num horário eleitoral de 30 minutos.

A tendência, dada a correlação de forças e a tradição de rivalidade entre tucanos e petistas em São Paulo, é que a disputa se polarize entre José Serra e Fernando Haddad. Seus programas ocuparão mais da metade do horário eleitoral, graças a alianças que envolvem os maiores partidos. A coligação de Serra (PSDB-PSD-PR-DEM-PV) lhe garante 7min42s, e a de Haddad (PT-PCdoB-PP-PSB), um tempo praticamente igual, de 7min36s.

O terceiro maior programa do horário eleitoral, que começa em 21 de agosto, será o de Gabriel Chalita (PMDB-PSC-PTC-PSL), com 4min22s. O pemedebista corre por fora para quebrar a polarização PT-PSDB.

É a mesma missão de Russomanno, que já capturou a "agenda do novo" forjada pelo PT para atacar a candidatura de José Serra. O ex-governador, por sua vez, mostra ter consciência do calcanhar de Aquiles. Tanto que, ao comentar nesta semana a escolha do ex-secretário municipal de Educação, Alexandre Schneider (PSD), de 42 anos, como vice de sua chapa, Serra foi logo dizendo: "Ele representa, simboliza renovação na política..."

Mais do que uma questão de idade, no entanto, o que está em jogo no discurso de renovação da oposição é um ataque à "velha ordem" representada pela administração de Gilberto Kassab (PSD), sucessor de Serra na prefeitura.

A gestão Serra/Kassab foi iniciada em 2005 e as avaliações de governo, segundo pesquisas recentes, não são das melhores. No levantamento do Datafolha feito nos dias 13 e 14 do mês passado, 34% dos eleitores da cidade consideram ruim ou péssima a gestão do prefeito, diante de 24% que a aprovam. Os que consideram a administração regular são 41%. Os índices se mantiveram estáveis em relação aos anteriores mesmo com o aumento da publicidade sobre as realizações da prefeitura.

A insatisfação com o status quo é um desafio para a candidatura tucana. José Serra traz ainda na bagagem o peso de ter largado a prefeitura para o então vice Kassab, em 2006, quando concorreu e venceu a eleição ao governo do Estado. Dois anos antes, na campanha a prefeito, Serra chegara a firmar um compromisso por escrito de que não sairia do cargo.

Não deu outra. Logo que anunciou sua entrada na disputa para voltar à prefeitura, em fevereiro, Serra foi questionado sobre o descumprimento da promessa. O tucano se justificou e fez declarações pouco enfáticas que afastassem a possibilidade de outra vez abandonar o posto e concorrer, por exemplo, à Presidência da República - o que agora parece menos provável, já que o PSDB tende a apostar suas fichas em 2014 no senador e ex-governador de Minas Gerais, Aécio Neves.

Serra tem a maior taxa de rejeição entre os candidatos, 35%, e conta com um fator ainda mais ameaçador a lhe incomodar: o clima de mudança que parece prevalecer no eleitorado. Nada menos do que 80% da população, também de acordo com o instituto Datafolha, afirmam preferir que as ações do próximo prefeito sejam diferentes às tomadas por Kassab. Apenas 13% disseram preferir que as ações sejam iguais às do atual prefeito.

Ou seja, se toda eleição é determinada, em primeiro lugar, pelos ventos de continuidade ou de mudança, a corrida municipal para o ex-governador não deverá ser fácil, apesar do favoritismo.

O que pesa a favor de Serra é ter ao seu lado as máquinas municipal e estadual e pelo menos dois tabus. Desde a redemocratização, São Paulo nunca elegeu um prefeito apoiado pelo presidente da República - estatística que depõe contra Fernando Haddad, provavelmente o adversário a ser batido pelo tucano.

Haddad também precisa quebrar a tendência majoritariamente conservadora do eleitorado paulistano. Nas sete eleições realizadas desde 1988, apenas em duas um candidato de esquerda saiu-se vitorioso: a então petista Luiza Erundina, em 1988, e Marta Suplicy, em 2000. No primeiro caso, ainda não havia segundo turno e a necessidade de se conquistar a maioria do eleitorado. Na segunda vez, o PT se beneficiou da enorme rejeição a Paulo Maluf (PP) e atraiu o centro e a direita moderada, entre eles os tucanos.

É com o apoio polêmico desse mesmo Maluf que os petistas pretendem quebrar a barreira da maioria. A cena de Lula e Haddad selando o acordo nos jardins da mansão do ex-adversário chocou a militância e levou até o desembarque da deputada federal Luiza Erundina (PSB), que desistiu de ser vice na chapa. O acordo, porém, tirou o tempo de 1min36s do PP com o qual os tucanos já contavam, e evitou que Serra abrisse uma vantagem de mais de três minutos no horário eleitoral.

A estratégia de cooptar a direita já havia sido tentada por Lula no início do processo eleitoral, no ano passado. Sua proposta de aliança com Kassab, que por pouco não se concretizou, também provocou urticárias não só entre os filiados mas até em seu apadrinhado político. Mais recentemente, Haddad afirmou ter sido contrário aos planos de Lula de trazer o prefeito para sua candidatura. A lealdade de Kassab a Serra impediu a negociação de ir à frente, quando o ex-governador decidiu se lançar à prefeitura.

"Em primeiro lugar, eu já achava que Serra sairia como candidato. E em segundo lugar, eu não abdicaria de um discurso de mudança", disse o petista.

A entrada de Serra teve como efeito nacionalizar ainda mais a eleição em São Paulo, que tradicionalmente já é tomada como medida da força dos dois partidos e cidade estratégica para os objetivos de manter ou conquistar o governo federal.

A presença barulhenta e perturbadora do ex-presidente Lula tentando emplacar seu ungido na prefeitura mais cobiçada do país vai levar Serra inevitavelmente a uma discussão de projetos nacionais.

Se Serra perder para o PT, o temor é de que a hegemonia dos tucanos em São Paulo seja ameaçada e o governador Geraldo Alckmin tenha sua reeleição comprometida em 2014. Para os petistas, conquistar a prefeitura é um passo quase que necessário para chegar pela primeira vez ao Palácio dos Bandeirantes. Com a prefeitura, o governo do Estado e a Presidência da República, o PT pretende chegar a uma espécie de "tríplice coroa" da política nacional.

Hoje, no entanto, vencer a eleição à Prefeitura de São Paulo está mais para a salvação da lavoura petista do que um plano de domínio absoluto. O partido tem enfrentado reveses nas alianças em diversas capitais - como Recife e Fortaleza - e corre o risco de ver uma redução drástica de prefeitos nestas cidades. É mais um motivo pelo qual São Paulo se tornou prioridade absoluta.

Outras duas características marcam a eleição da capital paulista. A cidade tem como um de seus maiores problemas o transporte público - tema predileto do indefectível Levy Fidelix (PRTB), o homem do aerotrem - mas a prevalência é de candidatos com experiência na área de educação, como Haddad, Chalita e o vice Schneider, que já surge como escudo de Serra para se defender das críticas à gestão Kassab.

Outra marca é a extrema fragmentação de candidaturas. Serão 12 nomes na disputa, que inclui ainda o deputado estadual Carlos Giannazi (PSOL), o engenheiro Miguel Manso, do novato Partido Pátria Livre (PPL), Ana Luíza Figueiredo (PSTU), Anaí Caproni (PCO), e o também infalível e democrata-cristão José Maria Eymael (PSDC).