Título: DEM pode deixar de existir
Autor: Iunes, Ivan
Fonte: Correio Braziliense, 10/11/2010, Política, p. 5

Em busca da sobrevivência política, partido cogita a possibilidade de fundir-se ao PSDB ou ao PMDB, hipótese que converteria em aliado um opositor ferrenho ao governo Lula

Partidos que sofreram as maiores derrotas durante as eleições, DEM e PPS enfrentam um truncado jogo de alianças e acordos até o fim do ano para definir uma mudança de curso que recoloque as legendas em uma rota de sobrevivência política. Enquanto os sucessores do antigo PFL estudam a fusão com o PSDB e até um desembarque no PMDB ¿ o que jogaria a legenda na bancada governista ¿, os socialistas tentam se afastar da imagem conservadora dos atuais aliados para marchar rumo a uma oposição mais branda ao governo federal.

Depois de perder 22 cadeiras na Câmara e seis no Senado com o resultado do pleito de outubro, o DEM estuda se unir a outras siglas para manter parte do cacife político. Na oposição desde a primeira eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002, o partido viu a bancada se reduzir dramaticamente. Da quase uma centena de deputados federais eleitos em 1998, sobrarão apenas 43 a partir de 1º de fevereiro, data da posse dos novos parlamentares.

Diante dos números, os maiores expoentes da legenda estudam a fusão com PSDB ou PMDB. Na prática, isso significa dizer que a sigla poderia tomar um caminho insólito e apoiar o governo petista depois de fazer oposição ferrenha a Lula nos últimos oito anos.

O maior temor do DEM é que uma janela para a troca de partidos seja aprovada pelo Congresso e a bancada se reduza ainda mais com a migração de parlamentares para a base governista. ¿Estamos extremamente fragilizados. O prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, tem conversado com vários partidos, sempre com um cenário de fusão¿, revela o deputado federal Guilherme Campos (DEM-SP). De acordo com o parlamentar, o presidente do partido, deputado Rodrigo Maia (RJ), também tem participado dos encontros.

Ao negociar um desembarque na bancada governista, o DEM praticamente implodiria a oposição ao Palácio do Planalto durante o governo de Dilma Rousseff, já que o grupo ficaria reduzido a PSDB, PSol e PPS, que, juntos, detêm apenas 68 dos 513 assentos na Câmara dos Deputados. Por isso, os atuais partidos da bancada governista desconfiam das reais intenções da legenda. Entendem que a negociação aberta seria mais uma forma de pressionar o PSDB a garantir maior espaço nas composições estaduais e municipais. O maior interessado é justamente Kassab, que termina o mandato na Prefeitura de São Paulo em 2012 e almeja chegar ao Palácio dos Bandeirantes, que será ocupado por Geraldo Alckmin (PSDB) nos próximos quatro anos.

Musculatura Se o destino do DEM passa por São Paulo, o PPS tenta formar uma frente com partidos menores para tentar ganhar um mínimo de musculatura no Congresso. A legenda viu reduzir de 22 para 12 o número de deputados na Câmara e tem apenas Itamar Franco (PPS-MG) no Senado. O presidente do partido, Roberto Freire, analisa que o caráter conservador abraçado pelos aliados PSDB e DEM durante as eleições prejudicou em especial o partido, que pretende se inserir em um discurso de centro-esquerda. ¿Tivemos erros crassos na campanha que se encerrou, como fazer uma oposição que aplaudia o governo, sem citar a correção necessária de rumos, sem espírito crítico¿, critica Freire.

O partido se aproxima de grupos mais alinhados ao Planalto, como PV e PSol. O próprio Freire admite voltar à bancada governista, de onde saiu depois do escândalo do mensalão em 2005, desde que o Palácio do Planalto altere a atual política econômica.

