Título: Equação difícil na equipe
Autor: Batista, Vera
Fonte: Correio Braziliense, 02/11/2010, Economia, p. 13

transição Ortodoxos, desenvolvimentistas e membros do atual governo, como Mantega e Meirelles, lutam por postos na área econômica Vera Batista

A presidente eleita do Brasil, Dilma Rousseff, terá que usar de muita criatividade e jogo de cintura para acomodar no governo as forças políticas que a apoiaram. O alto escalão da administração pública não comporta todos os aliados e analistas já preveem uma guerra fratricida, concentrada principalmente na área econômica. Além de atender seu próprio desejo de alçar a cargos mais altos pessoas de sua confiança, como o ex-chefe da Apex Brasil Alessandro Teixeira, o secretário de Política Econômica, Nelson Barbosa, e a presidente da BR Distribuidora, Maria das Graças Foster, Dilma terá de encaixar indicados pelo PMDB, do vice Michel Temer, e pelo PSB.

Para tornar a equação mais complicada, Dilma precisa preservar nomes que tiveram ou têm atuação importante no governo atual, como o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci, um dos coordenadores da campanha petista, e o titular do Planejamento, Paulo Bernardo. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, liberaram seus assessores para plantar notícias nos jornais, segundo as quais o presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria recomendado à sucessora a manutenção de ambos. Assim, pretendem garantir o cacife para uma posição qualquer na nova estrutura.

Os investidores financeiros aceitaram bem a chegada de Dilma ao Palácio do Planalto (leia reportagem na página 14), mas ainda estão ansiosos quanto à formação de sua equipe. A preocupação reside, em especial, na escolha dos ocupantes de ministérios estratégicos, como a Casa Civil, a Fazenda e o Planejamento, e de importantes estatais Petrobras, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil , além do Banco Central (BC).

Em entrevista ontem ao Jornal Nacional, da TV Globo, Dilma definiu dois critérios na escolha da equipe: o técnico, segundo a capacidade dos indicados, e o político, que respeitará a composição necessária na base aliada. Para a formação da equipe econômica, a preferência do mercado financeiro é claramente pelos ortodoxos, como Meirelles. A presidente eleita, entretanto, não disfarça a predileção pelos desenvolvimentistas, mas teme uma eventual reação negativa ao nome de Luciano Coutinho (atual presidente do BNDES) ou de Nelson Barbosa à frente do BC, por exemplo. No senador Aloizio Mercadante (PT-SP), os operadores não querem nem ouvir falar.

Mesmo sem uma posição na área econômica, Antonio Palocci é visto pelos investidores e empresários do setor produtivo como garantia de que Dilma não vai se afastar da política econômica tradicional. Sob sua influência, a presidente eleita reforçou o mantra do tripé da estabilidade macroeconômica superavit fiscal, câmbio flutuante e regime de metas de inflação. É provável que ela aponte tanto ortodoxos como desenvolvimentistas para postos importantes, repetindo o precário equilíbrio mantido nos oito anos de mandato de Lula.

Mas há um fator extra a considerar: Dilma é economista. Deve, portanto, interferir mais diretamente no debate do que fez seu ídolo político. As apostas para a equipe são variadas (veja quadro). Para Marcelo Coutinho, sócio presidente da corretora Youtrade, a vitória de Dilma estava dentro das expectativas e nada vai mudar significativamente.

Qualquer especulação sobre nomes é prematura, disse.

BOMBA ORÇAMETÁRIA

Gustavo Henrique Braga

A presidente eleita, Dilma Rousseff, corre o risco de assumir, já no começo do mandato, uma bomba no Orçamento federal. Após a promessa de José Serra (PSDB-SP) de elevar o salário mínimo a R$ 600, as centrais sindicais se uniram pela reivindicação de um reajuste mais polpudo para o piso dos trabalhadores. A Força Sindical pressiona o governo a conceder um incremento de 13% em 2011, o que levaria o valor a R$ 576,30 em vez dos R$ 538,15 previstos atualmente. O problema é que uma correção dessa magnitude implica um impacto adicional nas contas públicas entre R$ 11 bilhões e R$ 12 bilhões, considerando os benefícios previdenciários, além do abono e do seguro-desemprego.

O cálculo é simples: basta lembrar que, para cada R$ 1 a mais no mínimo, o governo precisa desembolsar R$ 286 milhões. Ocorre que, para decidir qual será o reajuste a ser aplicado no ano seguinte, o governo considera a soma da inflação e do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do ano anterior à elaboração do orçamento. Como em 2009, a expansão econômica foi zero, a previsão é de que não haja ganho real em 2011. É exatamente isso que os sindicalistas não aceitam, mesmo diante da perspectiva de um ganho próximo a 8% em 2012, quando o cálculo considerará o PIB de 2010.

Este ano, as principais categorias conseguiram reajustes de 9% a 10%. Se o mínimo crescer abaixo disso, o país vai andar para trás, porque a desigualdade aumentará, argumenta o presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva. Os representantes dos trabalhadores já se reuniram com o Ministro do Trabalho, Carlos Lupi, para negociar o ganho real no ano que vem e têm um encontro com o relator do Orçamento, senador Gim Argello (PTB-DF), na quinta-feira. Pereira quer convencê-lo a considerar o resultado do PIB de 2010 no cálculo e não o de 2009. Isso levaria a um reajuste próximo dos 13%.

Brecha A Força Sindical quer que a correção seja determinada, até o fim do ano, por Medida Provisória para dar tempo de vigorar em 1º de janeiro, sendo votada em fevereiro. A luta, entretanto, não será fácil. Segundo Gim Argello, a ideia é chegar a R$ 550 e que, dificilmente, será possível ultrapassar esse valor. Na quarta-feira, ficará pronta a estimativa de receita. Só então, poderei dizer até onde dá para aumentar o salário mínimo. Se houver brecha, não hesitarei em propor o ganho real, disse.

Na avaliação do consultor em Previdência João Magalhães Filho, elevar o salário mínimo para R$ 576,30 prejudicará o país. O impacto tem que ser gradual. Não adianta aumentar o valor se as prefeituras não aguentam o baque nas contas. O desemprego e a informalidade tenderão a explodir, já que os empresários não têm condições de arcar com um aumento brusco de custos, disse. O correto é oferecer aumentos de forma sustentável. Dessa forma, o mínimo pode até dobrar em sete ou oito anos, estimou Magalhães Filho.