Título: Desgaste logo no início do mandato
Autor: Hessel, Rosana
Fonte: Correio Braziliense, 02/11/2010, Economia, p. 14

TRANSIÇÃO Decisão final sobre o projeto de lei dos royalties do pré-sal deve ficar para o ano que vem. Dilma terá que desagradar aos governadores dos estados produtores ou aos demais

Logo que tomar posse, a presidente eleita Dilma Rousseff poderá enfrentar sua primeira prova de fogo, caso o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixe mesmo para a sua sucessora a incumbência de sancionar ou vetar o projeto de lei que, entre outras coisas, muda a distribuição dos royalties do petróleo. De cara, ela ficará numa encruzilhada entre agradar aos estados produtores, cujos governadores eleitos compõem a base aliada, e aos demais, que querem uma fatia da receita com a exploração dos megapoços recém- descobertos e com potencial para até dobrar as reservas atuais.

O líder do governo na Câmara, deputado Cândido Vacarezza (PT-SP), informou ontem que o projeto que dispõe sobre a exploração de petróleo e de gás natural em áreas da camada pré-sal (PL 5.938/09) deve ser votado somente em 2011. Ou seja, depois do Orçamento do ano que vem e das 12 medidas provisórias que estão trancando a pauta. Como ele está em terceiro lugar na lista de prioridades, não deve haver tempo suficiente para a análise.

Se isso realmente acontecer, será um presente de grego de Lula para Dilma, disse o diretor da Organização Nacional da Indústria do Petróleo (Onip), Adriano Pires. O especialista ficou surpreso com a notícia, pois havia um acordo para que Lula vetasse o projeto, que reduz, e muito, a receita com os royalties do petróleo para o Rio de Janeiro e o Espírito Santo, estados produtores. Eles dependem dessa fonte de recursos, fundamental para a saúde financeira dos governos, uma vez que a lei passa a valer também para os contratos antigos de exploração de petróleo. Será um desgaste para Dilma logo no início do mandato.

O senador Renato Casagrande (PSB-ES), governador eleito do Espírito Santo, disse que pretende conversar com as bases do partido e também com a presidente eleita sobre o tema, assim que possível. A princípio, não vejo prejuízo com o adiamento, pois já existe um acordo para o veto. Acredito que seja possível haver um entendimento. Vamos deixá-la (Dilma) saborear a vitória. Mas vou defender o cumprimento da Constituição e dos contratos antigos, disse o senador, acrescentando que existe uma possibilidade de negociar o veto apenas no item que muda as regras para os contratos antigos.

Já o governador reeleito do Rio, Sérgio Cabral, do PMDB, afirmou ontem que está convicto que Dilma irá manter o acordo sobre a divisão de lucros com o petróleo do pré-sal, firmado com Lula. Vamos ter de ter uma solução específica para recompor o acordo. Não é apenas vetar. Se vetar, voltamos ao percentual atual e o percentual com a partilha não é bom para o Rio, disse.

O anúncio da descoberta de novas reservas na camada pré-sal no litoral do Rio, no campo de Libra, que pode ter até 15 bilhões de barris, deve aguçar o apetite dos governadores do Nordeste, região em que Dilma teve vitória esmagadora sobre o adversário José Serra. Ela terá que administrar essa futura crise e se indispor com os parlamentares que defendem a partilha igualitária dos lucros do petróleo. Resta saber também se Dilma vai querer ou não realizar novos leilões para a concessão de áreas para exploração do pré-sal ou deixar tudo com a Petrobras, completou Adriano Pires.

Emenda O projeto de lei foi aprovado em março deste ano na Câmara com a emenda apresentada pelos deputados Ibsen Pinheiro (PMDB-RS), Humberto Souto (PPS-MG) e Marcelo Castro (PMDB-PI), que cria o regime de partilha dos royalties do petróleo a ser extraído do pré-sal de forma igualitária entre os estados produtores e não produtores. Pela emenda, os lucros com concessão do petróleo, tomando por base o número de habitantes e a renda das regiões brasileiras, fazendo os estados do Rio de Janeiro e do Espírito Santo, maiores produtores do país , receber menos. A matéria agora tramita no Senado.