Título: Rigor nos julgamentos aumenta influência do TSE
Autor: Junqueira, Caio
Fonte: Valor Econômico, 28/09/2006, Política, p. A8

Com novas regras de campanha, maior rigor aos candidatos e imbuído na tarefa de coibir o caixa 2, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ampliou, neste ano, a sua influência sobre o processo eleitoral.

Os ministros do TSE mudaram drasticamente a postura adotada nas eleições passadas. Estão mais minuciosos, avaliam com rigor as prestações de contas, assistem por repetidas vezes as propagandas eleitorais suspeitas de irregularidades.

Até a eleição municipal de 2004, o TSE se notabilizou como um mero condutor do processo eleitoral. As maiores polêmicas em que o tribunal se envolvia diziam respeito à viabilidade do voto eletrônico e à possibilidade de os eleitores saberem o resultado das urnas menos de 24 horas depois do encerramento da votação. As perguntas mais freqüentes que os ministros respondiam eram sobre o andamento da votação: se as urnas funcionavam, em quais cidades o voto eletrônico teve de ser trocado, onde houve mais filas.

Agora, os ministros respondem a impugnações de candidatos, a proibições de novas formas campanhas, como o fim de showmícios e de brindes, e contabilizam dezenas de minutos retirados dos candidatos por irregularidades praticadas no horário eleitoral gratuito.

O rigor pode ser observado no placar parcial de julgamentos envolvendo a impugnação de candidaturas. Até a segunda-feira passada, o TSE julgou 489 recursos deste tipo. Ao todo, 333 candidaturas foram indeferidas contra apenas 156 que foram aceitas. Esse número é reflexo de uma nova postura da Justiça Eleitoral que, agora, avalia minuciosamente a viabilidade de cada um dos candidatos: se eles foram condenados criminalmente na Justiça, se prestaram contas de seus bens, se foram aprovados em convenções.

O caso mais emblemático dessa nova conduta foi o julgamento pelo TSE da candidatura a deputado federal do presidente do Vasco, Eurico Miranda. Os ministros se dividiram entre impedir Eurico de se candidatar pelo fato de ele responder a oito processos na Justiça, ou autorizar a candidatura porque nenhum desses processos teve sentença final. O julgamento demorou mais de um mês porque vários ministros pediram vista e foi decidido por um voto: três ministros queriam tirar Eurico da eleição por causa dos processos e da "vida pregressa" do candidato, quatro decidiram que ele pode ser candidato por ainda não ter sofrido uma sentença final.

O TSE ainda não conseguiu contabilizar o total de representações contra supostas irregularidades na propaganda eleitoral, pois o número cresce a cada hora. Mas, acredita-se que há mais de 200 ações pedindo direito de resposta, ou contestando a "invasão" de candidatos à Presidência no tempo destinado a governadores de estado, deputados e senadores.

Nas ações envolvendo direito de resposta, o TSE foi bastante rigoroso ao conceder ao PT o direito a se defender contra acusações na imprensa. Na noite da última terça-feira, o tribunal deu direito ao PT de responder à acusação de ter formado uma "quadrilha", publicada na coluna do jornalista Clóvis Rossi, da Folha de S.Paulo. Logo após julgar o caso de Rossi, os ministros concederam à campanha de Lula, quatro minutos para responder às acusações feitas pelo candidato tucano Geraldo Alckmin em programa na rádio CBN em que o presidente foi comparado a um "ladrão de carros" e seu governo a uma "organização criminosa". O que chamou a atenção nesses processos é que o TSE condenou, inclusive, a imprensa. Alckmin não sofreu qualquer punição por ter dito que o governo é uma "organização criminosa", mas a CBN perdeu tempo para seus programas.

Se ganhou contra a imprensa no TSE, a campanha de Lula está perdendo feio nos processos envolvendo irregularidades no horário eleitoral. Lula perdeu mais de 40 minutos de campanha por invadir o tempo dos candidatos petistas aos governos dos estados. Já Alckmin perdeu apenas dois minutos por usar fantoches num filme para ridicularizar o governo e os escândalos do mensalão e dos sanguessugas.

O presidente do TSE, ministro Marco Aurélio Mello, acredita que a campanha de Lula insistiu em irregularidades no horário eleitoral e, por isso, perdeu muito mais tempo do que o candidato tucano. Segundo o ministro, o TSE buscou manter o equilíbrio na disputa, mas constatou uma realidade: a invasão reiterada de Lula no tempo destinado a outros candidatos do PT. "Isso é muito triste", lamentou o ministro. "A partir do primeiro julgamento (a primeira decisão contra Lula) deveria ter havido o recuo. E o recuo é evidente quanto a essa prática, pois não se pode pegar carona em outros horários, principalmente aquele que ocupa o cargo maior do país e deve dar o exemplo."

Para o presidente do TSE, a campanha de Lula atuou como se não tivesse tomado conhecimento das decisões. "Faz de conta que estamos sentindo a repercussão das decisões do tribunal", ironizou. Marco Aurélio acredita que o tribunal evoluiu bastante nessas eleições ao derrubar, nessas eleições, a sua Súmula nº 1, que permitia a candidatura de políticos que tiveram as suas contas reprovadas. "Foi um avanço. Houve uma reinterpretação, uma releitura da Lei Complementar nº 64 (que trata dos casos de inelegibilidade)."