Título: Impasse no mercado de juros reduz liquidez e trava apostas
Autor: Pinto , Lucinda
Fonte: Valor Econômico, 02/08/2012, Finanças, p. C2

Indicadores econômicos mostrando fraqueza da indústria conseguiram tirar o mercado de juros do marasmo observado durante julho. Mas tudo indica que o impasse que limitou o avanço dos negócios no mês passado deve permanecer por mais algum tempo. Investidores tentam incorporar ao cenário variáveis contrastantes como a inflação que surpreendeu para cima e índices de atividade fracos. Em outra frente, há dúvidas sobre o cenário internacional em contraste com a esperança de ação de bancos centrais para reduzir os riscos de um cenário de ruptura. Na falta de certezas, agentes colocaram o pé no freio nos negócios, o que fica claro no volume reduzido de contratos negociados nos últimos pregões.

A falta de disposição em operar se deve ao fato de o mercado já ter colocado no preço o cenário mais provável para a política monetária: um corte de 0,5 ponto da Selic na reunião do Copom de agosto e mais uma redução de 0,25 ponto no encontro de outubro. E também a permanência do juro nesse nível por vários meses. "Não há argumentos que justifiquem posições diferentes e isso reduz espaço para ganho", explica um operador. "Está mais difícil ganhar dinheiro nesse mercado, o que desestimula o investidor a assumir riscos."

Em julho, a média diária de contratos negociados na BM&F somou 1,096 milhão, o menor desde fevereiro, quando o giro ficou em 1,061 milhão. Nos últimos seis pregões de julho, fica mais evidente a perda de ritmo dos negócios, com o volume bem abaixo da média do mês. A exceção foi a sexta-feira passada, quando o giro foi inflado pelas declarações de autoridades europeias reafirmando compromisso com a preservação do euro. Ontem, primeiro pregão de agosto, apesar da agenda mais recheada, o volume ainda foi reduzido: 964,4 mil contratos negociados.

A evolução da taxa dos DIs é outro termômetro da cautela do investidor. O contrato de juro futuro com vencimento em janeiro de 2014, o mais negociado, começou e terminou julho em 8,14%. Ontem, caiu para 7,76%, pressionado pelo resultado fraco da produção industrial.

Segundo o IBGE, a indústria cresceu 0,20% em junho ante maio, abaixo da média das estimativas dos analistas ouvidos pelo Valor Data, de 0,50%. Com isso, a ideia de que a Selic pode voltar a cair abaixo de 7,50% voltou à cena, o que provocou o alívio das taxas futuras.

Como contraponto a esses dados, estão o discurso de integrantes do Banco Central, que insistem em prever recuperação da atividade no segundo semestre. E também a piora do quadro de inflação - com a alta da projeção para o IPCA em 2012 flertando de novo com os 5%. A previsão é de que a alta de commodities agrícolas pressione os IGPs e tenha impacto ainda mais forte sobre os índices ao consumidor.

Sobre esse tema há outras dúvidas: são esperadas ações do governo que podem amenizar essa trajetória da inflação. O economista chefe do banco ABC Brasil, Luis Otávio de Souza Leal, observa que, na próxima semana, será anunciado o corte das tarifas de energia elétrica. Dependendo da intensidade dessa ação, o efeito sobre a inflação pode ser significativo. "Se for de 10%, como se especula, o efeito sobre o IPCA seria de 0,3 a 0,4 ponto percentual", afirma. Ele também observa que se espera a sanção presidencial do projeto de desoneração da cesta básica. "Diante dessas dúvidas, fica difícil para o mercado prever o rumo da inflação. O IPCA no ano pode cair para 4,80%, ou subir para 5,10%", diz.

O efeito final do atual choque dos preços agrícolas para a política monetária também não está claro. Em um primeiro momento, diz Leal, esse fenômeno provocará inflação, ao afetar preços de alimentos industrializados, por exemplo. Mas depois também terá um efeito de reduzir a renda - uma vez que o consumidor terá de gastar mais com alimentação. "Qual será a leitura do Banco Central desse quadro?", questiona o economista, lembrando que foi uma situação parecida com essa que precipitou o início do ciclo de aperto monetário em 2010, depois considerado exagerado por integrantes do governo.

Diante desse impasse, ficam limitados também os movimentos no mercado de NTN-Bs, títulos públicos atrelados à inflação, atrativos quando os índices de preço estão em alta. A chamada inflação implícita (diferença entre a taxa do DI e o rendimento do papel) voltou a subir em meados de julho, a partir da leitura do IPCA-15 do mês, que avançou 0,33%, acima do esperado. Mas já começou a recuar por causa da possibilidade das ações do governo. No caso do papel com vencimento em 2013, a inflação embutida no título bateu a máxima de 5,64% em 24 de julho, mas voltou a ceder e, ontem, foi negociada a 5,55%.