Título: O Decreto nº 5.903 e a fixação de preços
Autor: Lemos, Flávio
Fonte: Valor Econômico, 15/01/2007, Legislação, p. E2

O Código de Defesa do Consumidor - a Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 - estabelece no artigo 31 os requisitos a serem observados pelos fornecedores no momento da oferta do produto ou do serviço. Desde a edição do código surgiram inúmeras controvérsias acerca da interpretação e alcance do referido dispositivo, motivando a propositura de ações judiciais por parte do Ministério Público e por órgãos de defesa do consumidor.

Um dos principais pontos controvertidos estava relacionado à informação do preço do produto ou serviço ofertado pelo fornecedor ao mercado de consumo. Diante dessa controvérsia, e visando disciplinar a questão, é que foi editada a Lei nº 10.962, de 11 de outubro de 2004, que regulou as formas de afixação de preços de produtos e serviços para o consumidor.

A referida lei especificou as formas admitidas para a afixação de preços em vendas a varejo para o consumidor: (1) no comércio em geral, por meio de etiquetas ou similares afixados nos bens expostos à venda; (2) em auto-serviços, supermercados e hipermercados, mercearias ou estabelecimentos onde o consumidor tenha acesso direto ao produto, sem intervenção do comerciante, a afixação do preço na embalagem e, alternativamente, a afixação de código referencial ou código de barras, desde que a informação relativa ao preço à vista dos produtos, características e código esteja exposta de forma clara e legível.

A preocupação com as informações relativas aos preços dos produtos e serviços sempre esteve presente no mercado de consumo. Tanto é que, decorridos aproximadamente dois anos desde a edição da Lei nº 10.962, o legislador houve por bem regulamentá-la por meio do Decreto nº 5.903, de 20 de setembro de 2006, dispondo sobre as práticas infracionais que atentam contra o direito do consumidor de receber informações adequadas e claras acerca dos preços dos produtos e serviços.

O Decreto nº 5.903 estabelece que os preços de produtos e serviços, em todas as formas definidas na lei, devem ser informados adequadamente, garantindo ao consumidor a correção, clareza, precisão, ostensividade e legibilidade de todas as informações prestadas.

O legislador, desde a edição do Código de Defesa do Consumidor, consagrou o princípio da qualidade da informação a ser prestada pelo fornecedor ao consumidor. O decreto, observando esse mesmo princípio, estabeleceu uma série de obrigações que devem ser observadas pelo fornecedor no momento de informar o preço do produto ou serviço colocado à disposição do consumidor no mercado.

-------------------------------------------------------------------------------- O Decreto nº 5.903 estabeleceu uma série de obrigações que devem ser observadas pelos fornecedores --------------------------------------------------------------------------------

Verifica-se que o Decreto nº 5.903 obriga o fornecedor a prestar ao consumidor uma informação de qualidade relativa ao preço do produto ou serviço, de maneira a evitar qualquer tipo de dificuldade na sua interpretação, confusão ou mal entendido.

Partindo dessa premissa, é que o decreto estabeleceu a obrigação do fornecedor de discriminar o valor à vista dos produtos e serviços, mesmo que exista a possibilidade de aquisição parcelada ou financiada. Aliás, nas modalidades de aquisição parcelada ou financiada, o fornecedor deve informar (1) o valor a ser pago com o financiamento; (2) o número, periodicidade e valor das prestações; (3) a taxa de juros e demais acréscimos e encargos que podem incidir no valor do financiamento ou parcelamento.

Além disso, o Decreto nº 5.903 estabeleceu que o fornecedor é obrigado a manter sempre visíveis as informações do preço dos produtos e serviços expostos à venda enquanto o estabelecimento estiver aberto ao público, remanescendo tal obrigação mesmo em caso de montagem, rearranjo ou limpeza, quando realizados em horário de funcionamento do estabelecimento.

No tocante à fixação de preços na modalidade de código referencial, o fornecedor deverá disponibilizar a relação dos códigos e seus respectivos preços visualmente unidos e próximos dos produtos a que se referem. Isso sem falar que o código referencial deve estar fisicamente unido ao produto e em contraste de cores, particularidade essa extremamente importante nessa modalidade de precificação.

Já na modalidade de precificação por código de barras, o legislador estabeleceu que caberá ao fornecedor disponibilizar terminais de consulta de preços (leitores óticos) a uma distância máxima de 15 metros entre qualquer produto e a leitora ótica mais próxima. Além disso, os leitores óticos deverão ser indicados por cartazes suspensos que indicam a sua localização.

Por fim o Decreto nº 5.903 descreve várias práticas que são definidas como infrações ao direito básico do consumidor, sujeitando o fornecedor às penalidades estabelecidas no Código de Defesa do Consumidor, como, por exemplo, a utilização de letras que dificultem a percepção da informação pelo consumidor, a exposição de preços com as cores das letras e do fundo idêntico ou semelhante e até mesmo informar preços apenas em parcelas, deixando de informar o valor total.

Portanto, verifica-se que o Decreto nº 5.903 estabelece, desde o dia 20 de dezembro de 2006, uma série de requisitos que devem ser observados com muito mais cuidado pelos fornecedores no momento de prestar as informações relativas aos preços dos produtos e serviços colocados no mercado de consumo. A inobservância desses requisitos sujeitará os fornecedores infratores às penalidades aplicáveis pelos órgãos de fiscalização e defesa do consumidor, entre as quais multas que podem variar de R$ 200 mil a R$ 3 milhões.

Flávio Lemos Belliboni e Renato José Cury são advogados e, respectivamente, sócio e associado sênior da área contenciosa do escritório Pinheiro Neto Advogados