Título: Câmbio pode gerar onda protecionista
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Fonte: Correio Braziliense, 10/11/2010, Economia, p. 12

Aumenta a pressão por medidas contra práticas comerciais que desrespeitam as regras da OMC, como o dumping e o contrabando

A eventual falta de acordo em torno do problema cambial na reunião do G-20 (grupo das 20 maiores economias do mundo) na Coreia do Sul, esta semana, pode levar a uma ¿guerra comercial¿, com aumento de protecionismo em desrespeito às regras da Organização Mundial do Comércio (OMC). A avaliação foi feita pelo secretário de Comércio Exterior, Welber Barral, para quem a valorização do real frente ao dólar já tem provocado reclamações das empresas brasileiras, que querem a adoção de medidas de combate a práticas desleais, como o dumping (venda abaixo do preço de custo para afastar concorrentes) e o contrabando.

¿(A moeda valorizada) aumenta a pressão do setor privado em problemas que às vezes já existem¿, afirmou Barral à Reuters. ¿Alguns setores sofrem com o contrabando, por exemplo, e dão pouca atenção a isso. Na medida em que o câmbio se torna um problema, mais a questão do contrabando se torna central.¿ Até outubro, o país já deu início a 27 investigações de antidumping, mais do que as 19 de todo o ano passado.

Barral frisou que todas as medidas do governo em resposta a pedidos das empresas são tomadas de acordo com as regras da OMC. Seu temor é que o agravamento das distorções cambiais gere medidas protecionistas fora da legalidade em outros países, desencadeando uma onda de retaliações. ¿Nós temos adotado algumas medidas e aumentado outras no que diz respeito a produtos pontuais. O Brasil não adotou nem vai adotar medidas "across the board" (generalizadas)¿, disse.

Aelerado Os chefes de Estado e de governo dos países do G-20 debaterão, na quinta-feira e na sexta, na capital sul-coreana, possíveis soluções para os desequilíbrios causados pelo fato de o dólar e o iuan (divisa chinesa) estarem excessivamente desvalorizados. Esse cenário tem contribuído para acentuar tendência de apreciação de moedas de economias emergentes como o Brasil, que já tem atraído grandes fluxos de capital pelo fato de estarem crescendo em ritmo mais acelerado que a média das nações desenvolvidas.

O afrouxamento monetário adotado pelo Fed, com o anúncio de que o governo comprará mais US$ 600 bilhões em títulos públicos em poder dos bancos, aumentou preocupações com desvalorizações adicionais do dólar. ¿Nossas propostas, as propostas que o ministro Guido Mantega (Fazenda) está levando são compromissos multilaterais¿, disse Barral.

¿Se isso não for alcançado, existe o risco de que todos os países busquem soluções individuais, que podem ser custosas para todos. Isso pode envolver desde medidas cambiais para tentar proteger o nível razoável de câmbio até medidas comerciais.¿

Risco de bolhas As desvalorizações artificiais das moedas já constituem a prática de protecionismo disfarçado, que pode causar o recrudescimento da crise econômica global, disse ontem o ministro da Fazenda, Guido Mantega, pouco antes de embarcar para a reunião do G-20, em Seul, na Coreia do Sul. Ele vai assessorar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua sucessora, Dilma Rousseff, nos debates.

Segundo o ministro, o encontro de líderes será importante porque permitirá a discussão de um tema para o qual poucos países vêm alertando: o risco de a guerra cambial levar prejuízos graves ao comércio dos países emergentes e mesmo às bolsas de valores que operam com ações de empresas exportadoras de commodities (produtos básicos com cotação internacional).

Impulso ¿Existe uma tendência de grandes aplicações nesse tipo de investimento, o que pode gerar bolhas especulativas, levando uma economia à bancarrota¿, disse. Na visão do ministro, ao injetar US$ 600 bilhões no mercado, o governo dos Estados Unidos escancarou a guerra cambial. A medida deve desvalorizar ainda mais o dólar, dando um impulso adicional às exportações norte-americanas.

Mantega reiterou a posição brasileira contra qualquer medida protecionista, inclusive o enfraquecimento forçado do valor das moedas para estimular as vendas externas. Além disso, reafirmou que o governo continuará agindo para conter a especulação no país, a exemplo do que fez aumentando o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).

Dólar segue estável » VERA BATISTA

O dólar encerrou o pregão estável, cotado a R$ 1,699. Os investidores estão de olho na reunião do G-20, que acontece na quinta-feira e na sexta, em Seul, Coreia do Sul. ¿Alguns acham que o Banco Central vai impedir que o dólar continue caindo. Mas creio que o BC não vai se mexer por enquanto, a menos que o dólar chegue a R$ 1,65¿, disse Mário Paiva, da BGC Liquidez.

Segundo analistas, dois fatores interferiram no comportamento do câmbio: o anúncio de medidas para controle do fluxo de capitais feito pela China e a alta de 0,75% do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em outubro. Foi a maior alta da inflação desde fevereiro. Houve um momento de estresse devido a boatos, não confirmados, de que o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, estaria abandonando o cargo.

Bolsa cai 1,35% A Bolsa de Valores de São Paulo acompanhou o mau humor do mercado externo. Depois de iniciar o pregão em alta, o Ibovespa, principal índice negociado, fechou em baixa de 1,35%, aos 71.679 pontos. Do lado doméstico, o mercado acionário sofreu com a forte queda das ações do setor imobiliário e dos bancos e também com os boatos que correm em torno da formação de equipe da presidente eleita, Dilma Rousseff.