Título: BC espera crescimento menor, mas isenta política monetária
Autor: Salgadom, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 29/09/2006, Brasil, p. A3

O Banco Central reduziu as suas projeções para o crescimento da economia de 2006, de 4% para 3,5%, e também para a inflação do ano, de 3,8% para 3,4%. Ao apresentar os números, que fazem parte do relatório trimestral de inflação do BC de setembro, o diretor de Política Econômica da instituição, Afonso Bevilaqua, sustentou que a mudança no cenário nada tem a ver com um eventual excesso de dosagem na política monetária.

Segundo ele, a economia crescerá menos porque o desempenho no segundo trimestre foi abaixo do esperado tanto por analistas privados quanto pelo BC e outros economistas do governo. "Previsões de crescimento são muitos difíceis", sustentou. "O BC, e todo mundo, erra."

Bevilaqua disse que, no segundo trimestre, a economia cresceu apenas 0,5% em virtude de fatores pontuais, como a parada na produção nos dias de jogos do Brasil na Copa do Mundo, as paralisações na indústria petrolífera e a greve na Receita, que afetou as exportações. Uma evidência de que não foi a política monetária quem frustrou o PIB no ano, disse, é o fato de a economia ter se expandido 1,4% no primeiro trimestre. Ou seja, ela cresceu mais fortemente quando a política monetária era mais restritiva, e menos quando foi relaxada.

Em virtude dos fracos resultados do segundo trimestre, o BC reduziu de 3,6% para 3% a expectativa de crescimento agropecuário, e de 5,4% para 4% a projeção para a expansão da indústria. Sob a ótica da demanda, o investimento projetado também caiu, de 8,3% para 7,1%. No caso do consumo das famílias, manteve-se estável em 4,2%. "Caso se confirme a projeção, será o terceiro ano consecutivo em que o consumo apresenta crescimento", disse Bevilaqua. "A última vez que aconteceu algo semelhante foi em 1997, que encerrou um ciclo de cinco anos de crescimento."

As projeções de inflação melhoraram para 2006, mas se tornaram ligeiramente menos favoráveis para 2007. Os exercícios do BC mostram, ainda, que embora haja espaço para novos cortes na taxa básica, não seria possível a queda na intensidade esperada pelos analistas privados.

No chamado cenário básico, que assume a hipótese de que os juros ficarão estáveis nos atuais 14,25% ao ano e que o dólar ficará imóvel em R$ 2,15, a inflação projetada para 2006 está em 3,4% (era 3,8% em junho) e em 4,3% para 2007 (era 4,2%). No caso da inflação projetada para 2006, é possível que haja nova queda. Os exercícios matemáticos do BC foram feitos com base nas informações disponíveis na reunião do Copom de agosto, e por isso não incorporam, por exemplo, a inflação baixa daquele mês, de 0,05%.

Pelos projeções do relatório de inflação, tornou-se desprezível o risco de a inflação superar o teto de 6,5% admitido pelo sistema de metas. O objetivo para 2006 é de 4,5%, com intervalo de dois pontos percentuais para cima e para baixo. Mas há o risco de 20% de a inflação ficar abaixo do piso, de 2,5%.

A queda na projeção de inflação para 2006, explica Bevilaqua, deve-se a surpresas inflacionárias positivas, sobretudo ligadas aos preços dos alimentos. Segundo ele, tanto é verdade que houve surpresa inflacionária que os analistas reduziram suas projeções após a divulgação de cada índice mensal.

A política monetária, disse, foi o tempo todo calibrada para atingir o centro da meta, de 4,5%, mas isso não impede que eventos não esperados desviem o índice para cima ou para baixo. "É justamente para isso que existe o intervalo de tolerância", afirmou. O fato de a inflação projetada para 2007 (4,3%) estar um pouco abaixo da meta (4,5%) indica que há espaço para afrouxamentos adicionais na política monetária. Hoje, os juros estão sendo calibrados com vistas à meta de 2007, já que eventuais afrouxamentos na política monetária levam cerca de nove meses para atingir os índices de preços.

Piorou ligeiramente a projeção para 2007 em relação aos índices projetados em junho porque, de lá para cá, a taxa básica sofreu corte de um ponto percentual, o que mais do que compensou os efeitos positivos da inércia inflacionária deste ano para o próximo e da taxa de câmbio mais apreciada.

Mas os exercícios matemáticos do BC sugerem que não há espaço para que os cortes de juros ocorram na intensidade esperada pelo mercado financeiro, pelo menos no patamar de taxa de câmbio esperado pelos analistas. Os analistas projetam para o último trimestre de 2006 uma Selic média de 14,1% e um câmbio de R$ 2,18; para o último trimestre de 2007, Selic média de 12,88% e câmbio de R$ 2,29. Utilizando esses parâmetros, a inflação fecharia 2006 em 3,5% (abaixo da meta), mas ficaria em 5,2% em 2007 (acima da meta).