Título: Derrotado no Ceará, Tasso propõe refundação do PSDB
Autor: Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 28/09/2006, Política, p. A12

Aos 57 anos, ex-governador do Ceará por três mandatos e presidente nacional do PSDB, o senador Tasso Jereissati considera a atual eleição para o governo do Estado a "mais constrangedora" de sua vida. Qualquer que seja o vencedor, a vitória não poderá ser contabilizada por ele pela primeira vez em 20 anos, desde que seu primeiro governo deu início ao ciclo de gestões tucanas no Estado.

As pesquisas apontam a vitória de Cid Gomes (PSB), ex-prefeito de Sobral, no 1º turno. Embora tenha boa relação com Tasso, o candidato, irmão do ex-ministro Ciro Gomes, é aliado do PT e apóia a reeleição do presidente Lula. Tasso nega que apóie Cid e, ao menos formalmente, não pede votos para ele.

Uma reviravolta, com eventual vitória do governador Lúcio Alcântara (PSDB), só iria piorar o "constrangimento" de Tasso. O governador não aceitou disputar o Senado e decidiu concorrer à reeleição à revelia de Tasso. No início da campanha, Lúcio disse ter sido traído e Tasso respondeu acusando o governador de ter duas caras. Ambos romperam. Agora, o presidente do PSDB mostra cautela ao falar do ex-aliado. Deixa para depois das eleições declarações sobre o rompimento e eventuais providências partidárias contra o ex-aliado.

Valor: O senhor se sente derrotado nas eleições cearenses?

Tasso Jereissati: Essa foi a eleição mais constrangedora da minha vida. Eu sabia que, podia fazer o que quisesse, iria perder. Não podia dizer o que estava pensando nem sentindo. E tinha que ir para o palanque fazer propaganda para o Geraldo (Alckmin, candidato tucano a presidente), só falando o que achava pela metade. Derrotado não é bem a palavra para dizer o que sinto, mas, com certeza, não é vencedor. Mas há males que acabam sendo positivos. O PSDB do Ceará está passando por um processo de purificação. Durante a campanha, muitas lideranças formais dos municípios afastaram-se, porque o governador fez tudo para que essas pessoas se afastassem de mim. Muitas lideranças antigas, idealistas nos primeiros momentos, que estavam afastadas, voltaram animadas com a perspectiva de estarem em oposição a uma série de coisas erradas que estão acontecendo.

Valor: Que tipo de coisas?

Tasso: Quando um partido como o PSDB fica muito tempo no poder, ele é ocupado por gente oportunista e que não tem nada a ver com o projeto inicial, com o sonho que teve início em 1986. Os oportunistas são sempre mais rápidos, mais ágeis, e muitas vezes mais eficientes em agradar o poder.

Valor: O senhor diria que o governador é um desses oportunistas?

Tasso: Eu diria que o PSDB ficou muito cheio de oportunistas. E eu coloco minha parcela de culpa nisso. Estou dentro desse processo durante todos esses anos e não afastei, dei espaço, não me isento totalmente. Tenho certeza de que vou sair dessa campanha longe do poder, mas reconstruindo uma base nova para o partido muito forte e de muito mais qualidade. Está na hora do partido passar um período bom na oposição, para que possa aprender a ser partido sem as benesses do poder.

Valor: Se o governador perder a eleição, ele sai do partido?

Tasso: Não sei. Mas o partido, com certeza, sai renovado, com muito mais qualidade, com muita gente nova que está revoltada com os acontecimentos éticos do país, a falta de escrúpulos com que o PT está governando o país e fazendo política no Ceará, porque não esqueça que o Ceará tem o José Airton Cirilo, um dos homens mais importantes do esquema das sanguessugas, e o José Guimarães, o homem da cueca, que foi presidente do PT.

Valor: Quais os principais avanços desses 20 anos de governos tucanos?

Tasso: O Ceará mudou substancialmente. O Ceará de hoje, comparado ao de 86, é outro Estado. Desde o ponto de vista econômico, porque o Estado, nesse período, cresceu mais do que a média do país, se industrializou e tem uma das melhores infra-estruturas do Nordeste. No aspecto social, a redução da mortalidade infantil foi motivo de prêmio (concedido pelo Unicef, na gestão Ciro Gomes). Outra vitória foi na educação. Era um Estado de analfabetos, crianças fora da escola e hoje estão dentro da escola. Também mudou a mentalidade política, administrativa. Foi o primeiro Estado que fez equilíbrio fiscal e teve uma administração o mais possível profissionalizada, com menos de ingerência política.

Valor: Isso teve continuidade na gestão Lúcio Alcântara?

Tasso: O atual governo eu chamo nem de ruim nem de bom. É medíocre. Na área administrativa e na mentalidade houve retrocesso. Principalmente na mistura da política e da administração. A coisa se voltou à política atrasada de misturar interesses, clientelismo.

Valor: Independentemente de quem vencer, qual é o maior desafio do próximo governo cearense?

Tasso: São dois. Primeiro, na educação básica, fundamental, nosso desafio é qualidade. Nós temos todas as crianças na escola. Hoje eu não sei, mas eu deixei com 97%, 98% na escola. Mas com um problema enorme: a qualidade do ensino muito fraco. O segundo desafio é a formação de um ambiente inteiramente favorável a investimentos, o que inclui melhorar a infra-estrutura do Estado.

Valor: Se Cid Gomes for realmente eleito e pedir apoio do PSDB para governo, o senhor irá colaborar? Pode se aliar ao PT?

Tasso: Já fui cobrado por falar tanto em fidelidade partidária, mas ter votado no Ciro Gomes para presidente quando o PSDB tinha o José Serra. O meu grande projeto de vida política é o Estado Ceará. É um compromisso acima do meu partido. Aquilo que for bom para o Ceará, a gente pode ajudar. Cid fez um belo trabalho em Sobral, tem todas as condições de fazer um bom governo. Com apoio do Ciro, tem condições de conseguir quadros. Se ele vencer, evidentemente terá que dar espaço para o PT, mas espero tenha visão necessária para distinguir o que é bom para o Estado, independentemente de partido.

Valor: O senhor pensa em voltar ao governo?

Tasso: É um projeto descartado. Fui 12 anos de governo, não tenho mais entusiasmo. Para ser governador de um Estado como o Ceará precisa estar disposto a dizer muito não, comprar muita briga e enfrentar muita dificuldades. É um ciclo encerrado minha vida de governador. É bom para o Ceará também. Tem que aparecer gente que pegue esse bastão que renove, mude, melhore, atualize.