Título: Imprecisão do PIB chinês é desafio para investidores
Autor: Roberts , Dexter
Fonte: Valor Econômico, 18/07/2012, Internacional, p. A9

Os números que entram no cálculo do PIB da China são "artificiais" e servem "apenas de referência", alertou o político chinês Li Keqiang em 2007. Os comentários do então presidente regional do Partido Comunista, que deverá ser nomeado primeiro-ministro no segundo trimestre de 2013, foram revelados em um telegrama diplomático divulgado pelo site WikiLeaks no fim de 2010. As observações de Li são particularmente relevantes agora que as autoridades chinesas anunciaram que o PIB cresceu 7,6% no segundo trimestre, o menor número em três anos.

Mas exatamente quanto menor? Investidores, banqueiros e economistas têm muitas dificuldades para interpretar os números da agência de estatísticas da China. Combine todos os números dos PIBs regionais anunciados oficialmente para o ano passado e você terá um total que supera o PIB nacional em cerca de 10%, afirmou em fevereiro Ma Jiantang, presidente da Agência Nacional de Estatísticas. Ma disse que isso se deve em parte à contagem dupla de atividades como a produção industrial, e que sua agência estava tentando resolver o problema.

O fato de a taxa registrada de desemprego urbano da China pouco ter mudado, movendo-se entre apenas 4% e 4,3% na última década, é difícil de ser explicado pelas autoridades. Outra coisa desconcertante: por que o crescimento do consumo de eletricidade diminuiu muito mais rapidamente que o crescimento oficial do PIB (recuando para uma expansão de aproximadamente 4% em junho, segundo a imprensa chinesa), quando normalmente eles caminham mais ou menos juntos?

Isso está levando alguns analistas a considerar que os números do PIB podem estar sendo distorcidos para cima no período que antecede uma transição na liderança no quarto trimestre. "Da caixa preta vem um número e esse número nem sempre está alinhado com os outros números", diz Andrew Batson, diretor de análises macroeconômicas da consultoria GK Dragonomics em Pequim. "Eu não ficaria surpreso se os números do PIB deste ano forem suavizados."

Um legado da economia planejada é que os burocratas recebem metas do governo central para tudo, da produção de aço às safras e aos PIBs locais. Essas mesmas autoridades tradicionalmente vêm se promovendo sobre o sucesso no cumprimento dos números. "Temos um ditado na China que diz: os quadros [do Partido] produzem os dados e os dados produzem os quadros", diz Jin Yongjin, professor de estatísticas da Universidade Renmin.

Há algumas partes da economia que o governo consegue mensurar muito bem, diz Louis Kuijs, economista do Fung Global Institute, um centro de estudos de Hong Kong. A produção industrial e os lucros são considerados relativamente precisos, afirma ele. Esses números se beneficiam de um sistema nacional de informes corporativos instituído décadas atrás para ajudar os planejadores centrais a pilotar a economia. "No velho sistema era crucial ter esse sistema de informes funcionando", diz Kuijs. "Os levantamentos sobre a produção industrial da China estão nos dando números muito bons."

O sistema estatístico do país é bem menos capaz de medir o segmento de serviços da economia ou obter uma leitura precisa do consumo pela classe média. "Se você olhar para os números da produção automobilística da China, provavelmente terá um número mais ou menos preciso", afirma Stephen Green, diretor regional de análises do Standard Chartered para a Grande China. "Mas o sistema não é bom para medir quantas noites as pessoas saem de casa para jantar em restaurantes ou frequentar karaokês."

Medir as vendas no varejo é algo mais orientado para a contagem das compras feitas pelos departamentos do governo e grandes empreendimentos estatais, acrescenta Green. Isso pode explicar por que as vendas no varejo não caem durante as retrações econômicas: as entidades estatais recebem ordens para continuar comprando mesmo quando o consumo individual provavelmente caiu.

Os bancos de investimentos estão à procura do indicador que vai prever um ponto de virada da economia. O Standard Chartered olhou para as vendas dos equipamentos de terraplenagem antes de decidir que ele é um indicador atrasado, e não um indicador antecedente. Os empréstimos bancários, assim como o consumo de eletricidade e o volume de carga transportado pelas ferrovias, todos citados por Li Keqiang como mais confiáveis que os números do PIB, ainda são um bom substituto para a atividade econômica, diz Green.

A corretora UBS Securities consultou informalmente incorporadores locais para obter uma tendência para o setor imobiliário. Talvez o esforço mais ambicioso seja o recentemente lançado Livro Bege da China, uma pesquisa trimestral com cerca de 2.000 banqueiros e executivos de companhias, modelado no Livro Bege do Federal Reserve (o BC dos Estados Unidos). Ele mede o crescimento em oito setores importantes das maiores regiões da China, segundo Leland Miller, presidente da CBB Internacional, que publica a pesquisa.

Os planejadores econômicos chineses estão tentando resolver as deficiências estatísticas do governo. Mais dados são hoje reportados diretamente a Pequim, quando antes eram primeiro filtrados nos escritórios locais do Partido Comunista. A agência de estatísticas passou a padronizar a coleta de dados pelos muitos ministérios e associações industriais da China. E ela está trabalhando com a Organização das Nações Unidas (ONU), o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) para melhorar seu monitoramento da economia.

A China ainda tende a tratar a coleta de dados como um segredo de Estado, afirma Anne Stevenson-Yang, cofundadora da consultoria J. Capital Research, de Pequim. Ela cita a recusa do governo em divulgar o peso dos bens monitorados em sua compilação do índice de preços ao consumidor. "Por que você iria levantar a tampa e mostrar às pessoas como faz? Isso apenas reduz sua capacidade de mudar os números se isso for preciso", diz ela.