Título: Bancada Empresarial cresce na Câmara
Autor: Felício, César
Fonte: Valor Econômico, 05/02/2007, Especial, p. A12

O poder econômico está mais presente na Câmara dos Deputados empossada nesta quinta-feira do que nos últimos quatro anos. O número de deputados que possuem propriedade rural em produção ou participação societária em empresas aumentou de 145 para 170, em relação à legislatura passada . São agora um em cada três. O levantamento do Valorconsiderou a declaração patrimonial feita pelos candidatos ao TSE e a auto-definição profissional dos que concorreram. Foram desconsideradas as participações em empresas de consultoria e a propriedade de terra nua.

As consequências deste aumento são claras. Segundo o consultor do DIAP, Antonio Augusto de Queiroz, que divulgou logo após a eleição o levantamento "Radiografia do Novo Congresso", tomando como base a declaração de profissão dos parlamentares e chegando a conclusões análogas, deverá haver uma maior pressão no Legislativo em favor da agenda patronal.

É exatamente o que pretende fazer, por exemplo, o deputado Walter Ihoshi (PFL-SP), que estréia em mandatos eletivos. Ihoshi é dono da Shizen, uma indústria que produz tinturas capilares. "Pretendo entrar no debate da reforma trabalhista, da tributária e da previdência", sintetizou, ao ser indagado sobre seus planos. O pefelista atua no sindicato da indústria de cosméticos e perfumaria do Estado e é um dos dois deputados eleitos ligados à Associação Comercial de São Paulo. O outro é o vice-prefeito de Campinas e comerciante varejista Guilherme Campos, também do PFL.

As razões para o aumento da bancada empresarial são díficeis de definir. A sucessão de escândalos que abalou a Legislatura passada, afetando a reeleição de muitos parlamentares listados como sanguessugas e mensaleiros, pode ter colaborado para o aumento de deputados com atividade empresarial. "Houve uma retração de outros grupos que atuam na mesma faixa partidária, como o dos evangélicos, por exemplo, e isto abriu espaço para a bancada empresarial", comentou Queiroz.

Como a de outros deputados, a eleição de Ihoshi é fruto de uma conjunção de fatores fortuitos. O empresário tentou um mandato eletivo pela primeira vez em 2002. Teve 45 mil votos e perdeu a eleição para deputado estadual. No ano passado, sua votação subiu para 101 mil votos. No intervalo de tempo, Ihoshi recebeu um impulso do hoje governador paulista José Serra (PSDB), que o nomeou para subprefeitura do bairro do Jabaquara, na capital paulistana, em 2003 e herdou os votos da colônia nipônica, um feudo vago com a morte do deputado tucano Paulo Kobayashi, em 2005.

O levantamento do Valor dividiu os congressistas por ramo de atividade. No caso de 14 deputados-empresários, não foi possível identificar a atividade da empresa pela declaração feita. Os parlamentares com várias empresas ou fazendas foram enquadrados pelo que representa maior valor patrimonial. O deputado Camilo Cola (PMDB-ES), que aos 83 anos conseguiu o seu primeiro mandato, possui uma mineração de mármore e diversas fazendas, mas seu principal bem é a transportadora Itapemirim. Não se enquadra na definição de produtor rural. É um dos quatro investidores na área de transportes que conseguiram um mandato na Câmara. De todos os empresários eleitos, o capixaba é o que tem o maior patrimônio declarado na Justiça Eleitoral: R$ 259 milhões.

Presentes nas declarações patrimoniais de diversos parlamentares, emissoras de rádio ou televisão dificilmente surgem como a principal atividade empresarial declarada. São oito os deputados nesta situação, a maior parte no Nordeste e vinculados a antigas oligarquias regionais.É o caso de Albano Franco (PSDB-SE), com a TV Sergipe e dos reeleitos Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), líder do partido e cotista da TV Cabugi; e Sarney Filho (PV-MA), com ações na TV Mirante.

