Título: Concessionárias pressionam por prorrogação e correm à Aneel
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Fonte: Valor Econômico, 10/07/2012, Empresas, p. B1

Dezenas de empresas do setor elétrico, incluindo todas as subsidiárias da Eletrobras, aumentaram a pressão para renovar suas concessões que expiram a partir de 2015. Diante do atraso do governo em resolver o assunto, elas entregaram à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) pedidos concretos de prorrogação, mesmo desconhecendo completamente as condições que lhe serão impostas. A maioria dos contratos termina na primeira semana de julho de 2015 e a legislação atual exige uma manifestação formal de interesse na prorrogação a 36 meses do vencimento.

"Queremos demonstrar claramente à agência o nosso interesse em renovar as concessões", disse ao Valor o presidente da Eletrobras, José da Costa Carvalho Neto, à frente de uma gigante estatal que tem 15 usinas e 11.696 megawatts (MW) de potência instalada vencendo daqui a três anos. "A solução, pelo que escutamos e conversamos, está muito próxima. Esperamos que ela saia neste terceiro trimestre, mas estamos preparados para qualquer cenário", completa o executivo.

A ansiedade em resolver essa pendência não é exclusividade dos peixes grandes. "Todas as nossas associadas estão protocolando pedidos", afirma Ricardo Martin, presidente da Associação Brasileira das Distribuidoras de Energia Elétrica de Menor Porte (Abrademp), que reúne 14 companhias do setor - a maioria na região Sul do país. Mesmo ignorando as condições de prorrogação dos contratos, Martin acredita que haverá poucas surpresas, para as distribuidoras. "A cada revisão tarifária da Aneel, as exigências já ficam cada vez maiores. Pode até piorar, no momento de renovar as concessões, mas dificilmente vai piorar tanto a ponto de nos fazer desistir", resume.

As concessionárias entregaram à agência reguladora um histórico detalhado dos investimentos realizados, a evolução do mercado durante todo o período de contrato e certidões negativas que demonstram a regularidade de suas operações. "No nosso caso, foram sete pastas cheias de arquivos", diz Antonio Gavazzoni, presidente da Celesc, distribuidora catarinense. O pedido foi encaminhado à Aneel no dia 29 de junho, mas o governador Raimundo Colombo (PSD) reforçará pessoalmente a manifestação, ainda neste mês. Gavazzoni afirma que, mesmo sem um anúncio oficial, já não passa pela cabeça de ninguém a possibilidade de relicitação das concessões. "Estamos absolutamente tranquilos."

A falta de uma decisão final do governo, no entanto, atrapalha muitas concessionárias na hora de formular planos e executar investimentos. Um dos momentos mais sensíveis é a obtenção de crédito. A Companhia Hidrelétrica São Patrício (Chesp), distribuidora que atende a 31 mil unidades consumidoras em nove municípios do interior de Goiás, tomou um financiamento de R$ 6 milhões no BNDES. O dinheiro foi repassado pela Caixa Econômica Federal, em 2009. Sem receita assegurada após o fim da concessão, as condições de pagamento mudaram. "Normalmente, o prazo é de dez anos, mas nos deram apenas até 2015. Isso afetou bastante o fluxo de caixa da empresa porque temos menos tempo para pagar", lamenta Ricardo Martin, que também preside a Chesp, além da Abrademp.

Sem acesso a financiamento de longo prazo nos bancos, a opção da distribuidora gaúcha Eletrocar foi recorrer aos recursos da Reserva Global de Reversão, um encargo setorial administrado pela Eletrobras. A empresa tomou R$ 30 milhões para construir uma nova linha de transmissão, de Tapera a Carazinho, para reforçar sua conexão com a rede básica do sistema elétrico.

"Estamos entre a cruz e a espada. Existe muita insegurança sobre a concessão, mas o consumidor não tem culpa e o investimento é necessário", afirma Albano Keyser Filho, presidente da Eletrocar, que atende a 34 mil unidades consumidoras e fatura R$ 70 milhões por ano. A concessionária tem observado um crescimento anual de 8% no consumo de energia, devido à chegada de indústrias à região, como a Nestlé. Keyser Filho admite, no entanto, que precisa selecionar os investimentos e "às vezes" deixa de lado o que não é essencial.

O executivo ilustra com duas experiências concretas. A frota de 50 veículos (carros e caminhões) para manutenção espera a prorrogação da concessão para ser substituída. E ele já foi obrigado a driblar pedidos de pecuaristas que queriam aumentar o gado leiteiro, mas precisavam aumentar a carga de energia para isso, o que exigia investimentos em novos transformadores.

Para Carvalho Neto, as empresas não devem temer a indefinição sobre as concessões para fazer seus investimentos. A Eletrobras não adiou investimentos, segundo ele. "Há segurança jurídica e regulatória. A lei garante que, se os investimentos não estiverem amortizados ao fim da concessão e ela não for prorrogada, há indenização a ser paga."

Mas o atraso do governo causa aflição em várias outras empresas, que não sabem como será feita a avaliação dos ativos não amortizados. É o caso da paranaense Copel. Além de toda a atividade de distribuição, a estatal tem 1.698 quilômetros de linhas de transmissão e hidrelétricas com a concessão expirando. A da usina Parigot de Souza, com 260 MW de potência instalada, vence em 2015. Mas a situação mais preocupante é a da hidrelétrica Foz do Areia, a maior da companhia, com 1.676 MW.

A concessão só vence em 2023, mas o impasse tem adiado um investimento de R$ 500 milhões em sua modernização. São quatro turbinas "no fim da vida útil", segundo o presidente da Copel, Lindolfo Zimmer. Sem um horizonte totalmente claro para a prorrogação, fica temerário desembolsar todo esse valor, diz o executivo. "Temos adotado medidas paliativas. Se tivéssemos essa garantia (da prorrogação), estaríamos estruturando uma solução definitiva", afirma. As quatro turbinas de Foz do Areia são do fim da década de 1970 e precisam ser trocadas. "Elas podem aguentar um pouco mais, mas os técnicos são claros: vai aumentando o risco de dano maior."

Fontes do setor comentam que a prorrogação das concessões pode abrir caminho, inclusive, para uma eventual tentativa da Eletrobras de oferecer ao mercado as distribuidoras federalizadas que controla nas regiões Norte e Nordeste - Amazonas Energia, Boa Vista, Ceal, Cepisa, Ceron e Eletroacre. Carvalho Neto coloca da seguinte forma: "Não temos orientação nenhuma de privatizar essas distribuidoras. A orientação é recuperá-las. Elas já estão melhorando suas contas e nossas projeções indicam que, até 2014, estarão equilibradas. E aí, obviamente, ficam mais apetitosas".