Título: Mello elogia efeitos da reforma eleitoral
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 02/10/2006, Política, p. A20

A minirreforma eleitoral contribuiu para um dos processos de votação mais pacíficos da história do Brasil. A conclusão é do presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Marco Aurélio Mello. Segundo ele, as proibições de showmícios e de distribuição de brindes ajudaram a pacificar a campanha, reduziram conflitos e resultaram, ontem, numa votação tranqüila. "Podemos dizer que a reforma implicou uma pacificação da disputa eleitoral", afirmou Mello. "O ambiente foi de paz, de festa cívica, e não conflituoso."

O ministro diz que a minirreforma favoreceu também uma análise mais minuciosa dos candidatos. "A escolha foi mais fácil e mais fidedigna porque, em termos da disciplina das eleições, tivemos a ênfase no perfil do candidato, colocando em segundo plano o aspecto formal, mediante a proibição de showmícios, de outdoors, da poluição ambiental que era notada em diversas cidades do país."

O presidente do TSE destacou que as forças federais requisitadas para atuar em cidades de risco ficaram "estacionadas". "Não tivemos qualquer incidente a exigir a intervenção dessas forças."

Por outro lado, o TSE contabilizou 540 prisões durante a votação. Na noite de ontem, o tribunal ainda não sabia o motivo exato de cada detenção, mas estimava que grande parte ocorreu devido à realização de boca-de-urna, prática vedada desde as eleições de 1994.

O Espírito Santo foi o estado que mais contribuiu para este índice negativo, com 304 prisões. Em seguida, aparecem o Paraná, com 49, Paraíba e Pernambuco, com 37 cada, e o Amapá, com 32 prisões.

O TSE também registrou alguns "episódios isolados graves". No Amazonas, uma tribo indígena da etnia colinas, fez sete reféns, entre mesários e policias destacados para atuar nas eleições, na tarde de sábado, na cidade de Juruá, onde há 300 eleitores. Os índios pediram comida e gasolina como resgate. A Funai teve de intervir nas negociações para soltar a equipe da Justiça Eleitoral, o que ocorre às 7h de ontem - uma hora antes da abertura do processo de votação.

O corregedor-geral eleitoral, ministro César Asfor Rocha, minimizou esses incidentes: "Os percalços são mínimos num evento com uma importância como essa, em que as paixões afloram". "Tivemos um certame cercado de normalidade", completou Mello.

A votação teve um recorde positivo: a menor troca de urnas eletrônicas nas eleições gerais desde que esse sistema passou a ser utilizado, em 1994. Ao todo, o TSE contabilizou a substituição de 3.101 urnas. É o equivalente a 0,86% do total de 361.431 urnas. Nas últimas eleições gerais, em 2002, foram substituídas 5.719, ou 1,41% do total.

Nas eleições municipais de 2004, foram substituídas 2.982 urnas, ou 0,74% do total. A diferença é que, naquela votação, cada eleitor tinha de fazer apenas nove cliques (votar para prefeito e vereador). Já as eleições gerais exigem 25 cliques por eleitor (voto em presidente, governador, senador, deputado federal e estadual). Quanto menos cliques, maior a chance de "sobrevivência" da urna. Nessas últimas eleições e na atual, o TSE trabalhou com a margem de 1% de troca de urnas eletrônicas.

O secretário de Informática do TSE, Giuseppe Janino, estimou que as quebras devem ter ocorrido nas urnas que vêm sendo utilizadas há várias eleições. "Certamente existe um índice maior de falhas nos equipamentos mais antigos."

A baixa substituição, neste ano, foi um reflexo do fim do voto impresso em urna eletrônica. Esse sistema foi utilizado em 2002, como teste, em Sergipe, no Distrito Federal e em mais alguns municípios. O resultado, naquela eleição, foi um atraso excessivo na votação, seja pela troca de sistemas de impressão que não funcionaram ou pela quebra de urnas que estavam acopladas a este sistema.

Houve ainda uma brutal redução na substituição das urnas eletrônicas pela votação manual. Das 380.495 seções eleitorais, apenas 88 passaram para a votação com caneta e cédula, só 0,024% do total. "É um dado que não apresenta qualquer relevância", disse Mello.

Em 2002, 652 seções (0,20%) passaram para a votação manual. Em 2004, foram 259 seções. Ou seja, com apenas 88 seções tendo que fazer essa troca, ontem, a votação em papel foi quase totalmente abolida nas eleições deste ano.

O presidente do TSE apostava, antes do início da apuração, na queda do índice de abstenção, que em geral fica em torno de 20%. Computados 94,66% dos votos, às 22h50 de ontem, a abstenção era de 16,76%, ou 19,84 milhões de eleitores. Mello disse que o índice deveria cair por causa da minirreforma e da campanha de conscientização feita pelo tribunal, em que o ministro foi à televisão para pedir aos eleitores que deixassem de votar em branco ou nulo.

"A porcentagem menor de abstenções, de votos brancos e nulos deve decorrer dessa conscientização", afirmou o presidente do TSE. Ele também pôs um componente ético para justificar o seu raciocínio: "Precisamos presumir que o cidadão tem ainda o poder de se indignar com certas coisas", disse o ministro, numa clara sugestão aos escândalos de corrupção envolvendo o governo federal e o Congresso. "E aí a publicidade institucional foi no sentido de eles perceberem e escolherem os melhores candidatos", pontuou.