Título: 'Noventena' leva muitas empresas à Justiça
Autor: Watanabe, Marta
Fonte: Valor Econômico, 27/09/2006, Brasil, p. A5

Antes argumento secundário nas discussões sobre impostos, a regra que prevê prazo de 90 dias para que uma alteração tributária entre em vigor, passou a ser o principal motivo que leva algumas empresas ao Judiciário. Contribuiu para isso o fato de o argumento, antes aplicável apenas para as contribuições sociais, como o PIS e a Cofins, passar a ser, a partir de 2004, também previsto para outros tributos, como os impostos.

sob a extensão da noventena aos impostos, a C&C Casa e Construção e a Marisa Lojas Varejistas, foram ao Judiciário para tentar se livrar da elevação de 17% para 18% do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços de São Paulo (ICMS). Já a Gradiente Eletrônica S/A alegou a noventena tradicional das contribuições sociais. A empresa conseguiu na Justiça uma sentença que a livrou do cálculo não-cumulativo do Programa de Integração Social (PIS) durante três meses de 2003. Segundo o advogado que a representa, a discussão tem um valor relevante para a companhia, cerca de R$ 4 milhões.

Os especialistas dizem que nem sempre pode ser vantajoso para a empresa ajuizar uma ação com o argumento da anterioridade de 90 dias. "No caso do ICMS, por exemplo, é preciso analisar vários fatores para verificar se o benefício tributário de uma ação judicial pode superar os custos", diz o advogado Marcio Alabarce, do escritório Machado Associados. "A discussão pode ser interessante para as empresas que possuem um volume muito grande de aquisições que não dão direito a crédito de ICMS ou quando trata-se de um varejista que vende muito para o consumidor final."

A elevação de ICMS de 17% para 18% por lei editada todo fim de ano é uma tradição em São Paulo. Com a noventena aplicável também para a elevação ou instituição de impostos a partir de 2003, os aumentos passaram a ser alvo de contestação, explica Alabarce. Ele acredita, porém, que um volume de ações judiciais pode surgir mais tarde. "Muitas empresas devem preferir solicitar os créditos relativos à anterioridade nonagesimal reunindo um período de cinco anos, por exemplo." Procuradas, a C&C e a Lojas Marisa não se manifestaram.

"No caso da Gradiente, os três meses foram muito relevantes para a empresa", diz o advogado Lawrence Tancredo, da Tancredo Advogados, escritório que representa a fabricante de aparelhos eletrônicos. Ele explica que, quando foi instituída a não-cumulatividade do PIS, a legislação não permitiu, na época, que a empresa se creditasse das importações de insumos. Para a fábrica da Gradiente instalada na Zona Franca de Manaus, a restrição, diz Tancredo, representou um alto custo tributário, já que 70% dos insumos industriais da empresa são importados.

Alguns escritórios também desenvolvem outros argumentos para tentar recuperar o que foi pago a mais de adicional de Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e de 0,5% da contribuição devida pelas empresas entre outubro e dezembro de 2001

Contestado, o adicional foi considerado válido pelo Supremo Tribunal Federal, mas somente a partir de janeiro de 2002. Na época, a legislação considerou o FGTS uma contribuição e estabeleceu a noventena, mas o Supremo, em liminar, decidiu que a anterioridade aplicável era a anual, aplicada aos impostos. "Como os recolhimentos foram feitos em 2001 e o prazo para questionar é de cinco anos, quem quiser entrar nessa discussão, porém, só tem até dia 29 de setembro para ajuizar as ações", diz Leonardo Mazzillo, do escritório WFaria Advogados.

Ele explica que a discussão vale para empresas com folha de salários representativa ou que teve, no período, demissões de alto valor. Segundo Mazzillo, o escritório deverá ajuizar uma ação para um grupo que teria cerca de R$ 20 milhões a recuperar.