Título: EUA endurecem e vão à OMC contra subsídios da China
Autor: Balthazar, Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 05/02/2007, Internacional, p. A9

A decisão dos EUA de abrir um processo contra a China na Organização Mundial do Comércio (OMC) por causa dos subsídios que ela concede a suas indústrias deve ampliar nos próximos meses a pressão internacional sobre os chineses, reforçando os ataques que suas políticas de desenvolvimento têm sofrido em outras frentes.

A iniciativa também sugere uma mudança de tom na política americana em relação ao país, num momento em que a Casa Branca encontra dificuldades para conciliar seu desejo de um relacionamento mais profundo com os chineses e as fortes pressões de políticos e empresários para que jogue duro com eles.

A decisão de recorrer contra a China na OMC foi anunciada na sexta-feira pela representante comercial dos EUA, Susan Schwab. "Nossos esforços para dialogar fracassaram", disse Schwab. "Estamos procurando nivelar o terreno para que as indústrias americanas possam competir em condições equilibradas com as firmas chinesas."

Ontem o Ministério do Comércio da China divulgou um comunicado dizendo que lamenta a decisão americana e que considera fazer uma consulta a Washington para tratar do assunto.

Os EUA solicitaram à OMC a abertura de um processo de consultas para discutir os subsídios da China. De acordo com as regras da organização, uma investigação aprofundada sobre o problema será iniciada após dois meses se americanos e chineses não entrarem num acordo. A disputa pode se arrastar por meses.

Os americanos acusam a China de oferecer benefícios tributários e outros subsídios que ajudam as empresas instaladas no país a se tornar mais competitivas no mercado internacional. Os EUA também reclamam que os subsídios chineses incentivam essas empresas a adquirir máquinas e equipamentos feitos na China, em detrimento de produtos americanos similares.

Muitas das empresas que usufruem desses benefícios são filiais de multinacionais americanas e empresas que elas criaram com parceiros chineses. Mas entre os perdedores estão milhares de empresas americanas de porte menor que não têm tanta facilidade para transferir suas fábricas de um canto para o outro do globo e por isso sofrem mais na competição com a China.

De janeiro a novembro do ano passado, os EUA acumularam um déficit de US$ 213 bilhões em suas transações comerciais com a China. O desequilíbrio crescente nessa relação é fonte de grande insegurança em algumas indústrias e tem alimentado os instintos protecionistas dos políticos, especialmente depois que o Partido Democrata assumiu o poder no Congresso.

A iniciativa da Casa Branca foi aplaudida por associações empresariais e pelas principais lideranças dos democratas, que fazem oposição ao governo no Congresso. Ela poderá ajudar a atenuar a resistência que os congressistas impõem ao desejo do presidente George W. Bush de renovar a autorização legislativa que lhe dá poderes especiais para negociar acordos comerciais, que vence no fim do semestre.

Além disso, a disputa na OMC pode evitar medidas drásticas que os democratas defenderam no passado, como a aplicação de uma tarifa indiscriminada contra os produtos chineses. "Uma ação unilateral do Congresso transformaria os chineses em párias e seria desastrosa", disse ao Valor Daniel Ikenson, especialista em comércio do Instituto Cato, um centro de estudos.

Não é a primeira vez que os EUA vão à OMC contra a política comercial chinesa. Uma queixa contra benefícios da indústria de semicondutores foi retirada após um acordo. Outra, contra barreiras que prejudicam a entrada de autopeças estrangeiras no país, ainda está em debate na OMC. Os americanos pressionam a China a eliminar seus subsídios desde que o país ingressou na OMC, há cinco anos.

Em 2006, por iniciativa do secretário do Tesouro, Henry Paulson, os EUA criaram um mecanismo de diálogo bilateral para tentar resolver de um jeito mais suave suas diferenças com os chineses. O resultado até agora foi nenhum. A China se recusa a mudar sua política cambial, criou novas restrições para os investidores estrangeiros e pôs o pé no freio no processo de abertura do setor financeiro que iniciou após sua entrada na OMC.