Título: Lula aceita réplicas e apela à conciliação
Autor: Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 03/10/2006, Política, p. A14

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva começou ontem a aplicar uma nova estratégia de campanha para o segundo turno, um modelo de atuação que resgata estilo menos agressivo, mais suave e cordial, que incluiu, ontem, também a reaproximação da imprensa. Abatido, cansado, Lula concedeu a segunda entrevista coletiva em quatro anos de governo - desta vez permitindo inclusive a réplica - no Palácio da Alvorada. Elogiou o papel da imprensa, que havia sofrido novo ataque de seu coordenador de campanha, Marco Aurélio Garcia, na consolidação da democracia brasileira. Afirmou que as políticas sociais são necessárias mas negou que pretenda fazer uma divisão do país entre ricos e pobres, e prometeu que, agora, vai aos debates contra o tucano Geraldo Alckmin.

"Eu penso que vamos ter um segundo turno interessante, esclarecedor, eu espero. Espero que as idéias, os programas de governo, sejam debatidos e que a gente possa mostrar para o povo o que nós pretendemos para o futuro de nosso país", afirmou o presidente. Lula reuniu-se pela manhã com a coordenação de campanha e fez nova reunião, à noite, no Palácio do Planalto, esta inclusive com a presença de Ciro Gomes, eleito deputado federal pelo Ceará e um dos principais conselheiros políticos do presidente. Ao sair desse encontro, Marco Aurélio sintetizou os objetivos nesta segunda etapa: "É impedir o retrocesso e a volta do governo da privataria".

Na entrevista, o presidente comentou cada uma das razões que vêm sendo apontadas para o fato de não ter vencido as eleições no primeiro turno, entre elas a ausência do debate na TV Globo, a tentativa de compra pelo PT de um suposto dossiê contra José Serra, candidato a governador de São Paulo pelo PSDB, e a divulgação das fotos de pilhas de dinheiro do partido destinadas a pagar o dossiê.

Em relação à ausência no debate da TV Globo, na noite da última quinta-feira, Lula afirmou que não tem "condições de aferir se deveria ter ido ou não". E que, se tivesse uma bola de cristal mostrando que, ao fazer determinada coisa ganharia voto e ao tomar determinada decisão perderia voto, sempre faria o necessário para ganhar votos.

Lula voltou a criticar a operação da compra do dossiê, montada pela direção de sua coordenação de campanha, e classificou-a como um "tiro no pé". "Tem um mistério nesse dossiê que eu gostaria de saber. Não é só quem deu o dinheiro, de onde veio o dinheiro, é quem arquitetou esse plano de engenharia, quem convenceu quem". Apesar disso, mais uma vez, Lula mostrou condescendência com a direção partidária. "Eu não posso culpar o PT porque o PT é muito grande. Meia dúzia de pessoas acreditaram em papai Noel, acreditaram em fantasia". Reiterou que, "ao negociar com bandidos, você acaba virando um deles". Sobre a foto vazada por um delegado da Polícia Federal na última sexta, mostrando os dólares e reais utilizados na compra do dossiê dos Vedoin, afirmou que, se "ela existe, tinha que ser mostrada".

Lula acabou simplificando a razão pela qual não venceu no primeiro turno, como esperava: "porque faltou voto para vencer no primeiro turno, o que não acontecerá no segundo turno".

Lula acredita que os debates de segundo turno podem ser mais proveitosos. Segundo ele, são apenas dois candidatos. No primeiro turno, na visão do presidente, os candidatos ficam muito tempo fora do ar, esperando as perguntas que, muitas vezes, são feitas para outros candidatos. "Vamos debater os problemas do Brasil, aquilo que nós fizemos. Acho que o segundo turno de uma eleição é extremamente importante. Consolida definitivamente a maioria da sociedade brasileira, torna mais previsível para o eleitorado a sua decisão, na medida que ele pode fazer a comparação entre dois candidatos e não entre quatro, cinco, seis".

O presidente foi polido com o Congresso, instituição que vinha sendo criticada duramente nos últimos dias durante seus comícios. Disse que o Congresso é a "caixa de ressonância da consciência política nacional". Não quis comentar a reeleição de alguns petistas, como João Paulo Cunha (PT-SP) e Antonio Palocci (PT-SP), envolvidos em escândalos de corrupção. Segundo Lula, se os eleitores votaram nesses candidatos, são soberanos. E citou o exemplo do ex-presidente Fernando Collor, eleito para o Senado por Alagoas. "Ele passou 14 anos de castigo", lembrou o presidente.

Lula também suavizou o discurso adotado nos últimos dias contra a "elite brasileira", e a afirmação de que seria eleito pela população carente. Defendeu os programas de inclusão social, mas disse que é presidente de 190 milhões de brasileiros. "Se fosse assim, simples, como aqui temos mais pobres do que ricos, eu já teria vencido as eleições. Não é assim que o povo se comporta numa eleição e não é assim que alguém se candidata a Presidente da República", afirmou o presidente.

Sobre futuras alianças, Lula disse que a coordenação política vai buscar os candidatos aos governos estaduais que disputam o segundo turno para montar os palanques. Em relação a apoios de Heloísa Helena (P-SOL-AL) e Cristovam Buarque (PDT-DF), afirmou que os partidos vão decidir, mas que "os eleitores já devem estar se movimentando para escolher entre ele e o tucano Geraldo Alckmin".