Título: De olho no exterior
Autor: Monteiro, Luciana
Fonte: Valor Econômico, 02/10/2006, EU & Investimentos, p. D1

O ritmo de desaceleração na economia americana e suas conseqüências para o nível de atividade global são as grandes variáveis que irão influenciar o desempenho dos investimentos no mês de outubro. A preocupação dos economistas é com a possibilidade de a economia dos Estados Unidos entrar em recessão, o que traria fortes impactos para todos os países. Já no âmbito interno, mais do que o resultado da eleição presidencial, o mercado financeiro está de olho na nova composição do Congresso Nacional, que pode sinalizar se a reforma fiscal, considerada essencial para os analistas, poderá ser aprovada no ano que vem.

Para os investidores com aplicações em bolsa, os economistas dizem que é preciso ter paciência e sangue frio. As bolsas mundiais deverão mais uma vez oscilar ao sabor de cada novo número divulgado nos Estados Unidos, como já ocorreu em setembro. No mês passado, a forte volatilidade deu novamente o tom da bolsa brasileira, provocando correção no Índice Bovespa, que encerrou o mês com alta de 0,60%. Para se ter uma idéia, o índice variou em setembro de 37.693 pontos a 34.798 pontos, ou 8,3%. Com o cenário ainda incerto, a bolsa deverá permanecer sem uma tendência bem definida.

O mesmo deve ocorrer com o dólar. Em setembro, a moeda americana teve alta de 1,21%, fechando o mês como aplicação mais rentável. Para este mês, a divisa deve continuar apresentando forte vaivém, mas os gestores não indicam o dólar como investimento. Eles consideram que o movimento de apreciação da moeda é pontual e, para o investidor comum, conseguir retornos atraentes com a divisa é extremamente difícil. Já o ouro acumulou queda de 5,03% no mês, por conta do mercado externo.

"As contas externas estão muito robustas e a moeda americana tem pouco espaço para se valorizar pois o fluxo de dólares vai continuar forte, mesmo que numa magnitude menor", afirma Luiz Fernando Figueiredo, sócio da Mauá Investimentos. Ele rebate as críticas dos que acham a moeda brasileira supervalorizada lembrando que, se for descontada a desvalorização da moeda americana lá fora, o câmbio real brasileiro estaria em torno de R$ 2,35.

Os indicadores sobre o mercado imobiliário nos EUA continuarão a ser monitorados de perto, juntamente com a inflação. No mês passado, a perda de US$ 6 bilhões do fundo hedge americano Amaranth em contratos futuros de gás contribuiu para a volatilidade. "O mercado se assustou quando viu um grande fundo vendendo um volume enorme de contratos e isso trouxe um certo efeito manada, que também se refletiu por aqui, mas o receio não se materializou em desespero", lembra Rogerio Betti, sócio da Beta Advisors. Contribuíram para uma maior tensão nos emergentes o golpe na Tailândia e a crise política na Hungria.

Os emergentes continuarão sendo testados nesse cenário de menor liquidez mundial, avalia Mohamed Mourabet, sócio da Victoire Finance Capital. Apesar da preocupação com os números da economia americana, a maior parte dos economistas acredita que o cenário de desaquecimento suave irá prevalecer. "Mas vale lembrar que o 'soft landing' (pouso suave) nunca é estável, regular", diz. "Enquanto não houver uma visibilidade maior do desempenho dos EUA e de quando o Federal Reserve começará a baixar o juro, as bolsas permanecerão sem direção".

A queda nos preços das commodities trouxe uma correção no valor das ações dos emergentes, fortes exportadores de matérias-primas, lembra Marcelo Assalin, diretor de Investimentos da SulAmérica. No Brasil, o movimento pegou em cheio papéis de maior liquidez, caso da Vale do Rio Doce e da Petrobras. Com isso, os fundos de privatização da Vale perderam em média 3% até o dia 26, mas ainda não foram incorporados nas cotas a valorização de 3,31% entre os dias 27 e 29. No caso da Petrobras, os fundos tiveram, em média, perdas de 9,04% até o dia 26, mas a alta de 4,49% entre os dias 27 e 29 também não está nas cotas.

Para os investidores que têm visão de longo prazo, de pelo menos três anos, o momento pode ser de compra de ações, avalia Betti, da Beta. "Os fundamentos do Brasil não mudaram, continuam sólidos", diz. "É claro que, diante de uma crise externa, o Brasil sofre, mas o cenário ainda se mantém positivo no longo prazo." Ele lembra que a queda no preço das commodities afeta o país por ser grande exportador, mas indiretamente também ajuda. "Um dos grandes problemas dos Estados Unidos é o preço das commodities e, com as matérias-primas em queda, é mais fácil deixar a inflação americana sob controle e o Fed pode começar a baixar os juros, o que é positivo para todo mundo", diz. Ele recomenda principalmente Petrobras, Vale e ações de bancos.

Mas, se as ações de empresas produtoras de commodities podem representar oportunidades, o risco inerente também é maior neste momento, pondera Alexandre Póvoa, sócio-diretor do Modal Asset Management. "São excelentes empresas, mas as ações podem cair ainda mais", diz. "No médio e longo prazos, tenho uma visão positiva para a bolsa, mas sou bem pessimista no curto prazo."

Apesar da perspectiva de forte oscilação, a boa notícia é que a bolsa brasileira está barata em relação a outros países do mundo, afirma Figueiredo, da Mauá. O problema, lembra, é que o Brasil está com uma menor capacidade de crescimento, em torno de 3% ao ano, o que limita o potencial de ganho das empresas e da bolsa, lembra ele. "Mas está barata". Segundo Figueiredo, a recomendação para outubro é buscar oportunidades sem elevar demais o risco da carteira. "Reduzir o risco é importante pois, se o mercado piorar, a perda não será tão grande". Com mais dinheiro em caixa, o investidor pode também aproveitar as turbulências para comprar títulos ou ações com preços mais atrativos e maior potencial de ganho maior.

Para o cenário político, a dúvida é se o próximo presidente terá condições de reunir apoio no Congresso para aprovar as reformas econômicas importantes para o país crescer mais, diz Póvoa, da Modal. "Se não fizermos nada, a conta virá nos próximos anos", afirma Figueiredo, citando a necessidade de uma reforma fiscal que reduza a carga tributária, hoje em 40% do PIB. (Colaborou Angelo Pavini)