Título: Estímulos setoriais não salvam produção industrial
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Fonte: Valor Econômico, 06/07/2012, Opinião, p. A12

A notícia de que a produção industrial teve mais um desempenho desanimador em maio desapontou o governo. Depois de reduzir os juros a níveis históricos de baixa, de quase uma dezena de planos de estímulo à economia e cerca de R$ 100 bilhões em incentivos, desonerações tributárias e linhas especiais de crédito, o equivalente a mais que um mês de arrecadação federal, foi impossível esconder a decepção com a falta de reação da indústria.

Até a presidente Dilma, em pleno lançamento de um plano para outro setor combalido, a agropecuária, disse que o Brasil vai "virar o jogo" da queda da produção industrial. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, voltou a atacar os bancos pelos juros altos e a sinalizar que quer o dólar acima de R$ 2. Em um discurso menos otimista do que o habitual, Mantega disse que a atual onda de crise não é menos intensa que a de 2008. Alertou que a turbulência afeta a indústria no mundo todo e que é improvável uma solução no curto prazo diante da desaceleração na União Europeia e EUA.

De fato, reportagem do "The Wall Street Journal", publicada pelo Valor (3/7), mostra que a indústria está sendo golpeada pela crise em todo o mundo. O setor industrial dos Estados Unidos, por exemplo, que vinha sustentando a recuperação do país, encolheu em junho pela primeira vez desde julho de 2009. Não é diferente na China, Alemanha, Coreia do Sul e Japão.

No Brasil, porém, o problema é mais antigo e estrutural. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou nesta semana que a produção industrial encolheu 0,9% em maio em comparação com abril. A queda superou o previsto e representa o pior desempenho desde janeiro, quando a produção caiu 1,9%. Além disso, o resultado de abril foi revisto para pior, de 0,2% de queda para 0,4%. Em relação a maio de 2011, a baixa é de 4,3%, o nono resultado negativo nessa base de comparação, a pior taxa desde setembro de 2009.

Com isso, a produção industrial acumula queda de 3,4% nos cinco primeiros meses do ano e de 1,8% nos 12 meses terminados em maio. É inevitável o impacto negativo na evolução do Produto Interno Bruto (PIB), que já teve uma retração de 0,2% no primeiro trimestre, sinalizando resultados ruins para o resto do ano. O Banco Central (BC), que esperava para o PIB deste ano uma evolução de 3,5%, já revisou para baixo a expectativa, ficando em 2,5%, inferior mesmo aos 2,7% de 2011. No mercado financeiro não são poucos os que esperam crescimento abaixo de 2%.

Estoques ainda elevados e exportações fracas são os principais motivos da queda da produção industrial no momento, mas há ainda o pano de fundo de carga tributária excessiva, falta de competitividade e custos elevados. Apesar da crise, os pacotes de estímulo à economia, o nível de emprego elevado e a massa salarial em expansão animam o consumo, parcialmente atendido pelas importações. Preocupou a queda de 1,8% entre maio e abril da produção de bens de capital, por estar relacionada diretamente com o nível de investimentos. Em relação a maio de 2011, a produção de bens de capital caiu 12,2%; e, no acumulado em cinco meses, cedeu 12%.

O desempenho da produção industrial de maio mostra o impacto da redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para eletrodomésticos e móveis, efeito que tende a perder gás nos próximos meses. A produção de eletrodomésticos da linha branca (geladeira, fogão e refrigerador) avançou 8,5% em maio e 9% em abril, frente a igual mês do ano anterior. Já o setor de móveis teve alta de 22,3% em maio e 14,7% em abril. Já a produção de outros eletrodomésticos que não receberam incentivo tributário, como micro-ondas e liquidificadores, teve queda de 25,5% em maio e 13,6% em abril.

O setor de automóveis ainda não refletiu, em maio, o efeito positivo da redução de IPI, anunciado dia 21 daquele mês, que diminui em até 10% os preços. A produção de automóveis caiu 5,3% em maio depois de ter recuado 2,7% em abril. O setor de veículos automotores foi contagiado e foi o que mais pesou negativamente no desempenho ruim da indústria. Após reagir nos últimos três meses, acumulando crescimento de 22,7%, a produção de veículos automotores caiu 4,5% em maio frente a abril, e 16,8% em relação a maio de 2011. Em junho, a venda de veículos já cresceu 22,8%. O ministro Mantega acredita que a produção industrial não "será ruim" em junho e acenou com novos pacotes na área de desoneração tributária. No entanto, fica cada vez mais claro que estímulos setoriais produzem apenas resultados localizados e que o governo deveria pensar em uma ação mais abrangente.