Título: Pancada com efeito mínimo
Autor: Caprioli, Gabriel
Fonte: Correio Braziliense, 20/10/2010, Economia, p. 12

Permitida pelas regras em vigor, a apresentação de garantia por meio de fiança bancária deve diminuir o impacto da elevação do IOF sobre as transações nos segmentos futuros »

O aumento da carga de tributos sobre as operações financeiras no mercado futuro terá um efeito mais tímido do que o projetado pela equipe do ministro da Fazenda, Guido Mantega, mesmo com a pancada de 6% do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) incidente, desde ontem, sobre as garantias exigidas dos investidores em contratos derivativos de câmbio. Nessas negociações, apostas na variação do dólar para obter lucro, a alíquota subiu de 0,38% para 6%. Mesmo que influencie a cotação da moeda norte-americana durante algum tempo, a expectativa dos analistas é de que a tendência de desvalorização da divisa permanecerá.

A medida só ataca uma das formas possíveis de garantia para as transações futuras, quando o investidor traz recursos do exterior e os utiliza diretamente como seguro para a operação. Outras maneiras de atender a exigência da Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F) são a apresentação de títulos do Tesouro Nacional, ações ou fianças bancárias. Nas duas primeiras, o estrangeiro será tributado pelo IOF em 6% e 2%, respectivamente. Para as fianças, no entanto, não há nenhuma tributação, porque o instrumento não é considerado, legalmente, uma transação financeira.

¿A regulamentação fica prejudicada, porque permanece essa janela e possivelmente é por ela que o fluxo de capitais vai aumentar¿, afirmou o diretor executivo da NGO Corretora de Câmbio, Sidnei Nehme. Para ele, as taxas de juros futuras sofreram alguma pressão logo após o anúncio da medida, mas, diante da identificação das lacunas existentes, devem rapidamente voltar ao normal.

O estrategista-chefe do Banco WestLB, Roberto Padovani, concorda que os investidores se adaptarão. ¿O fato é que os agentes econômicos respondem aos estímulos e não às restrições legais. O que quero dizer, elegantemente, é que vão arrumar uma forma. Como água na natureza, vão achar uma brecha¿, comparou. Apesar da determinação de regular as operações no mercado futuro, os efeitos reais do aumento na tributação das garantias devem evidenciar o pouco controle que o Ministério da Fazenda tem sobre esses negócios.

¿O que ficou evidente agora, é que o governo não tem esse segmento nas mãos¿, afirmou Nehme.

Renda fixa Se ainda há dúvidas em relação aos derivativos, os analistas começam a considerar que a tributação de 6% sobre os títulos de renda fixa vai atender, em alguma medida, a intenção do governo de suavizar a queda do dólar. ¿Já tivemos esse impacto hoje (ontem) e, ao longo do tempo, vamos ver o IOF barrando principalmente o investimento de curto prazo, que não serve para nada, a não ser criar distorções e financiar o capital de giro do governo¿, considerou o gerente de câmbio da Fair Corretora, Mário Batisttel. Ele acredita que investimentos de curtíssimo prazo (30 dias, por exemplo) sofrerão impacto imediato.

Para fechar a janela dos investimentos especulativos, a tarifa poderia ser um pouco mais alta (7%), segundo Nehme. ¿Isso tornaria menos vantajosas as aplicações de menos de 270 dias, que aproximariam a nossa rentabilidade dos padrões internacionais, regulando um pouco o capital que chega¿, calculou.

Ajuste sério A eficácia dos instrumentos adotados pelo governo tende a continuar sendo mínima, enquanto não houver um ajuste sério nas contas públicas, segundo o estrategista do WestLB, Roberto Padovani. ¿O que me espanta é a equipe econômica continuar sendo movida por essas medidas de curto prazo¿, destacou. Para ele, a gastança continuará obrigando o Banco Central a subir juros para controlar a inflação, requerendo mais financiamento das despesas via aumento da dívida pública. Tudo isso atrai mais dólares para o país.

