Título: Herança indigesta
Autor: Oliveira, Noelle; Medeiros, Luísa
Fonte: Correio Braziliense, 04/11/2010, Cidades, p. 31

Rombo de R$ 800 milhões nas contas, reajuste para servidor e problemas na Saúde são situações a serem enfrentadas pelo governador eleito

Com um deficit orçamentário previsto em R$ 800 milhões, o Governo do Distrito Federal (GDF) terá que equilibrar as contas até o fim do ano para entregar a casa em ordem ao governador eleito, Agnelo Queiroz (PT). Para tanto, o atual chefe do Executivo, Rogério Rosso (PMDB), afirma já ter colocado a máquina pública em contingenciamento de gastos desde abril. A fim de equilibrar as contas, será preciso diminuir despesas e até cortar programas. Mesmo que os cálculos fechem, o Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) para 2011, previsto em R$ 25,67 bilhões 13,2% maior de que o de 2010 , também pode não ser suficiente para colocar em prática o plano de governo apresentado pelo candidato eleito.

Temos um orçamento incompatível, esse é um dos nossos problemas do dia a dia no Governo do DF. A nossa disponibilidade financeira não condiz com os planos de governo. Vamos precisar da ajuda da Câmara Legislativa, do esforço de cada unidade orçamentária, para resolver esse descompasso que não queremos deixar para o Agnelo, afirmou ontem Rogério Rosso, após reunião para discutir a transição do GDF.

Um dos problemas que deve ser enfrentado pelo petista eleito é o pagamento de servidores públicos na nova gestão. De acordo com o Ploa, que deve ser apreciado pela Câmara Legislativa até 15 de dezembro, a folha de pessoal do governo local vai consumir a maior parcela dos recursos em 2011 cerca de R$ 5,6 bilhões. Um aumento salarial de 7%, em média, está previsto para todas as carreiras. No entanto, apenas este ano, sem reajustes, o governo local gastou R$ 5,4 bilhões com salários. Diante da situação, na semana passada, o Executivo teve que pedir à Câmara Legislativa uma abertura de crédito suplementar, de R$ 114, 4 milhões, a fim de quitar a folha de pagamento de diversos órgãos.

As obras em andamento e prometidas também podem esbarrar na questão financeira. Para investimentos em infraestrutura, urbanismo, saúde e outros setores, o governo local reservou R$ 2,32 bilhões para 2011. As prioridades estão nos gastos para preparar Brasília para a Copa do Mundo de 2014. A construção do Estádio Nacional de Brasília vai receber cerca de R$ 150 milhões. Mas o custo total da obra, com execução de 30 meses, será de R$ 690 milhões. O dinheiro virá da Terracap, mas, se apertar as contas, o governo poderá conseguir empréstimo internacional devido a um decreto do presidente Lula que elimina o teto de endividamento das cidades-sedes da Copa.

Para o ex-secretário de Planejamento do GDF Ricardo Penna, o risco de ceder aos aumentos previstos na folha de pessoal não deixará muita margem de recursos para fazer investimentos. Os espaços que ele (Agnelo) tem para dar aumento são reduzidíssimos. O GDF tem anuênio, paga 1% ao ano com crescimento na carreira. Se ele der aumento, não pode investir muito nas creches ou no Metrô até Asa Norte, afirmou ele. Entre as metas do novo governador está a construção de creches para todas as crianças de 0 a 3 anos, além da criação de escolas técnicas, de unidades de pronto atendimento (Upas) e de centros da Juventude em todas as regiões administrativas.

Empréstimos Diante da herança, o novo governador pode ter de recorrer a empréstimos. Até dezembro de 2009, o GDF contratou um total de R$ 2 bilhões. Cerca de 35% do valor foram utilizados até setembro último, sendo metade para o projeto da Linha Verde, na Estrada Parque Taguatinga (EPTG). O governo de Agnelo terá R$ 1,3 bilhão em empréstimos já adquiridos para investir em infraestrutura. Atualmente, o DF tem uma dívida de R$ 3,35 bilhões.

Até o fim da próxima semana, a vice-governadora do DF, Ivelise Longhi (PMDB), responsável pelo gerenciamento das obras, promete divulgar um balanço com as pendências que ficarão para o próximo governante. Estamos fechando um levantamento nesse sentido para avaliar o que vai permanecer. As obras maiores foram a nossa prioridade. Agora, existem outras que estavam apenas licitadas, essas nós estamos listando e mostrando a importância para que o próximo governo decida quais terão prioridade, disse.

Para diminuir a rol de problemas na área da Saúde, a titular da pasta, Fabíola Nunes, adiantou ontem que será deixada uma lista de medicamentos e de materiais médico-hospitalares com preços registrados em ata para agilizar a compra via licitação. As últimas aquisições deverão ser finalizadas em dezembro. Outro gargalo é o alto gasto do Hospital de Santa Maria, que atualmente consome 12% do recurso total para as unidades da rede. O pagamento dos servidores e a retomada dos serviços estão sendo negociados para não deixar de herança para o novo governo.

Regra As despesas que passam de um ano para outro são chamadas de restos a pagar. Ocorrem, por exemplo, quando uma obra não é concluída até o fim de dezembro. Isso pode coincidir com o fim de uma gestão. Como o governo se comprometeu (empenhou) a pagar a despesa, a conta acaba sendo jogada para o ano seguinte. Segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal, no entanto, é vedado ao governante, nos últimos dois quadrimestres do seu mandato, contrair obrigação de despesa que não possa ser cumprida integralmente dentro da sua gestão ou que tenha parcelas a serem pagas no exercício seguinte, sem que haja suficiente disponibilidade de caixa para esse efeito.