Os produtores rurais são o núcleo mais expressivo entre os deputados e empresários, mas não cresceram entre uma eleição e outra. Em 2002, 49 dos 513 eleitos conseguiam a maior fatia de seus rendimentos da atividade rural. No ano passado, este total oscilou para 48. De longe, a pecuária predomina. Responde por 33 dos casos. Do grupo de novatos , o nome mais expressivo é o de Homero Pereira (MT), que se declara pecuarista e foi presidente da Federação da Agricultura do Estado. Acompanhou o governador Blairo Maggi na transição do PPS para o PR.

A atividade industrial tem presença tímida como área de interesse dos deputados eleitos . Entre os 22 proprietários de estabelecimentos fabris, nove são de agroindústria, entre eles o Frigorífico Argus, de Luiz Carlos Setim (PFL-PR). Um pouco mais distante do agronegócio, mas indiretamente relacionados, estão os novatos Mauro Mariani (PMDB-SC), da indústria madeireira e o paranaense Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), família controladora Nutrimental, produtora de barra de cereais Nutry.

O maior crescimento eleitoral ocorreu no setor de serviços, onde o total de dublês de deputados e empresários passou de 46 para 60 entre as duas últimas eleições. Os donos de hospitais e clínicas representam o segmento mais expressivo. Há doze deputados que têm na saúde seu maior negócio. Entre eles o sergipano Eduardo Amorim (PSC), um dos deputados proporcionalmente mais bem votados no País, com 11,46% dos votos. No setor dos empresários da educação, houve um enfraquecimento, com a saída de parlamentares como Paulo Lima (PMDB-SP) e Júlio Lopes (PP-RJ). Há agora seis parlamentares que declararam investimentos expressivos no setor. O único novo é o Bispo Rodovalho (PFL-DF), que deve seu mandato entretanto graças à sua atuação à frente da Igreja Sara Nossa Terra.

Entre os 26 deputados donos de estabelecimentos comerciais, o leque de atividades é pouco variado. Predomina a venda de combustíveis e a revenda de carros, caminhões e motocicletas. No primeiro grupo, estão oito parlamentares, entre eles o atual presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP). Na revenda automotiva, estão nove parlamentares, sendo apenas dois estreantes na Câmara: Aline Corrêa (PP-SP), filha do deputado cassado Pedro Corrêa-que só conseguiu eleger-se em São Paulo na sobra de quociente eleitoral de Paulo Maluf (PP-SP)- e João Oliveira (PFL-TO).

Só o Paraná e Tocantins são Estados em que a maioria absoluta dos deputados é formada por empresários. Em termos absolutos, o maior contingente é de Minas Gerais, onde 26 dos 53 parlamentares têm atividades empresariais, entre eles donos de construtoras, como Ciro Pedrosa, Alexandre Silveira e José Fernando de Oliveira, todos do PV. Amazonas, Amapá, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro são os que possuem proporcionalmente o menor número de deputados com poder econômico. Entre os poucos que conseguiram se eleger, está Rebecca Garcia (PP-AM), filha do industrial Francisco Garcia, que assumiu o patrimônio eleitoral do pai.

Dos grandes partidos, o PFL é o com maior contingente empresarial . Tomando como base a bancada eleita pelo partido, 39 dos seus 65 eleitos são pessoas de negócio, ou 60% do total. As transformações passadas pelo PT nos últimos anos alteraram pouco o perfil de sua bancada. Os sindicalistas ainda predominam e o número de deputados com alguma atividade empresarial é residual: foram apenas quatro dos 81 eleitos, sendo que somente um é um empresário com patrimônio de porte: o advogado e deputado Juvenil Alves (MG), acusado de fraude contra a receita federal por meio de seu escritório de planejamento tributário e de crime eleitoral, dono de uma fazenda onde cria gado bovino e equino de seleção. Entre os pequenos partidos mais expressivos, PC do B e P-SOL são os únicos que não elegeram nenhum empresário.