De volta aos trabalhos » A Câmara iniciou ontem à noite a votação de medidas provisórias que trancam a pauta. Depois de mais de três meses sem deliberações, os deputados aprovaram a MP que prorroga até o fim de janeiro os contratos do Executivo. Também foi aprovada a medida provisória que altera o Fundo Especial para Calamidade Públicas e o Sistema Nacional de Defesa Civil, para dar mais agilidade às transferências de recursos governamentais em caso de desastres. O Senado também retomou a rotina de votações e, na noite de ontem, aprovou, em primeiro turno, a reforma do Código de Processo Penal. Entre as mudanças, está o fim da prisão especial para pessoas que tenham concluído o ensino superior. A matéria ainda será apreciada em segundo turno.

Disputa pela Presidência será quente

» Denise Rothenburg Fora do acordo entre PT e PMDB para que cada um presida a Câmara por dois anos, a disputa pela Presidência do Senado começa a ganhar fôlego. Nos bastidores, quem já ausculta os colegas sobre suas chances é o líder do PMDB, Renan Calheiros (AL). ¿É o nome mais forte¿, comentou o líder do PTB, Gim Argello (DF), com senadores de seu partido. Renan, entretanto, ainda não bateu o martelo porque deseja esperar decantar o processo entre as demais pré-candidaturas.

Dentro do PMDB, o principal adversário de Renan é o senador Edison Lobão (MA), amigo e leal escudeiro do atual presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). O grupo Sarney, entretanto, tem Lobão como nome certo para ocupar o Ministério de Minas e Energia, no caso de a presidente eleita, Dilma Rousseff, aceitar o retorno do ex-ministro à vaga que deixou em abril para concorrer à reeleição.

A volta de Lobão à pasta não seria a garantia de caminho livre para o retorno de Renan ao comando do Senado. Ali, em especial entre os novos parlamentares, que chegam com fôlego e vontade de acertar, há quem considere impossível a candidatura de Renan por causa do desgaste sofrido em 2007, quando o peemedebista escapou de um processo de perda de mandato (veja a memória). Um deles comentou nos bastidores que a volta de Renan seria ¿começar a legislatura com o pé errado¿.

Entre aqueles que observam o quadro a distância, esperando a hora de assumir o mandato, há quem diga que a candidatura de Renan ¿ ou mesmo a continuidade de Sarney ¿ seria a senha para que um grupo de novatos começasse a se reorganizar em torno de outro nome. Muitos consideram impossível Aécio Neves (PSDB-MG) querer enfrentar Sarney, dado os laços de amizade que os une em nome do falecido ex-presidente Tancredo Neves, avô de Aécio.

No entanto, há quem se recorde que foi uma briga entre PSDB e PFL ¿ os dois grandes partidos que apoiavam o governo Fernando Henrique Cardoso ¿ que fez encorpar a candidatura de Aécio à Presidência da Câmara para o biênio 2001/2002. Se ele tiver condições de voltar a esse quadro agora, não deixará passar a oportunidade. Aí, avaliam alguns, ganharia a imagem do Senado, com a renovação, mas perderia a presidente eleita, Dilma Rousseff. E essa derrota o governo não quer. Por isso, nos bastidores do Palácio do Planalto, muitos consideram que a eleição para presidente do Senado será muito mais intrincada do que a escolha do futuro presidente da Câmara.

MEMÓRIA A polêmica da pensão Em maio de 2007, a revista Veja denunciou que o senador Renan Calheiros (PMDB-AL), então presidente do Senado, teve despesas pessoais pagas por Cláudio Gontijo, funcionário da construtora Mendes Júnior. O dinheiro bancaria a pensão e o aluguel da jornalista Mônica Veloso, com quem o senador tem uma filha.

No Congresso, Renan diz que Cláudio é seu amigo, mas nega que tenha recebido recursos. Foi apenas o começo de um longo processo de desgaste em que o senador respondeu a quatro processos. Em setembro daquele ano, ele foi absolvido no plenário do primeiro caso ¿ o da pensão ¿ e os restantes terminaram arquivados no fim do ano. Desde então, Renan reconstruiu sua carreira política e sua vida familiar. Este ano, foi reeleito senador por Alagoas. (DR)