RECEITAS RECORDES A Receita Federal espera que a elevação da cobrança do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) barre a enxurrada de dólares que tem invadido o mercado brasileiro. Ao anunciar 12 meses de crescimentos mensais sucessivos no recolhimento de tributos e impostos federais, o subsecretário de Tributação e Contencioso do órgão, Sandro Serpa, destacou que a ampliação da alíquota não tem viés arrecadatório. ¿Pelo contrário. Se o decreto for totalmente eficaz, não vamos arrecadar nada¿, assegurou.

Há menos de 15 dias, quando o IOF sobre renda fixa foi elevado de 2% para 4%, a estimativa do Fisco, na hipótese de o fluxo de capitais se manter o mesmo, era de arrecadar R$ 125 milhões mensais somente sobre a diferença (os 2 pontos percentuais adicionais). Para a tarifa de 6%, não houve uma nova projeção. Segundo Serpa, não é possível crer que o valor simplesmente dobre. ¿Como a cobrança foi acrescida para 6%, é mais difícil crer que os fluxos não serão diminuídos¿, justificou.

O impacto real dos dois aumentos recentes do IOF ainda não foi aferido pela Receita. Mas, entre janeiro e setembro, o imposto rendeu aos cofres do governo mais de R$ 19 bilhões, numa alta de 35,06% sobre o mesmo período de 2009. Como a cobrança só começou a ser feita a partir de outubro do ano passado, o resultado percentual fica diretamente influenciado pela base comparativa.

O avanço contribuiu com o aumento real (descontada a inflação) de 13,12% da arrecadação total do governo. Nos primeiros nove meses do ano, o leão abocanhou R$ 573,604 bilhões das pessoas físicas e empresas brasileiras. Somente no mês passado, o recolhimento cresceu 17,68% na comparação com setembro de 2009, alcançando a soma de R$ 63,419 bilhões.

De acordo com Serpa, o desempenho continua impulsionado por três indicadores: aumento da produção e lucro das empresas, consumo aquecido e incremento da massa salarial e do rendimento dos trabalhadores. (GC)

CHINA AUMENTA TAXA DE JUROS Pequim ¿ O Banco Central da China surpreendeu ontem com a primeira elevação dos juros em quase três anos, desde 2007, uma medida que reflete a preocupação com a alta dos preços de ativos e a inflação persistente no país. O BC disse que elevará a taxa básica de depósito e de empréstimos de um ano em 0,25 ponto percentual cada, para, respectivamente, 2,5% e 5,56%.

¿A alta da taxa de juro foi totalmente fora das expectativas do mercado¿, disse Zhu Jiangfang, economista-chefe da Citic Securities, em Pequim. ¿O aumento recente da inflação deixou o juro real em território negativo. E eu acho que essa é a razão pela qual o Banco Central precisa elevar taxas de juros de forma tão precipitada¿, disse ele.

Vários economistas, incluindo alguns conselheiros do BC chinês, sugeriram que a autoridade monetária elevasse os juros para manter os rendimentos em território positivo. Na China, a inflação anual ao consumidor foi de 3,5% em agosto ¿ analistas esperam uma aceleração para 3,6% em setembro.

Ainda assim, a alta é surpreendente porque vários dos principais líderes haviam expressado confiança sobre o controle da inflação, dizendo que juros mais elevados poderiam atrair capital especulativo do exterior. Isso poderia ajudar o iuan a se valorizar, caso o governo deixasse a moeda flutuar livremente, como pedem os países ocidentais.

¿Eles fizeram isso agora porque os dados do Produto Interno Bruto (PIB) e da inflação são muito fortes¿, disse Dariusz Kowalczyk, economista sênior do Credit Agricole CIB, em Hong Kong. Amanhã, o governo chinês divulga o PIB do terceiro trimestre e uma série de dados econômicos de setembro. Economistas consultados pela agência de notícias Reuters preveem que o crescimento chinês tenha desacelerado para 9,5% na comparação anual, menos do que a expansão de 10,3% entre abril e junho.