Título: Multa livra BofA de ação por lavagem de dinheiro do Brasil
Autor: Balthazar, Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 29/09/2006, Finanças, p. C3

O Bank of America aceitou pagar nesta semana uma multa de US$ 7,5 milhões para se livrar de um processo criminal nos Estados Unidos, ao final de uma investigação de quase três anos sobre seu envolvimento com um esquema de lavagem de dinheiro que movimentou bilhões de dólares com origem no Brasil.

O caso diz respeito às atividades de uma agência do banco em Nova York e não tem nenhuma relação direta com os negócios do BofA no Brasil. A instituição americana se tornou recentemente sócia do Itaú, numa transação que transferiu para o controle do banco brasileiro as operações do BankBoston no Brasil, no Chile e no Uruguai.

De acordo com um comunicado divulgado quarta-feira pelo promotor distrital de Nova York, Robert Morgenthau, que chefia as investigações, uma empresa sediada no Uruguai movimentou mais de US$ 3 bilhões de empresas e indivíduos brasileiros numa conta do BofA, entre maio de 2002 e abril de 2004.

A origem do dinheiro eram empresas de fachada abertas por doleiros brasileiros no Panamá e nas Ilhas Virgens Britânicas. Morgenthau anunciou que 34 indivíduos e 16 empresas envolvidas com o esquema foram indiciadas e agora serão alvo de uma ação civil nos EUA. Os 34 já estão sendo processados criminalmente no Brasil.

"Os bancos e as demais instituições financeiras deveriam ser nossa primeira linha de defesa contra a entrada de dinheiro ilegal no sistema bancário", afirmou Morgenthau. "[Precisamos] assegurar que as instituições financeiras conheçam os clientes com os quais fazem negócios e avaliem adequadamente os riscos associados a esses clientes."

Conforme o promotor, durante as investigações o BofA reconheceu falhas em sistemas de controle interno que deveriam ter detectado a origem suspeita dos recursos movimentados. O banco também aceitou tomar medidas para aperfeiçoar esses sistemas e seguir as recomendações das agências que fiscalizam o sistema financeiro nos EUA.

Numa declaração distribuída por sua assessoria, o BofA diz que cooperou com as investigações desde o início. "O Bank of America nunca faz conscientemente negócios com pessoas, organizações ou empresas envolvidas em atividades ilegais e não o fez neste caso", afirma a instituição. "Nos esforçamos o tempo todo para assegurar que nossos sistemas não sejam usados para propósitos ilegítimos."

O BofA foi apanhado numa teia que vem sendo armada com paciência há vários anos por investigadores americanos e brasileiros. Eles conseguiram rastrear dezenas de bilhões de dólares transferidos ilegalmente do Brasil para o exterior com ajuda de bancos, firmas criadas em paraísos fiscais e mecanismos informais controlados por doleiros.

Nos cálculos do procurador da República Vladimir Aras, um dos envolvidos com as investigações no Brasil, pelo menos US$ 24 bilhões saíram irregularmente do país desde 1997. A equipe do promotor Morgenthau rastreou US$ 19 bilhões movimentados por doleiros brasileiros nos Estados Unidos até agora. Embora muitos clientes desses doleiros e vários bancos que trabalharam com eles no Brasil estejam sob investigação, a maior dificuldade das autoridades tem sido identificar os donos do dinheiro. "Não temos nenhuma maneira de determinar a origem da maior parte desses recursos ou a identidade dos recipientes", afirmou Morgenthau.

Acordos semelhantes ao que o Bank of America fechou com a promotoria foram aceitos antes por duas instituições menores envolvidas com o esquema de lavagem de dinheiro, o Hudson United e o Israel Discount Bank. No Brasil, somente um grupo de executivos do antigo Banco do Estado do Paraná (Banestado) foi processado judicialmente.

O Banestado foi adquirido mais tarde pelo Itaú, que colaborou ativamente com as investigações. O banco chegou a contratar um escritório de advocacia em Nova York para apressar a transferência de provas recolhidas pela equipe de Morgenthau aos procuradores brasileiros.