Título: Alemanha dá sinais de que pegou a 'gripe' dos vizinhos
Autor: Weck , Joseph de
Fonte: Valor Econômico, 09/07/2012, Internacional, p. A7

Enquanto boa parte do restante da zona do euro está em recessão ou se aproxima disso, a Alemanha conseguiu continuar crescendo, uma vez que reformas dolorosas do mercado de trabalho, adotadas no início da década de 2000, impulsionaram a produtividade e restringiram o avanço dos salários. Com a ajuda de um euro desvalorizado, o país neutralizou os efeitos da fragilidade da demanda por parte da zona do euro com exportações para os mercados emergentes, sobretudo para a China, que valoriza trens, equipamentos de geração de energia elétrica e máquinas produzidos na Alemanha.

Mas a crise está chegando à principal economia da União Europeia (UE). O grau de confiança dos empresários caiu em junho para seu patamar mais baixo do último período de mais de dois anos, em meio a especulações sobre o possível abandono do euro pela Grécia e aos problemas bancários enfrentados pela Espanha.

Dados mais recentes mostram que o crescimento do país está desacelerando, uma vez que as medidas de austeridade adotadas por toda a região restringem a demanda europeia por carros, maquinário e outros produtos de fabricação alemã. As vendas do varejo caíram em maio pelo segundo mês consecutivo, contrariando expectativas. "A economia alemã está nitidamente esfriando, e parece possível uma contração no segundo trimestre", diz Carsten Brzeski, economista para a Europa do ING Group de Bruxelas. Embora esteja em melhor situação que seus vizinhos, "em forte temporal, até o mais sólido navio pode virar".

Algumas grandes empresas já sentem o aperto. "Atingir metas no restante de 2012 vai ser um caminho acidentado", disse a analistas o diretor financeiro da Siemens, Joseph Kaeser. O Commerzbank, que precisou de ajuda do governo para sobreviver à crise de 2008, está fechando as divisões de financiamento de imóveis e navios. Em março, o banco ainda computava € 2,9 bilhões (US$ 3,6 bilhões) em empréstimos à Espanha.

Até o avanço de dois dígitos das exportações para a China caiu para 6%. Na China, "a desaceleração se concentrou nos investimentos e na indústria pesada", a especialidade da Alemanha, diz Andrew Batson, diretor de pesquisa em Pequim da consultoria GK Dragonomics. "Assim, faz sentido termos um desaquecimento das exportações da Alemanha para a China".

Países dependentes das encomendas da Alemanha também poderão enfrentar problemas. Andreas Rees, economista do Unicredit de Munique, diz que a Itália e a Espanha expandiram suas exportações para a Alemanha nos últimos trimestres. "Uma desaceleração alemã poderá levar Itália e Espanha a ter de se administrar sem esse estímulo ao crescimento", diz.

A Alemanha não está despencando de um penhasco. Após anos de altas salariais inferiores à inflação, os sindicatos conseguiram aumentos saudáveis no segundo trimestre, e o grau de confiança do consumidor está sólido. A economia do país poderá ainda crescer 1% este ano. Mas mesmo o alemão comum sente o peso psicológico da crise da dívida da zona do euro.

"Estou pessimista com relação ao futuro", diz Winfried Wettig, motorista de táxi em Frankfurt. "Ou passamos cheques para os países com problemas ou eles vêm abaixo, trazendo problemas para a nossa economia", afirma.

No momento em que Itália e Espanha se encaminham, ao que tudo indica, para pedir socorro financeiro, a capacidade financeira de obtenção de crédito alemão pode sair solapada quando o país tiver de financiar mais esse esforço de resgate, diz Jamie Stuttard, diretor de administração de carteira de bônus internacionais da Fidelity Investments de Londres.

O recente acordo firmado na reunião de cúpula de Bruxelas, de autorizar uma recapitalização direta dos bancos espanhóis pelos fundos de socorro financeiro da UE, poderá quebrar o círculo vicioso que prolongou a crise. Medidas que conduzem a uma união fiscal e bancária vão aliviar a pressão sobre os países com problemas de dívida e contribuir para o crescimento da zona do euro como um todo. Isso manteria a Alemanha numa condição mais saudável.