Título: Congresso dos EUA reduz chance de renovação do SGP este ano
Autor: Balthazar, Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 27/09/2006, Brasil, p. A3

O Congresso dos Estados Unidos reduziu dramaticamente ontem as chances de que seja renovado ainda neste ano o Sistema Geral de Preferências (SGP), programa comercial que beneficia o Brasil e outros países em desenvolvimento ao permitir a entrada de certos produtos no mercado americano sem o pagamento de tarifas de importação.

Os benefícios do SGP expiram no fim deste ano e só serão prorrogados se o Congresso autorizar. Um projeto de lei que estende o prazo de validade do programa por mais dois anos entrou na lista de assuntos que seriam discutidos ontem no plenário, mas no início do dia ele foi retirado da pauta e devolvido para o fim da fila, o que torna quase impossível a votação da proposta antes do fim do ano.

Apresentado há menos de uma semana pelo deputado Bill Thomas, que é do Partido Republicano e preside a comissão da Câmara que trata de assuntos comerciais, o projeto foi abatido em pleno vôo porque contrariou os interesses da indústria têxtil americana, que se mobilizou rapidamente nos últimos dias para deter o avanço da proposta.

Além de renovar o SGP, o projeto introduzia mudanças em outro programa, que favorece a importação de roupas e tecidos produzidos na África, e estendia benefícios semelhantes para empresas baseadas no Haiti. A indústria têxtil americana, que tem apanhado de competidores da China e de outros países, mas ainda tem muita influência em Washington, não ficou quieta.

"Ninguém dos setores afetados pela iniciativa foi consultado previamente e por isso a proposta não foi muito longe", disse ao Valor Laura Baughman, diretora da consultoria Trade Partnership Worldwide, que trabalha para um grupo de empresas americanas e associações com interesse na renovação do SGP.

Agora será preciso esperar bastante para ver o projeto novamente no plenário. O Congresso entrará em recesso na próxima semana. Haverá eleições para deputado e senador em novembro e os políticos só voltarão ao trabalho depois disso. Restará então pouco tempo até o fim do ano, e aí eles estarão mais preocupados com o rescaldo das eleições, em que os republicanos correm o risco de perder para o Partido Democrata a maioria que têm no Congresso.

No ano passado, os EUA importaram mercadorias no valor de US$ 27 bilhões pelo SGP. O programa foi criado na década de 70 e atualmente beneficia 133 países em desenvolvimento. Empresas brasileiras que souberam aproveitar seus benefícios venderam no ano passado US$ 3,6 bilhões, equivalentes a 15% do total das exportações do Brasil para o mercado americano.

Embora prorrogue os benefícios do SGP, o projeto de Thomas contém aspectos bastante negativos para o Brasil. Algumas vantagens do programa são concedidas em caráter excepcional de acordo com certas condições e o projeto exclui da lista de potenciais beneficiários dessas concessões países com renda per capita semelhante à do Brasil.

Se o SGP não for renovado, as empresas brasileiras beneficiadas pelo programa terão que pagar tarifas de 2% a 7% para entrar nos Estados Unidos. Em setores muito competitivos e com margens de lucro muito apertadas, tarifas desse tamanho são consideráveis e suficientes para fazer as empresas brasileiras perder bons negócios para concorrentes como a China.

Companhias americanas de grande porte, como a General Motors, a fabricante de autopeças Eaton e o laboratório farmacêutico Merck, também têm interesse na continuidade do SGP. O programa torna mais competitivas suas subsidiárias e seus fornecedores no Brasil e nos outros países beneficiados. Mas o Congresso têm se mostrado indiferente a essa circunstância.

Políticos influentes no Congresso americano acham que países como o Brasil ficaram grandes demais nas últimas décadas e não precisam mais da ajuda do SGP. Alguns, como o senador Chuck Grassley, que também é do Partido Republicano, culpam o Brasil e a Índia pelo fracasso das negociações da Rodada Doha de liberalização do comércio mundial, suspensas em julho, e vêem a exclusão dos dois países do SGP como uma retaliação justa e necessária.