Título: Coordenadores de campanha saem atrás de convidados para trocar dinheiro por cheque
Autor: Junqueira, Caio
Fonte: Valor Econômico, 28/09/2006, Política, p. A8

Na entrada do salão de eventos do Crowne Plaza, hotel de luxo localizado em uma zona nobre de São Paulo, os convidados pagam em dinheiro os R$ 60 do convite no jantar de arrecadação de recursos para a campanha de um candidato a deputado federal. A fila logo emperra. Culpa de um não-convidado. "É melhor trocar tudo o que vocês receberam em dinheiro por cheque porque vocês podem ter problemas posteriores com a análise das contas", afirma uma das "observadoras" de eventos arrecadatórios do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo. Quase na seqüência, outra bronca. "Quanto custa o convite? Não é R$ 60? O que é aquele cheque de R$ 200?".

Esse tom mesclado entre o incisivo e o professoral é a tônica dessas inspeções dos observadores nesses eventos. Vêem as irregularidades, fazem anotações, tiram dúvidas e explicam a legislação, sempre sob o olhar dos coordenadores dos candidatos, que ouvem atentos e não escondem o incômodo e a insatisfação com a vistoria. "Você teve sorte de vir com os mais simpáticos deles. A maioria não é de muitos amigos", disse ao Valor um assessor do candidato.

Muito embora os candidatos sejam obrigados a informar ao TRE paulista todos os eventos e, assim, estarem cientes da possibilidade de seu comparecimento, não há local reservado para que eles possam trabalhar. O jeito é sentar nas mesas dos convidados-financiadores e ali mesmo fazer os questionamentos aos responsáveis pela campanha - com a insatisfação dos convidados. O incômodo causado pelos funcionários do tribunal paulista deve-se, em grande parte, ao fato de que esses jantares são, muitas vezes, usados para regularizar ingresso irregular de recursos na campanha.

Neste jantar, dada a irregularidade constatada logo no início - a circulação de dinheiro em espécie é vedada nessas eleições - a pedido dos observadores, assessores do candidato se apressam em regularizar a situação. A operação causa certo constrangimento, tendo em vista que eles saem pelo salão atrás daqueles que pagaram em dinheiro e solicitando que um cheque seja emitido. A mesma pressa não existe para responder ao questionário dos observadores, que tomam chá de cadeira à espera da advogada do candidato, enquanto ouvem um senador da República cantando "Blowin in the Wind".

A advogada chega e a observadora saca da pasta a portaria que a designa para a função. "Se tiver qualquer dúvida sobre o motivo de estarmos neste evento, aqui está a portaria que nos designou". Junto com o documento, vem uma papelada para as anotações. Antes, porém, entrega-lhe uma diligência na qual solicita informações de um evento realizado e não informado ao tribunal. A irregularidade foi descoberta com a ida a um jantar - devidamente informado - no Figueira Rubayat. Após o jantar, foram solicitadas à gráfica informações sobre convites. A resposta veio dupla: houve confecção de convites para este jantar e para um outro, não comunicado.

Enquanto questiona a advogada, outro observador circula pelo salão contando o número de mesas, garçons e convidados. O custo individual por pessoa é checado. Foi de R$ 48, valor abaixo do preço de mercado. "Vocês informem o preço de mercado e retifiquem esses R$ 48 na prestação", diz. Até mesmo a decoração das mesas entra no relatório. Segundo a advogada, foram 30 arranjos, com custo total de R$ 500. (CJ)