Título: Fed guarda carta na manga e espera reação econômica
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Fonte: Valor Econômico, 04/07/2012, Opinião, p. A12

Apesar de a economia americana ter dado sinais claros de que não está se recuperando da forma esperada, o Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA) preferiu ir devagar na administração de novos estímulos na reunião da semana passada.

O próprio Fed revisou para baixo as expectativas para a economia que havia feito em abril. O crescimento esperado para o Produto Interno Bruto (PIB) deste ano foi reduzido em meio ponto, para 1,9% a 2,4%; e o de 2013 caiu na mesma intensidade, para 2,2% a 2,8%. Depois de diminuir rapidamente no fim de 2011, o desemprego não cede abaixo de 8% como esperava o Fed. Em maio, estava em 8,2%. Agora, a expectativa é que só cairá abaixo dos 8% no fim do próximo ano. A única notícia positiva é o bom comportamento da inflação, projetada em 1,7%, o que não deixa de ser sintoma do desaquecimento dos negócios.

Apesar desses indicadores longe do desejável, o Fed agiu com cautela. Preferiu prorrogar a operação Twist e deixar um novo afrouxamento quantitativo (o QE, de "quantitative easing") tão esperado pelo mercado como uma carta na manga a ser usada caso a situação se deteriore mais. No ano passado, o Fed já movimentou US$ 400 bilhões e agora se propõe a girar mais US$ 267 bilhões na Operação Twist, que consiste na venda de títulos de curto prazo que estão em sua carteira e na compra de igual montante em papéis de 6 a 30 anos.

Dessa forma, o Fed induz a queda dos juros de longo prazo para baratear o crédito, estimular os investimentos das empresas e o consumo das famílias, para animar a economia. Realmente, os juros dos títulos de dez anos caíram de 3,4% no início de 2011 para 1,6% atualmente. Nem por isso, porém, houve impacto importante nas concessões de crédito e é improvável que as taxas caiam mais. Por isso não se espera muito da nova Operação Twist.

Teria causado maior impacto nova rodada de afrouxamento quantitativo. Mas pesou contra essa alternativa o receio de que nova expansão do balanço do Fed, que está perto de US$ 3 trilhões, poderá dar impulso à inflação sem necessariamente reduzir o desemprego. As taxas estão perto de zero desde o fim de 2008 e assim ficarão até 2013.

Nesta semana, entrou na discussão o Fundo Monetário Internacional (FMI), que foi ainda mais pessimista ao prever para a economia americana crescimento de apenas 2% neste ano e de 2,25% em 2013, com o desemprego caindo para 7,9% só em 2013. Para o FMI, os Estados Unidos continuam vulneráveis ao contágio da crise da dívida da zona do euro; a redução da demanda do mercado europeu e a apreciação do dólar podem prejudicar os exportadores americanos.

O FMI elogiou a decisão do Fed de ampliar a Operação Twist, mas ponderou que há espaço para novas medidas de afrouxamento monetário caso as condições econômicas piorem, em um claro sinal verde para o QE3.

Mas o alerta mais sério do Fundo foi para o chamado "abismo fiscal" que se prenuncia para 2013 e, com certeza, tem influência no marasmo da economia americana. Como parte do plano de redução do déficit fiscal americano, vão entrar em vigor no início do ano medidas de aumento dos impostos para pessoas físicas e empresas e cortes de gastos que causarão uma contração de US$ 600 bilhões na economia, o equivalente a 4% do Produto Interno Bruto (PIB), o que pode levar os Estados Unidos a uma nova recessão, certamente com repercussão em todo o mundo.

O plano, traçado no passado quando esperava-se que as economias americana e a global saíssem mais rapidamente da crise, tem que ser remodelado. Até o usualmente rígido FMI recomendou que os Estados Unidos reduzissem o aperto programado para 1% do PIB, adiando para o médio prazo um plano mais austero. O FMI também sugere medidas de curto prazo para estimular a economia, como investimentos em infraestrutura, no combalido setor imobiliário e a distribuição de mais benefícios e também treinamento aos desempregados. Sugeriu também ao Congresso ampliar o limite de endividamento que deve ser atingido no início do próximo ano para evitar a repetição do estresse financeiro que ocorreu em 2011 com a eminência de um possível default.

Essas medidas esbarram, porém, no calendário político. Até as eleições presidenciais de novembro, dificilmente republicanos e democratas terão o desprendimento político necessário para chegar a um acordo a respeito de temas tão delicados. Não é, portanto, apenas a Europa que, mesmo à beira do abismo, não toma as medidas necessárias para evitar despencar de vez por causa da mesquinheza política de sempre.