Título: Telefónica prepara terreno para nova ofensiva
Autor: Santana , Ivone
Fonte: Valor Econômico, 06/07/2012, Empresas, p. B3

A crise financeira na Europa e o potencial de desenvolvimento dos países emergentes desviaram as atenções do grupo espanhol Telefónica para a América Latina, em especial para o Brasil, transformando a região no próximo motor de crescimento para o grupo. O esforço para acelerar a evolução das receitas estará, em grande parte, a cargo da Telefónica Digital. A empresa foi criada há apenas nove meses, mas tem o apoio do grupo para liderar uma escalada que promete elevar as receitas da unidade do patamar de € 2,4 bilhões em 2011 para € 5 bilhões em 2015, com taxa de crescimento anual estimada em 20%.

As projeções foram anunciadas ontem em Londres, sede da Telefónica Digital, durante um evento para investidores e jornalistas. Na estratégia da companhia, novas linhas de negócios ganham importância. Da receita total estimada, publicidade e serviços financeiros poderão responder por € 800 milhões a € 1,1 bilhão em 2015; a distribuição de conteúdo representará entre € 1,2 bilhão e € 1,5 bilhão. Já a segurança e a computação em nuvem atingirão receitas de € 300 milhões a € 600 milhões. Criticada como um gigante lento, difícil de administrar e com dívida de € 57 bilhões, o grupo espanhol quer mostrar que pode rejuvenescer e que suas linhas de negócios estão muito além da simples conectividade.

Até a imagem do presidente do conselho e diretor-presidente da Telefónica Digital, Matthew Key, procura transparecer modernidade e descontração. Durante sua apresentação, o executivo se apresentou de jeans e camisa casual. E garantiu: a reformulação não visa mostrar o potencial dos serviços digitais do grupo para vender a unidade posteriormente e sanar as dívidas do grupo.

Uma das armas do grupo é o lançamento de telefones celulares e tablets com o sistema operacional Firefox OS

O entusiasmo demonstrado por Key durante o encontro contrastava com o cenário geral de Londres. A poucos dias do início da Olimpíada, o centro da capital britânica não dá sinais da grandeza das competições que estão por vir. Não há faixas, cartazes, lembranças ou quaisquer outras demonstrações visuais que envolvam o espírito esportivo da população. Apenas no aeroporto internacional de Heathrow algumas imagens de atletas parecem indicar que algo está para acontecer.

Se na cidade não há sobressaltos, dentro do auditório onde a Telefónica realizou o encontro Key deixou o público admirado com o anúncio de suas expectativas em relação ao Brasil e à América Latina. Ele disse que a região representa a maior oportunidade de negócio para o grupo, em termos globais. A capacidade dos países latino-americanos, citou, é três vezes superior à da África. A menção ao continente africano não é despropositada. Estudos mundiais estimam que a região terá mais de 700 milhões de celulares até o fim do ano.

O grupo espanhol está fazendo uma aposta em um novo sistema operacional, que estará disponível aos usuários brasileiros de celulares e tablets a partir do primeiro trimestre de 2013. A Telefónica Digital fechou um contrato com a Etisalat, maior operadora de telecomunicações do Oriente Médio, para ajudar a Mozilla Foundation a desenvolver um sistema para celular, com base no sistema aberto HTML5, batizado de Firefox OS. Dois ou três fabricantes já acertaram com a Telefónica a produção de aparelhos com o novo sistema e mais meia dúzia de companhias está em negociação, disse Key, sem revelar nomes. Recentemente, as chinesas TCL Communications (que vende aparelhos sob a marca Alcatel) e a ZTE disseram que produziriam celulares com a Mozilla.

Serão lançados modelos básicos, com preço estimado em aproximadamente US$ 100. Como o valor é baseado no mercado americano, ainda não se sabe a que preços esses celulares serão lançados no Brasil. Além dos impostos locais, existem pontos a considerar como o comprometimento da indústria com o processo produtivo básico (PPB) e o índice de nacionalização.

"Podemos fabricar dispositivos inteligentes com melhor funcionalidade e preço", afirmou Key. Ele revelou que pretende abrir o negócio para outros operadoras porque tem interesse em obter uma escala industrial de produção.

O acordo com a Etisalat expande os serviços digitais da Telefónica para 17 países e mais de 170 milhões de clientes. Abre espaço também para o compartilhamento de conhecimentos na comunicação automatizada entre máquinas via chip de celular, serviço conhecido como M2M. A proposta é para cooperação em roaming internacional por M2M e vídeo.

Na área publicitária, o Brasil também ficou no centro da estratégia do grupo espanhol. O mercado publicitário brasileiro cresceu 11% em 2011, para € 15 bilhões, segundo divulgou a Telefónica Digital. Embora a publicidade em celular ainda esteja engatinhando no país, a direção da companhia considera que esses aparelhos têm grande potencial para veicular anúncios e gerar uma receita expressiva. Isso porque a base de telefones móveis já ultrapassa 100% no país - ou seja, há mais de um celular por habitante - e continua crescendo, estimulada pela rápida popularização dos smartphones, que atingem 9% da população, taxa que o executivo espera ver crescer por conta dos novos acordos fechados pela companhia.

A Telefónica Digital criou uma equipe de publicidade especializada em celulares que permitirá à Telefônica/Vivo, no Brasil, acelerar o aumento de receitas com mídia. A base de 75 milhões de clientes da subsidiária brasileira é o principal alvo da estratégia, desde que a operadora consiga convencer esses usuários a receber publicidade em seus aparelhos.

Pelas regras da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), os usuários precisam dar o "opt-in", uma autorização, para que sejam enviadas mensagens publicitárias ou de marketing a seus aparelhos. "A publicidade no celular é relativamente nova no Brasil. Queremos pegar o exemplo do Reino Unido e aplicar no Brasil, com milhões de euros no mercado de publicidade móvel", disse Key. Na Europa, a companhia conta com 23 milhões de clientes que fizeram a opção por receber essas mensagens. O movimento é liderado pela O2, no Reino Unido.